'Estamos destruídos', diz filho de baiano morto em Brumadinho

Corpo de Ademário Bispo, 51, foi encontrado na sexta-feira e o enterro será realizado neste domingo (10), em Minas Gerais

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  • Laura Fernades

Publicado em 9 de março de 2019 às 20:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Acervo Pessoal

“Nossa família está destruída”. Foi essa a frase que o auxiliar técnico em logística Ismael Bispo, 23 anos, conseguiu dizer sobre a confirmação da morte de seu pai, o mecânico montador baiano Ademário Bispo, 51, uma das 197 vítimas do rompimento da barragem de Córrgeo do Feijão, em Brumadinho, Minas Gerais. O corpo de Ademário foi encontrado nesta sexta-feira (8), depois de ter sido dado como desaparecido quando a barragem de rejeitos da mineradora Vale rompeu, no dia 25 de janeiro, invadindo parte da cidade.

Além de Ademário, que será enterrado neste domingo (10), às 10h, na cidade de Mário Campos, em Minas Gerais, o primo de Ismael, Alex Mário Moraes Bispo, 22 anos, segue desaparecido. “Estamos destruídos, porque são vidas jovens que tinham muito com o que sonhar e o que lutar”, lamentou Ismael, morador de Santo Amaro, que conhece parte dos baianos mortos na tragédia. Ademário (no centro) ao lado dos filhos, Natan Nael, 21, e Ismael, 23 (de óculos) Até agora, foram encontrados Ednilson dos Santos Cruz, 23, no dia 29 de janeiro; Tiago Coutinho do Carmo, 34, no dia 17 de fevereiro; George Conceição de Oliveira, de idade não divulgada, achado em 19 de fevereiro; e Cássio Cruz Silva Pereira, 27, em 23 de fevereiro. “São histórias que tenho proximidade... Ednilson, a filha dele nasceu agora; o George ajudava muito a esposa, que perdeu a visão; Alex estava terminando de construir a casa dele...”, lamentou Ismael.

Ao CORREIO, o rapaz que trabalha no Instituto Médico Legal (IML) de Santo Amaro disse que o pai era contratado de uma terceirizada da Vale e morava na cidade de Mário Campos “há uns anos”, onde “estava construindo seu cantinho”. A ideia, revela, era levar toda a família para morar lá: Ismael, a mãe e o irmão, Natan Nael, 21, que já estava morando com o pai.

“Ele queria levar meu irmão para trabalhar lá, mas graças a Deus não levou...”, disse, aliviado. Seu último momento com o pai foi em 2017, porque Ademário tinha planejado a volta para casa no final de 2018, “mas não foi possível por causa da questão financeira”. Como ele não conseguiu vir, Ismael tinha programado ver o pai nas férias, em abril.“A única coisa que lembro disso tudo foi antes dele partir. Meu pai me abraçou bem forte e disse que voltaria depois...”, lembrou, emocionado.Carismático, extrovertido e tranquilo, Ademário era apaixonado pelo Esporte Clube Vitória, paixão que passou para os filhos. Ativo, não gostava de ficar parado: “Quando não tinha nada para fazer, ele inventava, mesmo se estivesse desempregado”.“É clichê falar, na hora da morte, ‘era uma boa pessoa’. Mas eu vou ter que ser clichê: a honra que carrego de ser filho dele é ver hoje as pessoas olharem pra mim e meu irmão e dizerem ‘você é um grande homem’. Vi que meu pai cumpriu o papel dele de pai”, resumiu Ismael.Crime Enquanto tenta lidar com a situação, Ismael solicitou à Vale o acompanhamento de um psicólogo. “Desde que voltei da cidade de meu pai, a minha mente não é mais a mesma”, justificou o rapaz que ainda não teve a solicitação atendida. Ao mesmo tempo, segue na busca por justiça diante do que considera um crime. “Desastre é quando acontece uma enchente, aí é desastre. Isso é crime. Não foi um crime tão grotesco quanto puxar um gatilho, mas foi um crime quando a Vale assumiu o risco”, afirmou.

Sua raiva, explica, está “focada nos donos da Vale” por conta da negligência que provocou o rompimento da barragem e do “cinismo com o qual tratam as famílias das vítimas”. “É o que me deixa mais indignado. Eles acham que as famílias querem dinheiro. Infelizmente, eu sei que não acontecerá justiça, infelizmente. Mas, na esperança e na fé da justiça divina, espero vingança na Terra, mas a justiça divina”, desejou.