Fidelidade ao slogan

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Publicado em 20 de outubro de 2018 às 12:14

- Atualizado há um ano

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Existem slogans que são criados simplesmente para fazer média com o público. Existem slogans que não dizem a que vieram e existem slogans que parecem mais uma piada quando colocados frente à marca que representam. E existem, por fim, slogans que, efetivamente, são criados para passar uma mensagem.

Quando o Barcelona se declara como “Mais que um clube”, frase gravada nas cadeiras do Camp Nou e propagada pelo mundo todo, o que se está dizendo é que o Barça não é o que é porque tem Messi e já teve, ao longo de sua trajetória, alguns dos maiores craques da história do futebol.

O Barcelona é “mais que um clube” porque representa, para boa parte do povo da Catalunha, um símbolo identitário de resistência, um escudo que, literalmente, defendeu as pessoas durante um dos mais brutos regimes ditatoriais do século XX.

Calejado pelo conflito contra o fascismo do general Francisco Franco, o Barcelona é apenas coerente com sua própria história quando desaprova o apoio dado por Ronaldinho Gaúcho a Jair Bolsonaro, o militar reformado que é candidato à Presidência do Brasil.

Entre tantas barbaridades que já expeliu por aí ao longo de sua vida pública, Bolsonaro defendeu torturador dentro do Congresso Nacional, disse que o erro da ditadura militar brasileira foi torturar e não matar, disse que daria “um côro” num filho se este fosse gay e, mais recentemente, afirmou que vai “acabar com todo tipo de ativismo”. Tem jeito, cara e ideias de fascista. Se não for isso, é o quê?

Ronaldinho (ainda) é embaixador do clube catalão e integra o Barcelona Legends, uma equipe de ex-jogadores que já vestiram a camisa azul-grená e foi formada para realizar jogos de exibição em todo canto do planeta. Logo, não pegou nada bem na Catalunha que ele tenha dado força a um candidato cujas ideias são exatamente opostas ao que está inserido no slogan “Mais que um clube”.

Após a publicação de Ronaldinho numa rede social, torcedores do Barcelona, brasileiros ou não, começaram a cobrar uma posição oficial do clube. O desconforto chegou num ponto que o porta-voz da instituição, Josep Vives, teve que se pronunciar, dizendo que a agremiação respeita a liberdade de expressão de todo mundo, mas “os valores de Bolsonaro não correspondem aos do clube”. Agora, a diretoria vai “observar atentamente a evolução do caso para tomar decisões que considere convenientes”.

É sintomático que Ronaldinho - eleito duas vezes melhor jogador do mundo -, um cara que nunca deu a menor bola pra política, jamais expôs qualquer posicionamento sobre questões sociais brasileiras ou emitiu opinião sobre absolutamente nada que não fosse a bola, tenha optado por falar agora, apoiando um candidato que nada propõe e faz uma campanha comprovadamente baseada na propagação de fake news e declarações virulentas. É a perfeita síntese do vazio de ideia que marcha rumo ao Planalto. E a prova de que os lances mais bonitos do Gaúcho agora fazem parte somente do passado.

“Ah, mas o Barcelona tem patrocínio da Qatar Airways, que é da família real do Qatar e eles são ditadores”. Tem razão quem aponta o paradoxo. E o Barcelona deve ser cobrado por, neste caso, desrespeitar a própria história, não por se posicionar quando dá sinais de coerência.