Filme de Fernando Meirelles, Dois Papas chega aos cinemas antes da Netflix

Filme que mostra relação entre Papa Bento XVI e Papa Francisco estreia na Netflix no dia 20

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  • Doris Miranda

Publicado em 5 de dezembro de 2019 às 06:05

- Atualizado há um ano

. Crédito: foto/divulgação

O Papa Bento XVI não mandou chamar o argentino Jorge Mario Bergoglio para conhecê-lo e saber se valia mesmo a pena ceder seu lugar na Cadeira de São Pedro ao se aposentar. O alemão tampouco pediu conselho ao então cardeal sobre se deveria mesmo sair naquele momento de crise na igreja. Também é pouco provável que tenham assistidos juntos ao jogo entre Alemanha e Argentina na final da Copa do Mundo de 2014 –  Jorge Mario ama futebol, enquanto Bento XVI não tem nenhum apreço por esportes.

Mas, isso pouco importa porque o que o público assiste em Dois Papas, novo trabalho de Fernando Meirelles (Cidade de Deus/2002, Ensaio Sobre a Cegueira/2008), que chega hoje aos cinemas antes de estrear na Netflix no dia 20, é o diálogo de dois antagonistas que conseguem superar suas visões particulares para discutir a fé e a esperança nos homens. “Para mim, o aspecto mais importante do filme é o perdão. Esses dois papas fizeram grandes besteiras na vida e têm um peso na consciência. E nisso, um tem que ouvir o outro e perdoar a si mesmos pelas cagadas que fizeram. Nesse mundo de hoje, a gente não está gostando de ouvir o outro. Então, Dois Papas é sobre dois homens, em lados opostos, que precisam se ouvir”, avalia Meirelles.

A história começa quando o cardeal Ratzinger (vivido por Anthony Hopkins) é eleito papa, em 2005 – Bergoglio (na pele de Jonathan Pryce) ficou em segundo lugar. “Sete anos depois, Bento XVI começa a pensar em se aposentar e chama o argentino para saber quem era aquele cara que assumiria se ele se aposentasse. Na verdade, Bento queria saber se valia a pensa se aposentar”, explica o diretor. Desse primeiro momento, nasce uma improvável amizade, que atravessa questões pessoais de fé e conduta oficial da igreja católica no mundo contemporâneo até chegar em momentos do cotidiano de cada um. No filme de Meirelles, Francisco e Bento XVI assistiram juntos à final da Copa de 2014, disputada entre Alemanha e Argentina (foto/divulgação) Nesse encontro fictício, escrito por Anthony McCarten (indicado ao Oscar por A Teoria de Tudo/2014), tem muita alegoria mas algumas coisas têm fundamento. Exímio pianista, mas desconhecedor de música popular, Bento XVI, por exemplo, ama Fanta Laranja. Não se sabe se ainda hoje, aos 92 anos, continua abusando mas naquela época bebia quatro latas por dia e mais uma no jantar. A densidade de Ratzinger e o bom humor de Francisco se devem à escolha dos autores, ambos com atuações elogiadas com unanimidade. “Já tinha uma boa relação com Anthony Hopkins porque trabalhamos juntos mas queria Jonathan Pryce porque ele tem uma simpatia, uma simplicidade e um humor que eu acho que o papa Francisco tem”, explica Meirelles.

Agnóstico, Fernando Meirelles diz que há tempos vinham falando com ele de um filme sobre o papa. “Mas eu nunca disse não porque acho esse cara é uma das vozes mais importantes do mundo, tentando ver a humanidade como uma coisa só”, diz. Mas, ainda assim, ficou reticente. A coisa só mudou quando leu o roteiro e achou “muito bom”. Segundo Meirelles, o segredo está no fato de que os roteiristas fizeram questão de colocar humor na receita do bolo, até para fazer contraponto aos temas mais densos como o envolvimento do clero em abusos infantis na gestão de Bento XVI e a omissão de Bergoglio na ditadura militar argentina. Dois Papas leva o público ainda para conhecer a politicagem dos cardeais durante os conclaves.

Lançado no Festival de Toronto, Dois Papas ainda vai rodar em alguns festivais antes de 2019 se encerrar. “Estou adorando a experiência de exibir num cinema, com escuro, público, burburinho, antes de entrar na plataforma.  Aliás, o streaming é um caminho sem volta. Alguns filmes, incluindo meu, não teriam acontecido se não fosse a Netflix. Num estúdio, Dois Papas teria um orçamento muito mais modesto” opina Fernando Meirelles.