Filme mostra que Hebe era vítima de abuso no casamento

No longa Hebe - A Estrela do Brasil, a Loiruda interpretada por Andréa Beltrão é agredida pelo marido

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  • Roberto Midlej

Publicado em 26 de setembro de 2019 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Fotos divulgação

Depois de ser exibido no Festival de Gramado deste ano, o filme Hebe - A Estrela do Brasil gerou um certo burburinho e o público saiu da sessão se perguntando se o roteiro havia sido realmente fiel à personalidade da apresentadora, interpretada por Andréa Beltrão. 

É que, para muitos que haviam visto o filme, Hebe tinha  sido retratada de  forma idealizada e a roteirista Carolina Kotscho (a mesma de Dois Filhos de Francisco) teria suavizado a imagem dela, que era marcada pela pecha de ter apoiado Paulo Maluf - o candidato dos militares - na candidatura ao Governo de São Paulo. Daniel Boaventura aparece rapidamente como Silvio Santos Mas a roteirista garante que tudo o que está no filme é real, conforme disse em entrevista a Luiz Carlos Merten, do Estadão Conteúdo: “Não inventei nada. Tudo o que a Hebe faz e diz no filme é documentado. Tomei liberdades na estruturação dramática, mas quem vê as entrevistas da Hebe no Roda Viva vai identificar a nossa personagem. A entrevista está na íntegra no YouTube. Hebe entrou intimidada, dizendo que todos aqueles entrevistadores iam trucidá-la, e terminou aplaudida de pé”.

Pode até ser que Maurício Farias, o diretor - que é casado com Andréa Beltrão -, tenha poupado Hebe, mas o filme que estreia hoje está longe de ser uma biografia chapa branca e sem emoção, afinal a personalidade contraditória de Hebe está claramente apresentada. E muito bem representada por Andréa Beltrão, que se livrou da tentação de imitar a apresentadora e assim cair na caricatura.

E o grande mérito do roteiro é exatamente esse: distanciar-se da imagem folclórica que ficou de Hebe no imaginário dos brasileiros. Em vez de mostrar a loira sempre sorridente, dando suas contagiantes gargalhadas ou distribuindo selinhos nos seus convidados, o filme mostra a apresentadora nos bastidores do programa e na intimidade de sua casa. Karine Teles é Lolita Rodrigue e Cláudia Missura, Nair Bello Lélio E é aí que ficamos sabendo que o casamento de Hebe com Lélio, a quem ela fazia juras de amor na TV, não era aquele conto de fadas que ela nos fazia acreditar. Interpretado pelo sempre eficiente Marco Ricca, Lélio abusava do álcool e agredia a esposa com frequência.

“Durante muito tempo, eu, como todos os brasileiros, ouvia falar da Hebe e do Lélio (o marido dela). Pareciam ter o casamento mais perfeito do mundo. Foi um choque descobrir que o relacionamento era abusivo, que ele era violento. O Brasil é campeão de feminicídio. Isso,  a censura e  a liberdade de expressão... É um filme muito atual”, diz Carolina Kotscho.

Passado nos anos 1980, o filme revela os problemas que Hebe teve com a censura, quando terminava a ditadura militar. E aí mora uma das contradições da apresentadora: embora fosse declaradamente eleitora de Paulo Maluf, legítimo representante da direita, a Loiruda defendia os direitos dos homossexuais, inclusive em seu programa, que era transmitido ao vivo. Não era raro também ela se manifestar contra a corrupção ou a péssima distribuição de renda no país.  Marco Ricca dá vida a Lélio, o marido de Hebe Foi por isso que ela despertou a ira dos militares e até do democrata Ulysses Guimarães (1916-1992). Processada e com medo até de ser presa, Hebe solta essa: “Eu não sou de direita nem de esquerda; eu sou direta”.

O filme revela, ainda, que Hebe era extremamente geniosa e não fugia de uma boa briga. Pior era quando se defrontava com alguém tão genioso quanto ela, como Walter Clark (Danilo Grangheia), que era diretor da Bandeirantes, uma das emissoras em que Hebe trabalhou no período retratado no filme.

Numa dessas brigas, Clark, por pressão do governo, comunicou a Hebe que ela deveria gravar seus programas, em vez de apresentá-lo ao vivo. Mas a Loiruda, que não era fácil, não arredou o pé e levou a briga até o fim.