IBGE: setor de construção fechou 4 mil empresas e demitiu 428 mil

Na Bahia, 399 empresas foram fechadas no mesmo período

Publicado em 7 de junho de 2018 às 10:41

- Atualizado há um ano

. Crédito: Agência Brasil

Em 2016, ano em que a economia brasileira atingiu o fundo do poço, o setor de construção deixou de movimentar R$ 55,3 bilhões, fechou quatro mil empresas e eliminou 428.603 postos de trabalho em todo o País. Os dados são da Pesquisa Anual da Indústria da Construção (PAIC), referente a 2016, divulgada nesta quinta-feira, 7, pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Na Bahia, foram 399 empresas fechadas no mesmo ano. Foi a primeira vez que o setor encolheu depois de nove anos consecutivos de crescimento, desde 2007. Segundo o IBGE, das 3.009 empresas da construção com 5 ou mais pessoas ocupadas atuantes no estado em 2015, 399 encerraram suas atividades na passagem para 2016 (-13,3%). O Nordeste teve o maior ganho de participação no valor das obras e serviços da construção, entre 2007 e 2016. O valor das incorporações, obras e/ou serviços da construção, subiu de 15,7% para 19,2%.

CORREIO mostrou situação em abril

Depois que o setor vivenciou um crescimento fora do comum entre 2008 e 2014, vieram os altos índices de desemprego e de empresas sendo fechadas. A situação foi mostrada pelo CORREIO em abril. Só em 2015, o Sindicato dos Engenheiros da Bahia (Senge) homologou 600 demissões no estado. Em 2016, foram 500. Em 2017, o número caiu para 300 – não porque a situação melhorou; mas porque a construção civil já extinguiu tantos cargos e demitiu tanta gente que já não há mais por onde cortar. Uma coisa é certa: os demitidos nos anos anteriores não foram contratados novamente. 

E isso é só relacionado aos que passam pelo sindicato, porque, como explica o presidente do Senge, Ubiratan Félix, muitas empresas não fazem isso. “Esse ano está mais tranquilo porque não tem mais quem seja demitido. Houve uma situação muito forte nos últimos tempos de quem ia homologar e não recebia nada porque a empresa entrou em recuperação judicial. O sindicato está acompanhando profissionais desempregados, que estão tendo uma situação difícil de ter até que retirar filho da escola”, diz ele, que também é professor do Instituto Federal da Bahia (Ifba). 

Crise nacional Não há como dissociar a crise na engenharia civil com a crise no país. Como explica o presidente do Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (CREA-BA), Luiz Edmundo Campos, a situação econômica nacional em 2008 – de crescimento e mais empregos sendo oferecidos – fez com que salários aumentassem. Assim, as pessoas começaram a melhorar de vida. Muita gente comprou carro, apartamento e a engenharia civil ia de vento em popa. “As empresas alegavam que faltava mão de obra treinada e de qualidade para atender aquele boom de crescimento, que incluiu diversas obras para a Copa do Mundo (2014) e Olimpíadas (2016). Muita gente começou a ver a engenharia como uma profissão promissora, mas essa onda de pico de investimentos não corresponde à onda de pico de formados”, explica. Basicamente, dava para usar uma regra e, a partir dela, compreender como estava o Brasil. O coordenador de Engenharia Civil da Faculdade Pitágoras de Teixeira de Freitas, Faustino Ferreira Filho, diz que o campo é um ‘termômetro da economia’. “E oscila em detrimento das ações públicas de nossos governantes, fomentado pelas grandes empresas do mercado imobiliário e de serviços”. 

Naquele momento, era como se o termômetro indicasse que o Brasil tinha a saúde de um jovem atleta da Seleção Brasileira de Vôlei, de Futebol ou de Natação. Nenhum sinal de febre – o que provocou o aumento do interesse pela Engenharia Civil. O que acontece é que um estudante da área passa pelo menos cinco anos na faculdade. 

Ou seja – quem entrou em 2008 esperando encontrar um campo pulsante saiu somente em 2013. Aqueles que começaram em 2009 saíram em 2014 já no estopim da crise econômica do país – e isso seguiu com os que fizeram vestibular em 2010, 2011 e 2012. 

Em 2008, 625 novos engenheiros civis pediram registro no Crea. Entre 2009 e 2012, o número continuou oscilando entre 500 e 600. É a partir de 2013 que as coisas começam a se inverter: só naquele ano, o mercado ganhou 739 novos engenheiros civis. Em 2017, em plena crise, 1.581 engenheiros saíam da faculdade – praticamente o triplo da quantidade que chegava ao mercado nos anos de maior crescimento da construção. 

Esses profissionais foram atraídos pelo salário – o piso nacional é de oito salários mínimos e meio – e pela possibilidade de crescimento. Naquele momento, segundo o presidente do Senge, Ubiratan Félix, o mais comum era que as empresas pagassem bem mais que o piso. Dava até para escolher quem dava mais pelo serviço. Agora, até o piso é raro. 

 Insustentável O crescimento foi tão grande que dava para imaginar que aquilo não seria sustentável a longo prazo, para alguns especialistas. Em poucos meses, bairros inteiros nasciam praticamente do nada – como o que aconteceu em pontos da Avenida Paralela. E isso só no que tange ao desenvolvimento imobiliário, que é o mais perceptível para a população. No entanto, a infraestrutura pesada também nunca crescera tanto. “Era uma euforia e foi uma questão de tempo para que viesse a realidade. Talvez tenha vindo uma realidade mais dura porque teve outros fatores, como os políticos. A Engenharia Civil passou por uma avalanche”, analisa o engenheiro e professor Marcelo Ferreira, coordenador do curso de Engenharia Civil da Unifacs. Pelas faculdades, passaram milhares de estudantes que, na avaliação do coordenador, muitas vezes nem tinham afinidade com a área. Os números gigantescos, no fim, eram um indicativo de que algo daria errado. O pior, na verdade, ainda estaria por vir. Para o professor, a própria profissão de engenheiro civil passa por um momento muito delicado – a ética do campo foi colocada em debate. 

Pouco tempo atrás, ele chegou a participar de um evento em uma escola, onde apresentou a Engenharia Civil para estudantes do 3º ano. A surpresa veio logo na primeira pergunta de um aluno. “Existe uma cultura de corrupção na profissão de engenharia civil?”, lembra Ferreira. Otimista, tentou explicar para os jovens que a corrupção não está associada a uma profissão específica, mas às pessoas. 

Brasil Naquele ano, a atividade de construção totalizou R$ 318,7 bilhões em incorporações, obras e serviços, um tombo de 14,8% em relação a 2015, quando já tinha encolhido 15,9%. O desempenho negativo se refletiu no Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, que encolheu 3,5%, sob impacto, entre outros fatores, da queda de 10,3% na Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF, medida dos investimentos no PIB).

"Em um contexto de instabilidade econômica começado em 2015, com aumento no desemprego e redução da renda, crédito mais escasso e caro, os agentes econômicos tendem a postergar ou cancelar os investimentos. Dessa forma, o setor da construção foi afetado em 2016 refletindo em uma queda real de 14,8% no valor das incorporações, obras e/ou serviços da construção na PAIC", ressaltou o IBGE.

O instituto lembrou que, em 2016, o crédito imobiliário com recursos da poupança e do Fundo de Garantia do tempo de Serviço (FGTS) teve queda nominal de 16,2%, além de recuo de 10,2% no número de unidades financiadas em relação a 2015.

O resultado geral do setor, porém, foi puxado pela queda de 22,1% no segmento de Obras de Infraestrutura. O componente também foi o que mais influenciou as perdas nos postos de trabalho na construção naquele ano (-17,5%), na massa salarial real (-21,9%) e no salário médio mensal pago aos trabalhadores (-5,2%). 

Financiador de infraestrutura, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) reduziu os desembolsos de R$ 135,9 bilhões em 2015 para R$ 88,3 bilhões em 2016.

O valor das obras e serviços da construção no País atingiu 299,1 bilhões naquele ano, sendo 31,5% desse montante contratados por entidades públicas, o equivalente a R$ 94,1 bilhões. O restante foi proveniente de obras contratadas por pessoas físicas ou entidades privadas.

O País tinha 127 mil empresas ativas na construção, ocupando cerca de 2 milhões de pessoas em 2016. O total de salários e remunerações alcançou R$ 58,5 bilhões, com um salário médio real mensal de R$ 2.235,2.