Ícone do samba, morre aos 97 anos Dona Ivone Lara

Cantora estava internada há três dias no Rio por causa de uma anemia e sofreu parada cardiorrespiratória; ela recebeu transfusão de sangue mas seguia lúcida

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  • Da Redação

Publicado em 17 de abril de 2018 às 04:42

- Atualizado há um ano

. Crédito: Marianna Viana/Divulgação

Considerada a primeira dama do samba brasileiro, a cantora e compostora Dona Ivone Lara, 97 anos, morreu na noite desta terça-feira (16), no Rio de Janeiro, após passar três dias internada. A artista, que tinha feito aniversário no último dia 13, estava acamada no Centro de Tratamento e Terapia Intensiva (CTI) da Coordenação de Emergência Regional (CER), no Leblon.

Dona Ivone Lara estava com quadro de insuficiência cardiorrespiratória grave e também apresentava anemia, ela precisou receber doações de sangue. 

O sepultamento do corpo de Dona Ivone Lara está marcado para as 16h30 no cemitério de Inhaúma, na Zona Norte. Primeira dama do samba, Dona Ivone Lara ainda cantava e compunha, mesmo fraca (Foto: Marianna Viana/Divulgação) Um dos mairoes ícones do samba, mesmo nos dias de fraqueza, ela não deixou a música de lado, segundo relatou a nora Eliana da Costa ao G1. "Ela estava sempre procurando um caderninho pra escrever uma música, estava sempre cantarolando pro neto. Até a última semana ela estava super bem, com a cabeça ótima. Ela estava muito fraquinha, mas a cabeça estava ótima", contou.

O corpo da sabista está sendo velad nesta terça-feira (17) na quadra da escola de samba Império Serrano, em Madureira, no Rio, que era sua escola do coração e da qual foi tema do samba-enredo em 2012. 

O filho, Alfredo Lara da Costa, destacou a mulher forte e guerreira que Dona Ivone foi, sempre pensando em música. "Vai deixar muita saudade, mas sinto muito orgulho do legado que ela deixa", disse. Além de Alfredo, a sambista também era mãe de Odir, morto em 2008 por complicações causadas por diabetes.

"Ao mesmo tempo que é um dia de muita tristeza temos que celebrar essa carreira maravilhosa. Minha avó foi um ser de luz. Ela era muito humilde, às vezes não tinha noção dessa representatividade dela para a música e para o país. É muito orgulho para mim (ser neto)", revelou André Lara.

Segundo ele, as composições inéditas da avó devem ser recuperadas. "Ela sempre compôs e teve muitos parceiros. São coisas que não foram gravadas, músicas que foram resgatadas e finalizamos. Se Deus quiser vamos tirá-las do baú".

Vida na música

Um dos maiores sucessos de Dona Ivone Lara é Sonho Meu, composta em parceria com Délcio Carvalho,com quem assinou dezenas de sambas. Clássico da MPB, Sonho Meu foi regravado por Maria Bethânia e Gal Costa. 

Nascida em 13 de abril de 1921, batizada como Yvonne (a simplificação do nome só veio mais tarde por causa da carreira artística), ela se criou no bairro de Madureira, Zona Norte do Rio. Antes de assumir o samba no sangue a na alma, Dona Ivone Lara se formou em Enfermagem e Serviço Social, com especialização em Terapia Ocupacional, e foi uma profissional na área até se aposentar em 1977. Foi a partir daí que ela passou a se dedicar totalmente à carreira artística. (Foto: Divulgação) A cantora perdeu os pais, que também eram músicos, na infância, e foi criada pelos tios, com os quais aprendeu a tocar cavaquinho e a ouvir samba. A mãe, Emerentina da Silva, cantava nas festinhas em que o pai, João Lara, tocava violão de sete cordas. Ainda criança, aos 12 anos, compôs sua primeira música: Tiê-tiê, inspirada em um passarinho que ganhou. A canção foi feita em parceria como priom, Mestre Fuleiro, que mais tarde se tornaria importate sambista no Império Serrano.

Aluna de Lucília Villa-Lobos, casada como maestro Villa-Lobos, e de Zaíra de Oliveira, vencedora do concurso da Escola de Música do Rio de Janeiro, em 1921, Ivone passou anos sofrendo com preconceito por ser mulher, e viu suas composições serem assinadas por seu primo, Fuleiro.

Aos 25 anos, se casou com Oscar Costa, filho de  Afredo Costa, presidente da escola de samba Prazer da Serrinha.

Nessa escola de samba ela conheceu seus futuros parceiros de composições, como Mano Décio da Viola e Silas de Oliveira. A partir dali não tinha mais volta. Com Silas e Bacalhau, compôs o samba Os Cinco Bailes da História do Rio, considerado o primeiro samba-enredo escrito por uma mulher. Ela  também foi a responsável pelo samba Nasci para Sofrer, que se tornou hino da escola. Nelson do Cavaquinho, Beth Carvalho, Cartola e Dona Ivone Lara  (Foto: Antonio Domingos/Divulgação) Após a fundação da escola de samba Império Serrano, em 1947, ela começou a desfilar na ala das baianas, quando compôs o samba Não me Perguntes. Em 2012, ela foi homenageada pela escola, com enredo Dona Ivone Lara: O Enredo do Meu Samba. Antes, em 2009, recebeu outra merecida homenagem: a biografia Nasci Para Sonhar e Cantar (Record).

Entre seus principais sambas estão: Alguém me Avisou, Acreditar, Tendência, Mas Quem Disse que Eu Te Esqueço, Samba, Minha Raiz, Sorriso de Criança, Sorriso Negro, Sonho Meu e Minha Verdade.

Entre os intérpretes que gravaram suas composições destacam-se Clara Nunes, Roberto Ribeiro, Maria Bethânia, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Paula Toller, Paulinho da Viola, Beth Carvalho, Mariene de Castro, Roberta Sá, Marisa Monte e Dorina.

Enterro

O corpo de Ivone lara foi enterrado nesta terça (17) à tarde, no Cemitério de Inhaúma, na Zona Norte do Rio de Janeiro. Os sucessos da carreira da cantora e compositora embalaram a cerimônia. Na saída do cemitério, fãs e amigos cantaram Aquarela Brasileira, como uma última homenagem ao Império Serrano, escola do coração compositora.

Os sambas Sonho Meu e Acreditar foram a trilha no momento em que o corpo deixava a quadra da Império Serrano. Martinho da Vila e Teresa Cristina foram ao enterro. Bandeira da Império Serrano cobriu o caixão da compositora (Foto: Tania Rego/divulgação)