Já viu? Cozinheira representa a Bahia na série Street Food, da Netflix

Dona Suzana teve infância pobre e descobriu a culinária através de sua mãe

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  • Ronaldo Jacobina

Publicado em 26 de julho de 2020 às 14:38

- Atualizado há um ano

. Crédito: Divulgação

Quem ainda não deu umas bandas lá pros lados da prainha do Solar do Unhão e experimentou a comida de dona Suzana Sapucaia, não sabe o que é que a Bahia, ou melhor, a Baía, tem. Mas essa injustiça está sendo reparada. A cozinheira de fala mansa e pausada - fruto de uma gagueira de nascença que era “arremedada” pelos meninos da rua, mas que apesar de se sentir incomodada com os “dichotes” preferiu fugir do hospital quando a mãe a levou para corrigir a fala com cirurgia - ganhou o mundo. 

Ela é a estrela de uma produção internacional da Netflix que foi lançada no canal de streaming na última terça-feira (21).  Na segunda temporada da série Street Food, os criadores de Chef's Table, Brian McGinn e Daniel Milder aportaram na América Latina e elegeram Salvador como a única cidade representante do Brasil nesta série de seis episódios que conta histórias de resiliência através da autêntica gastronomia local.  Moqueca de peixe preparada por dona Suzana (Divulgação)  Nesta temporada, além do Brasil, a série retrata, através de personagens locais, a força da comida de rua da Argentina, Bolívia, México, Peru e Colômbia. Mas foi aqui, na capital baiana, que os produtores se encantaram. "Quando começamos a conversar com especialistas locais no Brasil, o diretor Dan Milder se apaixonou pela Bahia, por sua história de passado colonial, dos primeiros portos de escravos das Américas que trouxeram várias influências que fazem da Bahia uma cultura tão rica e fascinante, não tivemos dúvidas, queríamos mostrar ao público as tradições culinárias deste lugar vibrante e surpreendente”, conta o produtor McGinn. A comida de rua da capital baiana é destaque na série da Netflix  (Divulgação) A trajetória de Dona Suzana que o mundo conhecerá agora foi apresentada aos baianos pela primeira vez, em 2010, pelo jornal Correio que publicou a primeira reportagem sobre a comida feita por ela na coluna de gastronomia da jornalista Linda Bezerra. A página já amarelada do periódico está até hoje lá na parede do restaurante e serviu como um dos suportes da pesquisa da consultoria local contratada pela Netflix para a criação do roteiro do episódio baiano.  O episódio que trata da Bahia, o primeiro dos seis, começa com a cozinheira narrando sua história. Da infância pobre, a descoberta da culinária através de sua mãe, passando pela decisão de trocar a profissão de lavadeira pela de cozinheira, a parceria de uma vida com o marido Antônio, pescador que vai buscar o peixe para se transformar nas moquecas que dona Suzana prepara no restaurante Re Restaurante que funciona na casa do casal. Tudo narrado em primeira pessoa, carregado de emoção. A gravação do episódio baiano teve locação na cozinha do jornalista do CORREIO Ronaldo Jacobina (Divulgação) Parte das gravações do episódio, mais especificamente a entrevista de dona Suzana, bem como o áudio que perpassa todo o episódio, foi realizada, durante dois dias, na cozinha deste jornalista que aqui escreve. Ou seja, o Correio está duplamente presente na produção americana Como na primeira temporada, quando a série se passa na Ásia, os episódios têm sempre um personagem principal que narra sua trajetória e mais três coadjuvantes – no caso de Salvador são eles a baiana de acarajé Claudia Bárbara; a vendedora de abará, Martinha do Abará; e o capoeirista Kabaça Clementino, que faz e comercializa feijoada na rua.  Além destes, a série inclui ainda imagens e depoimentos de um chef local, falando da comida de raiz, e de um pesquisador da cultura e gastronomia da terra, no caso de Salvador, a chef Tereza Paim e o antropólogo Vilson Caetano, respectivamente.  Dona Suzana exibe a placa de seu restaurante, que fica na Prainha do Solar do Unhão, no quintal de sua casa (Divulgação) A comida de rua, a religiosidade e a forte cultura local são mostrados no episódio com o olhar estrangeiro, claro. Mas amparado por uma pesquisa precisa da consultora Piti Canela e a sensibilidade de Sheila Gomes, que assina a produção local. As duas, baianíssimas e peças fundamentais para que o episódio não resvalasse para o folclore, pecado cometido por nove entre dez produções internacionais sobre a Bahia.  Para chegar aos 32 minutos de duração do episódio, a equipe da Netflix gastou pouco mais de uma semana em solo baiano. “Filmamos por cerca de uma semana em cada local, mas meses antes de trazer as câmeras, no entanto, passamos alguns dias trabalhando com nossas equipes locais no local para explorar a cidade e conhecer os fornecedores e líderes comunitários e mergulhar na cultura local”, explica o produtor. Para o diretor Daniel Milder, a capital baiana jamais será esquecida por ele e sua equipe. “Ficamos impressionados como as artes e a cultura estão  profundamente arraigadas na vida cotidiana dos baianos. É uma coisa bonita de se estar rodeado. A expressão dessas artes é tão específica para o local e sua história, o que dá a tudo muito  mais significado. Foi muito poderoso aprender e experimentar”, ressalta.

Baseados no Vale do Silício, nos Estados Unidos, os produtores da Netflix planejam uma terceira temporada da série, mas fazem  mistério sobre o próximo destino.“Vamos continuar explorando as incríveis tradições culinárias em todo o mundo. Esperamos poder retornar à América Latina e do Sul, bem como à Ásia, pois há muitos países que ainda não apresentamos”, disfarça McGinn .