Jornalistas debatem assédio virtual durante congresso em São Paulo

Ataques se tornaram frequentes em ano eleitoral 

Publicado em 29 de junho de 2018 às 21:30

- Atualizado há um ano

Simplesmente tentar trabalhar pode ser um problema para os profissionais da imprensa atualmente. Se for mulher, as formas de ataques contra o exercício dessa profissão se intensificam. "Quando a mulher sofre a violência é sempre contra sua honra, seu corpo", afirmou a jornalista Thaís Nunes, repórter do SBT, durante palestra realizada na manhã desta sexta-feira (29) no segundo dia do 13º Congresso Internacional de Jornalismo Investigativo, realizado na Universidade Anhembi Morumbi, em São Paulo.

Thaís é uma das fundadoras do coletivo Jornalistas Contra o Assédio, fundado em junho de 2016, com o objetivo de debater e descontruir a cultura do assédio no jornalismo. O grupo foi criado após uma estagiária do portal IG ter sido demitida, depois de tornar público o assédio que sofreu do cantor Biel, durante uma entrevista. "É uma grande preocupação que temos com nossos colegas. Estamos em ano de eleições, e já tivemos alguns casos de ataques contra agências de checagens feitos por grupos de esquerda e direita", explicou Janaina Garcia, outra integrante do coletivo.

O jornalista Luiz Fernando Menezes, repórter da agência de checagem brasileira Aos Fatos, tem bastante propriedade para falar sobre o assunto. Ele conta que a agência onde trabalha é frequentemente atacada por internautas insatisfeitos com o resultado de análises feitas pela empresa sobre um determinado candidato. "Pegam nossas fotos e fazem memes, já fizeram um dossiê com tweets e mensagens no Facebook...Acho mais do que necessário essa palestra. Muita gente comete assédio e nem sabe o que é", contou.

"O [assédio] virtual é minimizado às vezes. Mas ele pode provocar muitos problemas, como o estresse, afetar com o emocional. Só quem sofre sabe. E esse assédio virtual pode se desenvolver para uma agressão física", desabafou a jornalista Thaís Nunes.

Jason Reich é diretor de segurança global do site americano Buzzfeed, e explica que o assédio virtual contra jornalistas é uma forma de tentar silenciar o profissional. "E isso incentiva o jornalista a se auto-censurar também", afirmou. 

Ele ainda orienta que os profissionais da imprensa devem se proteger desse tipo de assédio criando perfis pessoais e profissionais, além de exigir que a empresa para qual esse jornalista trabalha se posicione a seu favor. "O editor deve criticar o ataque publicamente", completou.

Assédio no esporte No último domingo (24), a repórter Julia Guimarães, da Rede Globo, foi vítima de um assédio quando se preparava para entrar ao vivo antes da partida entre Japão e Senegal, na Rússia. Um torcedor tentou beijá-la a força. "É a segunda vez que isso acontece comigo aqui na Rússia. Eu nunca passei por isso no Brasil, mas que fique bem claro que é por sorte mesmo, porque acontece muito no Brasil, já vimos várias vezes com colegas da imprensa", comentou após o ocorrido, em entrevista ao jornal O Globo.

Em março deste ano a campanha "Deixa Ela Trabalhar" surgiu com o objetivo de discutir e repreender casos de assédio sofridos por mulheres no jornalismo esportivo. A idealizadora do projeto é Bruna Dealtry, repórter do canal Esporte Interativo. Um torcedor tentou beijá-la a força durante uma transmissão ao vivo. Outras jornalistas esportivas brasileiras, como Fernanda Gentil e Carol Barcellos, também integram a campanha.

Pesquisa realizada pela Gênero e Número (GN) em parceria com a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), divulgada em dezembro do ano passado, aponta que 70% das jornalistas brasileiras já foram assediadas de alguma forma durante o exercício da profissão.

No estudo, 70,4% das entrevistadas afirmaram já terem sido alvos de abordagens de homens durante o trabalho que as deixaram desconfortáveis. Durante o exercício da função, 83,6% das participantes do levantamento disseram já ter sofrido alguma violência psicológica que elas relacionaram ao fato de serem mulheres.

A pesquisa também revela que o assédio acontece dentro do ambiente de trabalho. 86,4% relataram que têm que enfrentar a discriminação sexista no próprio ambiente de trabalho.