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A decisão determina ainda que o sepultamento não seja realizado em Nazaré
Da Redação
Publicado em 28 de dezembro de 2018 às 12:45
- Atualizado há um ano
O Tribunal de Justiça da Bahia em Nazaré determinou a transferência do corpo de Mãe Stella de Oxóssi para o Ilê Axé Opô Afonjá, em Salvador. Na decisão, a juíza Caroline Rosa de Almeida Velame Vieira ainda determinou que o supultamento não seja realizado em Nazaré, onde ocorre o velório nesta sexta-feira (28).
O pedido foi feito à Justiça pela Sociedade Cruz Santa, entidade civil que mantém e administra o Ilê Axé Opô Afonjá. As petições foram protocoladas durante a madrugada desta sexta.
Na decisão, a juíza entendeu que "se deve conceder à comunidade o exercício do culto religioso, ante a supremacia do princípio que aqui seria violado, de forma irreversível, do exercício livre da religião da qual a Iya Stella de Oxossi era líder, bem como a proteção do patrimônio histórico e cultural do exercício da religião de matriz africana".
No pedido para a Justiça, a Sociedade argumenta que é necessário fazer as "obrigações religiosas referente a religião de matriz africana candomblé, o ritual do sepultamento e, subsequente, do axexê".
"Nos ritos de religião de matriz africana, o sepultamento e o ritual do axexê é fundamental, sobretudo, para uma líder religiosa, para tal desiderato é necessário que seu corpo físico, mesmo que morto, esteja dentro do espaço religioso no qual foi sacralizado, no caso de Mãe Stella de Oxóssi esse lócus é o terreiro do Ilê Opô Afonjá".
Eles ainda consideraram que o velório e sepultamento fora do terreiro é "uma afronta a toda a uma tradição religiosa Africana a eus acomunidade". A juiza afirmou, em sua decisão, que a não relização do ritual religioso seria uma "medida irreversível" e que poderia colocar em risco a "continuidade dos ritos religiosos" do terreiro.
"Nesse nessa monta, ante a precariedade da decisão vê-se que causará menos prejuízo se o velório se der em Salvador, visto que assim se estará evitando que todo um culto religioso seja violado ante a alteração do lugar do sepultamento da Iya Stella de Oxossi, ainda que indo contra o exercício da companheira de escolher o local de sepultar o corpo conforme direito que lhe assiste", acrescentou a juíza.
Em nota, a Comissão Especial de Combate à Intolerância Religiosa da Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional Bahia (OAB-BA) se manifestou afirmando que entende que a realização do velório e enterro deveria ser feito com o ritual religioso.
"Assim, a prima facie, o conjunto de elementos próprios ao cerimonial fúnebre nos termos da profissão de fé da liderança religiosa deve ser rigorosamente respeitado, em consideração à memória e empenho sobre-humano da religiosa em testemunhar da religião de matriz africana de forma sensível e translúcida", diz a nota.
Confira nota na íntegra:A Comissão Especial de Combate à Intolerância Religiosa da OAB da Bahia vem a público manifestar seu mais profundo pesar pela morte de Mãe Stella de Oxóssi ocorrida na tarde de ontem, dia 27/12/2018, ao tempo em que se solidariza com familiares, amigos(a), filhas e filhos de santo, toda a comunidade do Terreiro Ilê Axé Opô Afonjá, praticantes de religiões afrobrasileiras e admiradores no Brasil e no mundo.
Mãe Stella de Oxóssi formou-se pela Escola de Enfermagem e Saúde Pública e iniciou sua função religiosa em 1976, quando escolhida como quinta iyalorixá da tradicional casa Ilê Axé Opó Afonjá, a qual, sob sua guia, foi tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 1999.
Mãe Stella de Oxóssi transcende a poderosa representatividade religiosa dada a importância sociocultural e política de suas produções literárias e artísticas, tendo ascendido à cadeira 33 na Academia Baiana de Letras, cujo patrono é Castro Alves, bem como por figurar como proeminente ativista e militante de movimentos sociais marcada pela luta pela igualdade racial e reproche ao ódio religioso.
Ciente da existência de litígio judicial em torno do sepultamento de Mãe Stella de Oxóssi, no qual se discute a sua realização em Nazaré das Farinhas, cidade em que vivia nos últimos meses com a sua companheira ou a transferência de seu corpo para Salvador, a fim de promover o cumprimento dos preceitos junto ao Ilê Axé Opô Afonjá, considerando que a sucessão espiritual que culminará na substituição da sacerdotisa prescinde da liturgia que envolve o sepultamento seguida do axexê, sob pena da inviabilização das atividades da casa e realização das obrigações de práxis, manifestamo-nos sobre o impasse instaurado.
A Comissão entende que, diante de toda uma vida dedicada ao Candomblé, mediante entrega voluntária ao sacerdócio, promovendo e defendendo a fé, além da longeva atuação na preservação da religião e da religiosidade como elementos identitários da cultura brasileira, a menos que existe disposição de última vontade (o que é desconhecido) de Mãe Stella de Oxóssi, como testamento ou codicilo, em sentido divergente, ou seja, que aponte a recusa ou negativa do ritual religioso de passagem previsto, dever-se-ia assegurar-lhe a realização, em consonância com o art. 5º, inciso VI da CF no qual verifica a inviolabilidade da “liberdade de crença” e a garantia “na forma da lei a proteção aos locais de culto e suas liturgias”.
Mãe Stella de Oxóssi faz jus a todas as honras reservadas a uma sacerdotisa de sua grandeza, de acordo com a tradição que durante tantos anos observou, ensinou e conferiu ampla publicidade. Assim, a prima facie, o conjunto de elementos próprios ao cerimonial fúnebre nos termos da profissão de fé da liderança religiosa deve ser rigorosamente respeitado, em consideração à memória e empenho sobre-humano da religiosa em testemunhar da religião de matriz africana de forma sensível e translúcida.