Livro analisa relação de críticos com a obra de Roberto Carlos

'Querem Acabar Comigo' como trabalho de conclusão de curso do autor de 23 anos

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  • Roberto Midlej

Publicado em 16 de abril de 2021 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Angeluci Figueiredo/Arquivo CORREIO

Quando se diz que fulano é um ídolo que “conquistou gerações”, muitas vezes não passa de um clichê. Mas Roberto Carlos não deixa dúvidas de que isso, em alguns casos, é mesmo verdade. E o jovem Tito Guedes, de 23 anos, nascido em Niterói (RJ) é a prova disso: em 2019, ele concluiu o curso de Estudos de Mídia na Universidade Federal Fluminense e desenvolveu um trabalho de conclusão em que analisava como a crítica musical tratou Roberto Carlos em quase 60 anos de carreira.

Agora, o TCC sai em forma de livro, para celebrar o aniversário de 80 anos do Rei, comemorado na próxima segunda-feira, 19. Querem Acabar Comigo (Máquina de Livros/R$ 42/144 páginas) reúne trechos de resenhas publicadas em jornais como Folha de S. Paulo, O Globo e Estadão em diversas fases de Roberto Carlos. Entre uma crítica e outra, Tito comenta como os especialistas recepcionavam a obra do Rei. Sérgio Cabral, Augusto de Campos, Fausto Wolff e Carlos Calado são alguns dos autores das resenhas analisadas por Tito. Tito Guedes, autor de Querem Acabar Comigo “Não é uma antologia de críticas, mas uma análise minha sobre os textos, acompanhada de uma contextualização”, diz o autor. A organização é cronológica, o que dá uma ideia de como a opinião dos críticos sobre o cantor oscilou conforme o tempo. “No início da carreira dele, tinham uma opinião muito negativa, principalmente porque havia uma divisão muito forte entre a MPB e a Jovem Guarda. Havia um grande radicalismo”, diz Tito. O autor cita o caso do crítico Sérgio Augusto, que chegou a afirmar que o cantor era um “debilóide” cantando sobre um calhambeque.

Tropicália A má vontade da crítica começou a mudar um pouco somente depois de alguns tropicalistas avalizarem a obra do cantor. “Com o sucesso de Quero Que Vá Tudo Pro Inferno, Roberto virou estrela. Mas os críticos diziam que ele estava a serviço do 'entreguismo' ou que acabaria com a verdadeira música popular brasileira. Os tropicalistas, no entanto, achavam que a música americana [que influenciava a obra de Roberto] tinha valor para eles”, diz Tito. 

O autor cita o verso “Você precisa (...) ouvir aquela canção do Roberto”, da canção Baby, de Caetano Veloso, como uma “propaganda” a favor do cantor que àquela altura deixava a Jovem Guarda.

Mas na crítica jamais houve unanimidade sobre Roberto Carlos, nem mesmo na fase em que ele gravou discos históricos influenciados pelo soul, hoje cultuados por jovens como Tito. “Aconteceu só um pequeno 'namoro' com a crítica quando ele ganhou o Festival de San Remo, em 1968, quando saiu da Jovem Guarda para um estilo mais 'maduro' e se aproximou também da black music”.

Nos anos 80, quando Roberto Carlos entra numa fase considerada “brega” por muitos, a crítica não perdoa novamente. “Para se ter uma ideia, quando saiu o disco dele de 1993, O Globo publicou numa mesma página textos de três críticos importantes. E todos falavam mal do disco. Que outro artista seria capaz de mobilizar três críticos de um jornal importante para falar, ainda que mal, de seu trabalho?”, questiona Tito.

O que a crítica falava sobre Roberto Carlos

* “Um debiloide de pouco mais de vinte anos que se diz homem ‘mau’ e ficou conhecido graças a um barulhento calhambeque”  Sérgio Augusto, em 18 de março de 1965, no Jornal do Brasil

*Se já tivessem inventado um medidor de breguice, a faixa Aventuras atingiria grau máximo. A linha geral é a de “amor e cavalgadas noturnas”. O refrão é surpreendente: “Aventuras, lindos sonhos que motivam/ Esse nosso amor”  Carlos Calado, em 15 de dezembro de 1987, na Folha de S. Paulo

* Um ótimo cantor, sem dúvida, que deveria cantar coisas melhores. Disse ‘deveria’ e já me arrependo, pois essa, certamente, não é a opinião das 500 mil pessoas que comprarão, mais uma vez, o seu disco. Tudo bem  Sérgio Cabral, em 6 de dezembro de 1976 em O Globo

*É um artista de primeira grandeza na história da MPB, um cantor que emociona, que sabe descobrir o segredo de uma canção e cantá-la sem o menor esforço, independente de suas dificuldades pouco aparentes   Zuza Homem de Mello, em 10 de dezembro de 1981, no Estado de S. Paulo

Outros lançamentos sobre Roberto Carlos Roberto Carlos - Por Isso essa Voz Tamanha O livro de Jotabê Medeiros, ex-repórter do Estado de S. Paulo, sai pela editora Todavia, com 512 páginas. Conta a história do Rei de forma cronológica, para dar uma ideia de como o cantor se consagrou como o maior ídolo da música brasileira. Para não correr risco de ser processado - ou para diminuir a possibilidade de acontecer isso -, Jotabê submeteu o livro a uma consultoria jurídica. Assim, se sentiu mais seguro para contar histórias como a de um corretor homônimo ao músico, que foi obrigado a mudar o nome de sua empresa, Roberto Carlos Imóveis, depois de processado pelo Rei.

Roberto Carlos - Outra Vez  O baiano Paulo César de Araújo é o autor da biografia lançada pela Record em dois volumes. Este primeiro vai de 1941 a 1970 e chega ao mercado em maio ou junho. No final do ano, sai o segundo. Araújo é o autor de Roberto Carlos em Detalhes, que foi recolhida das livrarias depois que o cantor processou a editora Planeta. Desta vez, o escritor usa um formato bem original: a partir de uma música, introduz um tema. O Divã, por exemplo, é pretexto para apresentar a casa do Rei e os pais dele: “Relembro a casa com varanda/ muitas flores na janela/ minha mãe lá dentro dela”.