Livro tem oito contos sobre personalidades baianas do século XIX

Histórias fictícias são inspiradas em personalidades reais

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  • Roberto Midlej

Publicado em 25 de maio de 2021 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto 1: Mariana de Paula; Foto 2: divulgação; Foto 3: Antonio Corrales

Em tempos de pandemia, em que até uma simples ida à padaria da esquina pode representar risco de ser infectado, viajar parece um sonho distante. Então, que tal fazer uma viagem até a Bahia do século XIX sem sair de casa? Essa é a ideia do livro Histórias e Histórias da Bahia (Caramurê/ R$ 70/ 104 págs.), que será lançado em uma live nesta terça (25), às 19h, com a presença dos autores e do historiador Daniel Rebouças, além de Fernando Oberlaender, artista plástico e editor da Caramurê. 

Oberlaender convidou oito escritores para criarem contos inspirados na vida de oito personalidades públicas que viveram na Bahia no século XIX. Há figuras populares, como Antônio Conselheiro, até outras menos conhecidas, como  João Ramos de Queiroz, que foi um dos pioneiros no negócio de transportes urbanos de Salvador. O primeiro está em Viva o Conselheiro, de Aleilton Fonseca, enquanto o segundo inspira Um Certo João Ramos de Queiroz, assinado por Carlos Ribeiro. 

Há contos de outros seis autores: Clarissa Macedo, Marcus Vinicius Rodrigues, Mirella Márcia Longo, Saulo Dourado, Suênio Campos de Lucena e Wesley Correia. "Fizemos um livro com essa pegada de 'ficção histórica', com esses autores maravilhosos e o resultado encanta. Em cada conto, os autores ficaram livres, respeitando, naturalmente, algumas bases históricas", diz Oberlaender. Aleilton Fonseca inspirou-se em Antonio Conselheiro Mirella Márcia Longo assina a história Uma Mulher Como Tantas. A autora imagina como a cantora de ópera Agnese Trinci Murri, já bem idosa, lembraria de um encontro amoroso com Castro Alves. O encontro, na verdade, nunca ocorreu e é fruto da imaginação de Mirella. Agnese havia sido, na época em que vivia em Salvador, professora de música de Adelaide, irmã do poeta, que era mesmo apaixonado por ela.

No entanto, a italiana nunca cedera aos seus galanteios, ainda que ele lhe dedicasse alguns de seus poemas, como Gesso e Bronze, em que, observa Mirella, ele trata Agnese como uma mulher "inquebrantável", afinal ela resistiu firmemente a seus cortejos.

Quando pesquisou sobre a vida de Agnese, Mirella soube que a amada do poeta havia ido morar na Itália, em Verona, depois da passagem por Salvador. A cantora lírica havia se casado com um cantor de ópera. Até aí, é tudo verdade. Mas a noite de amor com Castro Alves, já tísico e nos seus últimos dias, nunca ocorreu.

Mirella acredita que a experiência de misturar ficção a realidade é enriquecedora."Cabe ao autor encontrar os vazios da realidade e preenchê-los. Isso não limita o escritor. Ao contrário, alimenta e nos instiga a imaginar", revela a autora de sete livros, entre coletâneas de poemas, contos e ensaios literários. Mirella é também professora titular de literatura na Ufba e pesquisadora do CNPq. Foto que inspirou conto de autoria de Marcus Vinicius Rodrigues, sobre o fotógrafo Lindemann No encontro erótico entre Castro Alves e Agnese, imaginado por Mirella, o poeta está agonizando, confuso. "Ela se decepciona porque, naquele dia, a chama de Eugênia, ao lembrar de Eugênia Câmara, por quem ele se apaixonou aos 16 anos e que, para muitos, foi o grande amor de Castro Alves", diz Mirella.

Marcus Vinicius Rodrigues é o autor de O Olhar Distante, inspirado na passagem do fotógrafo alemão Rodolfo Lindemann por Salvador.  Lindemann assinava com o colega Guilherme Gaensly a autoria de algumas imagens panorâmicas da cidade. Mas o suíço Gaensly tornou-se mais conhecido que ele e pouco se sabe sobre a vida do alemão.

O autor, portanto, teve liberdade quase plena."A vida dele é muito pouca conhecida, mas algumas fotos dele são conhecidas. Quis fazer um conto sobre o olhar, mas não o olhar de Lindemman sobre a cidade. Escolhi o olhar de uma moça negra que aparece na foto A Vendedora de Frutas. Descrevo o olhar dela e de um menino que está com ela. A moça olha para o fotógrafo e parece estar resistindo à situação. A foto é linda, mas a fotografada ali é tratada como um objeto", diz Marcus Vinicius."E o menino tem um olhar triste, como se soubesse tudo de ruim que aconteceu e que vai acontecer para os negros", acrescenta o autor.

No conto, o narrador, que vive em tempos atuais, é uma pessoa que está visitando uma exposição fotográfica e "entra" numa das fotos panorâmicas de Salvador. Ali, imagina como seria o dia em que Lindemman tirou a foto da vendedora de frutas. Na história, Lindemman vai até o Forte de São Marcelo, onde a foto seria tirada. Ele chega ali transportado por um barqueiro que é namorado da moça a ser fotografada.

Segundo Marcus Vinicius, cria-se uma tensão entre os dois, já que o rapaz tem raiva de Lindemman porque ele vai fotografar a moça. "Ela não quer posar para a foto, mas ela achava que não podia dizer 'não' porque, para ela, era perigoso recusar. Por isso, fica com raiva do fotógrafo. A viagem de retorno do Forte, à noite, fica muito tensa porque a gente não sabe se o barqueiro vai fazer algo contra Lindemman".

AUTORES, CONTOS E PERSONAGENS

- Autor: Aleilton Fonseca; Conto: Viva o Conselheiro; Personagem: Antonio Conselheiro - Autor: Carlos Ribeiro; Conto: Um certo João Ramos de Queiroz; Personagem: João Ramos de Queiroz - Autor: Clarissa Macedo; Conto: O Ouro da Ira; Personagem: Júlia Fetal - Autor: Marcus Vinicius Rodrigues; Conto: O Olhar Distante; Personagem: Rodolfo Lindemann  - Autor: Mirella Márcia Longo; Conto: Uma mulher como tantas; Personagem: Agnese Trinci Murri  - Autor: Saulo Dourado; Conto: Todas as Luzes; Personagem: Juliano Moreira - Autor: Suênio Campos de Lucena; Conto: O Homem do Elevador; Personagem: Antônio de Lacerda - Autor: Wesley Correia; Conto: Libertário; Personagem: Luiz Gama

Serviço Terça (25), 19h, na TV Caramurê, no YouTube