Lúcio nega ter tentado reeleição por foro: 'Quis pelo povo da Bahia e por minha família'

Réu no STF, ele perdeu eleição; MBD encolheu 50% na Câmara e não elegeu baianos

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  • Yasmin Garrido

Publicado em 9 de outubro de 2018 às 02:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Robson Mendes/Arquivo CORREIO

Envolvido em casos de corrupção, lavagem de dinheiro, associação criminosa e investigado por quebra de decoro parlamentar no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, o deputado federal Lúcio Vieira Lima (MDB) teve, no domingo (7), uma notícia inesperada: não conseguiu a reeleição para mais um mandato em Brasília.

Mais votado em 2014, com 220 mil votos, o político baiano conseguiu, neste ano, cerca de 55 mil registros, o que corresponde a uma perda de 75% do eleitorado. O resultado não foi suficiente para uma cadeira da Câmara, levando, inclusive, à perda do foro privilegiado a partir de 2019.

No entanto, Lúcio contou ao CORREIO que, apesar da derrota, a campanha foi a mais feliz que já fez. “Eu não busquei a reeleição para garantir foro privilegiado, até porque, o foro já não dá mais segurança a ninguém. Só serve para definir onde os processos vão ser julgados. Eu quis me candidatar pelo povo da Bahia e por minha família. E essa foi, de longe, a campanha mais feliz e mais bonita que já fiz”, declarou.

O emedebista também afirmou que não esperava a derrota. “A gente esperava levar, mas nas condições do partido, que estava praticamente sozinho na coligação. Não conseguimos a vaga”, disse. Ainda segundo ele, a escolha de ACM Neto de lançar a candidatura de Zé Ronaldo ao governo dispersou os apoios.“Isso deu uma desorganizada nas oposições e, consequentemente, levou ao crescimento do PT, como pudemos observar”, destacou.O deputado federal aproveitou para demonstrar espanto com o crescimento no PSL na Câmara dos Deputados. “Era um partido que não tinha expressividade e, de uma hora para outra, ganhou 51 cadeiras em Brasília. Na Bahia, a quantidade de votos do PSL e também de (Pastor Sargento) Isidório fizeram com que não tivesse espaço para os candidatos do MDB”, concluiu.

Ao ser questionado pelo CORREIO sobre os próximos passos, principalmente, quanto ao rumo das ações penais que responde no Supremo Tribunal Federal (STF), o deputado não hesitou: “Eu sou muito pragmático. Para mim, o que não tem remédio, remediado está. Meu plano hoje é chegar amanhã e ver se eu estou vivo. Depois de amanhã eu faço a mesma coisa. Hoje agradeço a Deus e espero acordar vivo pra continuar vivendo”. 

Novo cenário Mas, a nova arrumação da Câmara dos Deputados mostrou que entre as eleições de 2014 e o pleito do domingo, muitos partidos perderam espaço. Ao analisar os números de deputados federais eleitos - e não os que permaneceram no cargo até o fim do mandato -, é possível notar que o MDB foi o partido com mais déficit, com 32 cadeiras a menos, uma variação negativa de 48,5%.

Logo atrás aparece o PSDB, que terminou as eleições de 2018 com 25 deputados a menos do que há quatro anos e um déficit de 46,3%. No entanto, se for observada a variação partidária entre as eleições, o PRTB, que elegeu um deputado em 2014, finalizou o pleito do domingo sem nenhuma cadeira, uma perda de 100%.

Já o PSL, partido do presidenciável Jair Bolsonaro, foi o mais expressivo em aumento de cadeiras na Câmara dos Deputados, com variação positiva de 5.100%, saltando de 1 para 52 deputados eleitos. Atrás dele aparece o Avante, com variação positiva de 600%, e o Podemos, que aumentou em 175% o número de deputados em Brasília.

Acusações e processos Mas, mesmo o MDB tendo conseguido 34 cadeiras na Câmara, a Bahia não elegeu nenhum deputado do partido, o que inclui Lúcio Vieira Lima, apesar de ele ter sido o mais bem votado da coligação Pra Mudar de Verdade (ao lado do DC). Foram, ao todo, 41 candidaturas de emedebistas a deputado federal pela Bahia.

Lúcio é réu no STF na ação penal que investiga os R$ 51 milhões encontrados em um apartamento de Salvador em 2017, o que levou à prisão do irmão dele, o ex-ministro Geddel Vieira Lima. Além do deputado, respondem ao processo a mãe dele, Marluce Vieira Lima, o ex-assessor parlamentar Job Ribeiro Brandão e o empresário sócio da Cosbat Luiz Fernando Machado da Costa Filho.

O processo ainda está na fase de instrução, quando o Supremo ouve as testemunhas de acusação e defesa, além das partes. Os depoimentos de Lúcio e Geddel estão marcados para o dia 31 de outubro, na sede do STF, em Brasília. Já a mãe deles vai ser ouvida um dia antes, em Salvador, junto com Job e Luiz Fernando. 

Além do processo que apura o bunker dos Vieira Lima, a família também é investigada em outros inquéritos no Supremo, entre eles, um que apura a contratação de funcionários fantasmas com dinheiro público e outro sobre suposto crime de lavagem de dinheiro a partir da locação de maquinário agrícola.

Todos os casos tramitam no STF e, com a perda do foro privilegiado por Lúcio, segundo entendimento da Corte na Questão de Ordem discutida na AP 937, devem ser imediatamente enviados à primeira instância da Justiça. Além dos processos judiciais, Lúcio Vieira Lima responde a um processo administrativo por quebra de decoro parlamentar junto à Comissão de Ética da Câmara dos Deputados.

A previsão do relator do caso, deputado Hiran Gonçalves, era de que a denúncia fosse retomada após as eleições. O CORREIO tentou contato com o presidente da Comissão, deputado Elmar Nascimento, mas ele não estava na Casa.

Perda de força Após o caso do bunker dos R$ 51 milhões, o MDB baiano, que também era o partido do ex-ministro Geddel Vieira Lima, preso na Papuda em Brasília, perdeu força e, consequentemente, Lúcio acabou tendo menos apoio nas disputas eleitorais de 2018. O cientista político e professor Jurandir Sá Barreto chamou isso de “linchamento moral do povo”.

Para ele, todos os grandes partidos, que têm tradição na política, perderam espaço na Câmara. “Isso representa o desprezo que o povo vem tendo pelos velhos políticos, por aquela política já tradicional e, por isso, apostou no novo. A gente percebe, por exemplo, que pessoas como Lúcio Vieira Lima, Imbassahy, Romero Jucá, o clã dos Sarney, Jutahy Magalhães não se reelegeram. É esse o desprezo do povo por aquela representatividade antiga, que vem se repetindo há décadas”, declarou.

O cientista político Jovianiano Neto entendeu da mesma forma e acrescentou que o MDB, por ser o partido do atual presidente Michel Temer e estar diretamente ligado a casos de corrupção, perdeu muita popularidade. “Isso refletiu nos candidatos a deputado federal e também na candidatura de Henrique Meirelles, que teve menos voto que Cabo Daciolo (Patriota)”, afirmou.

Ainda segundo Jovianiano, todo o desgaste do partido pode explicar o porquê nem Imbassahy nem Lúcio conseguiram a reeleição. “A imagem deles ficou atrelada à impopularidade de Temer. Imbassahy, por um lado, passou muito tempo como ministro da Secretaria de Governo. Já Lúcio, além da sigla, precisou carregar o peso das malas dos R$ 51 milhões, que foi muito difícil”, disse.

Outro aspecto levantado pelo cientista político foi a tentativa de reaproximação de Lúcio com antigos aliados.“Deu para perceber que ele tentou apoios no interior. A campanha dele girou toda em torno de cidades do interior e de antigas alianças, o que não deu certo. Tudo isso, o partido e os apoios levaram à não reeleição dele”, declarou.Por outro lado, para Joviniano, a imagem de Jair Bolsonaro atrelada ao PSL foi benéfica e refletiu na composição da Câmara dos Deputados. "Eu costumo pensar que nenhuma solução rápida para problemas complexos é coerente. Mas, o Brasil está desesperado e preferiu acreditar nisso. A resposta está nas urnas, nos resultados, com grande expressividade do PSL em Brasília", concluiu.

Parlamentar O deputado federal Lúcio Vieira Lima é o único membro do MDB baiano com manado ativo na Câmara dos Deputados, além de fazer parte da bancada ruralista, defender a regularização fundiária e a exploração privada do petróleo. Por outro lado, é contra o porte de armas e discutiu, ao longo da carreira política, temas voltados aos direitos humanos.

De acordo com a última prestação de contas do Tribunal Superior Eleitoral, o baiano é sócio proprietário de 14 propriedades rurais, além de ter votado apenas duas propostas favoráveis ao meio ambiente.

A partir de dados da Transparência da Câmara dos Deputados e do Registro Aeronáutico Brasileiro, da Anac, Lúcio é o primeiro entre os cinco deputados federais baianos que gastaram, juntos, mais de R$ 136 mil em verbas públicas, em 2017, em combustível para aeronaves, mesmo sem ser donos de aviões.

O combustível foi comprado com a cota parlamentar, mesmo a verba servindo apenas para financiar atividades do mandato. Campeão de gastos, o emedebista gastou, entre fevereiro e dezembro, o equivalente a R$ 64 mil. Já os gastos de Lúcio com passagens aéreas, locação de carros e gasolina chegou a R$ 319 no mesmo período.

Lúcio começou a carreira política como auxiliar de gabinete na Câmara em meados dos anos 80 e em 2007 foi eleito presidente do PMDB na Bahia. Três anos depois, o emedebista foi eleito deputado federal pelo partido e se reelegeu em 2014. O mandato atual de Lúcio termina no dia 31 de dezembro.

*Com supervisão do editor João Galdea.