Mãe Stella de Oxóssi, minha estrela ancestral

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  • Da Redação

Publicado em 28 de dezembro de 2018 às 14:29

- Atualizado há um ano

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Cheguei ao Afonjá, em maio de 89. Fui levada por minha mãe biológica e irmã de santo, de nome Iraildes também. Era véspera da festa de Oxóssi. Entrei a casa de Xangô e minha mãe me apresentou a Mãe Stella. Esta me olhou com seu olhar flecheiro, colocou a mão no meu peito e falou: “Bonita filha, mas cismada” e sorriu alegremente.

Não fui iniciada por minha mãe Stella, mas esta complementou nossas obrigações de 3 e 7 anos . Tornamos-nos família espiritual. Éramos confidentes e ela confiava e acreditava muito em mim. Orientou-me sobre como driblar os passos e compassos da vida, desta sociedade desigual, racista, misógina, sexista.

Convidou-me para ser professora da Escola Municipal Eugênia Anna dos Santos, escola de sua fundação baseada nas orientações ancestres de Mãe Aninha. Aceitei o convite e com o passar do tempo, me ofertou o desafio de ser gestora da escola. Tentei escapar como vice gestora, mas no período que não cabia mais, me cobrou o lugar na gestão escolar. Aceitei o desafio de gerir uma escola plural, com especificidades emocionantes.

Ontem, como em todos os anos, fizemos a formatura das crianças do 5º ano fundamental, validando por 4 décadas o legado de mãe Aninha em sua frase secular: “Eu quero ver meus filhos com anel nos dedos aos pés de Xangô”. Esta frase impulsionou minha mãe Stella e com seu olhar de Estrela fundou a escola.

Para nós, educadoras e educadores, é o que oxigena nosso fazer pedagógico. Costumamos fazer nossas festividades pedagógicas, às quartas- feiras, mas devido ao falecimento de uma Egbome (filha de santo mais velha) na semana passada, trocamos a data para o dia de ontem, 27 de dezembro. Organizamos tudo em azul e branco... As crianças estavam emotivas, muito diferente de outros anos. Brinquei que quebramos o protocolo, realizando o evento na quinta feira com decoração em azul.

Ledo engano meu... Tudo aconteceu conforme o desejo de meu pai Oxóssi. Festejamos o que minha mãe Stella mais gostava: o crescimento das crianças na comunidade escolar, no dia de Oxóssi; ao concluir a formatura, a notícia chegou. A sociedade civil e religiosa acompanhou as noticias tristes da nossa comunidade no terreiro. Cada grupo se posicionou com seu olhar telespectador, mas neste momento falar sobre minha mãe Stella é resgatar todas as alegrias que vivi junto com minha família biológica ao lado dela. Hoje é um momento de dor. Um momento que todas e todos nós sabíamos que um dia chegaria.

Entretanto, é o momento de cuidar de um corpo que cuidou do mundo. Do mundo sim, porque todos os títulos recebidos por minha mãe Stella foram resultados da sua ação pela Paz Mundial. O corpo de uma pessoa iniciada na religião de matriz africana, deixa de ser civil para ser conduzido pelo seu orixá e, assim, antes de ser sepultado passa por rituais para que possamos celebrar seu nascimento ancestral.

E com nossa mãe Stella não poderá ser diferente. Ela é a matriarca da nossa comunidade, sua liderança religiosa atravessou a porteira do Ile Ase Opo Afonja e irmanou a sociedade do povo de santo e outros segmentos civis. Estamos em luto, estamos no axexê. Estamos em silêncio reverenciando a Estrela Azul da Bahia, a nossa Escritora, a nossa Dra Honoris Causa, nossa Gestora da Escola Municipal Eugênia Anna, nossa Imortal Mãe Stella de Oxossi!.

Minha mãe, fomos abençoadas por vários anos no espaço carnal, em nossas conversas mais próximas aprendi e te agradeci. Hoje, a senhora voltou a ser a estrela que trouxe no nome civil, entretanto eternizará a alegria do caçador. Meu coração está apertado, não me faltou o chão porque Xangô Afonjá nos sustentará. Choro a dor, mas tenho na memória os passos assertivos conhecidos desde 1989. Como entre seus dizeres: “ Todos nós podemos ser imortais, contanto que cumpramos com competência e alegria a função que nos foi destinada”. E assim, a senhora fez... Hoje nossa ancestral.

Siga na luz da estrela maior, nos ilumine e norteie conforme nosso merecimento.

Sua benção minha ancestral!

Iraildes Nascimento é pedagoga, egbome do Ilê Axé Opô Afonjá e gestora da Escola Municipal Eugênia Anna dos Santos

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