Mandante confesso da morte de Valdir Cabeleireiro não será julgado

Justiça alegou falta de provas; irmã se diz chocada. MP-BA ainda não se posicionou

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  • Alexandre Lyrio

Publicado em 10 de novembro de 2017 às 16:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Reprodução/Arquivo CORREIO

O traficante que confessou à polícia que mandou matar Valdir Macário, o Valdir Cabeleireiro, não vai ser julgado pelo crime, que neste domingo (12) completa um ano. Mesmo indiciado após a investigação policial e denunciado pelo Ministério Público Estadual (MP-BA), o traficante Edgar da Silva Santos, conhecido como Chocolate, foi impronunciado na Justiça, ou seja, não deve ser julgado. Apenas um dos executores da ação, Patric Ribeiro Tupinambá, que aparece segurando um fuzil nas imagens do circuito interno de segurança do salão de Valdir, vai a júri popular.

Segundo a assessoria do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), o juiz Eduardo Augusto Leopoldino, responsável pelo caso, considerou que o Ministério Público “não conseguiu provar que Edgar da Silva Santos foi o mandante e, por esse motivo, ele foi impronunciado”.

Procurado, o MP-BA informou que não iria se posicionar sobre a decisão da Justiça porque o promotor do caso está de férias. De acordo com o TJ-BA, a decisão cabe recurso.

Edgar e Patric foram presos no dia 10 de janeiro, quase dois meses depois do assassinato.  Chocolate e Patric estão presos; o mandante, apenas pelo crime de tráfico (Foto: Almiro Lopes/Arquivo CORREIO) Ao saber da decisão da Justiça, informada pelo CORREIO, uma das irmãs de Valdir, Aldízia Macário, ficou chocada. "Estou pasma, sem acreditar. Fiquei desnorteada aqui", disse Aldízia.

Em depoimento, Edgar disse que mandou matar Valdir por ciúmes da esposa. O cabeleireiro estava, segundo ele, ajudando o irmão, Reginaldo Manuel da Silva, a ter encontros amorosos com a sua mulher.

Um mês antes de Valdir morrer, o irmão dele, Reginaldo, sofreu um atentado, mas sobreviveu. Chocolate então só continua preso por já ter uma condenação de 19 anos e seis meses de prisão por tráfico de drogas.“Ele só está preso por conta dessa condenação (por tráfico)”, confirma o diretor do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), José Bezerra.O diretor garante que, à polícia, tanto Edgar quanto Patric confessaram o crime. “Patric é uma espécie de filho de criação de Chocolate e cumpriu um pedido dele”, afirma Bezerra. “Essas foram palavras deles em depoimento”. 

O vídeo que circulou na Internet após a morte de Valdir Cabeleireiro mostra parte da ação dos assassinos. Dois homens, um deles com um fuzil, aparecem invadindo o salão. Eles provocam pânico, procuram Valdir e, quando o encontram, um deles dispara à queima roupa. “Ele disse: 'corre minhas irmãs, corre. Podem me deixar por último'”, lembrou Ide Macário, irmã de Valdir, em entrevista ao CORREIO na semana passada.

Foragidos O homem que atirou em Valdir, além do motorista que participou da ação, continuam soltos. O diretor do DHPP, José Bezerra, disse, porém, que os dois principais envolvidos no crime estão presos. "Além do mandante, Edgar, o outro preso, Patric, teria comandado a invasão ao salão. Prendemos Patric e Chocolate, que são os principais”.   

Mas, o delegado admite que os outros dois sequer foram identificados. Isso porque, nos seus depoimentos confessos, Edgar e Patric pouparam ambos. Além disso, as imagens do circuito interno não mostram bem o homem que atirou em Valdir. Muito menos o motorista.

O delegado diz ainda que, apesar dos dois foragidos, o crime está elucidado e o inquérito foi concluído. “Mas não é porque fechamos em relação a Patric e Edgar que as investigações não continuam. Estamos tentando identificar os outros dois”, informou o delegado. 

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Recado que não chegou Agora, um ano depois da tragédia, um amigo pessoal de Valdir, o produtor cultural e policial aposentado Neivaldo de Oliveira Sales, 53, revelou ao CORREIO que a vítima chegou a pedir que ele localizasse o bandido, Chocolate, e desse um recado. “Ele sabia que eu, como ex-policial, tinha o poder de chegar até o cara. Ele queria dizer ao cara que a família não apoiava o que o irmão estava fazendo”, conta Neivaldo.

O amigo revela também que Valdir chegou a proibir Reginaldo de ir ao seu salão. “Ele disse: ‘Neivaldo, eu vou montar um salão para Reginho. Eu vou dar um salão a ele e mandar ele seguir a vida dele. Mas eu não quero ele mais aqui dentro. Vá lá e diga ao cara que a família não apoia Reginho’. E completou: ‘Isso aqui é a minha vida. Nada é mais importante que meu salão, só minha mãe’. O que me dói é que eu não consegui achar o cara a tempo”, lamenta Neivaldo, aos prantos.

Criador do bloco junino e carnavalesco Jakê, do qual Valdir participava e patrocinava no Engenho Velho de Brotas, Neivaldo diz que o traficante matou Valdir apenas imaginando que ele acobertava o irmão. “O cara imaginou uma coisa e matou Valdir. Como é que pode? Causou uma enorme perda para toda a comunidade. Desempregou muita gente”. 

Provocações do irmão Clayton Santos da Silva, 35, o Paulista, amigo e discípulo de Valdir, tem outra revelação. Ele diz que, após o atentado a Reginaldo, mensagens pelo Whatsapp enviadas pelo próprio Reginho à mulher de Edgar, em nome de Valdir, provocaram a ira contra o cabeleireiro. 

“A todo momento Valdir pediu que o irmão dissesse quem era o cara para resolver a situação. E ele nunca falou. Ao contrário. Ficou mandando mensagens para a mulher do cara (Chocolate) dizendo que Valdir ia correr atrás e que aquilo não ia ficar assim. Nunca que Valdir ia fazer isso”, diz Paulista.

André Batista dos Santos, 42, outro herdeiro da arte de Valdir, chegou a uma triste conclusão: o amigo morreu “de graça”.

A vida pelo salão  Apesar de Reginaldo ter sido o pivô da morte, as irmãs de Valdir dizem que perdoam o outro irmão. “Não vamos julgá-lo. Nós o perdoamos. Somos pessoas do bem”, diz Aldízia Macário. André afirma que Valdir sempre disse que daria a vida pelo salão dele. Mas, no final das contas, deu a vida pelas irmãs. 

“Quem entendeu o vídeo que estava aí circulando sabe que ele guardou todas as pessoas que estavam na hora. Todo mundo correu e ele ficou. Ele protegeu todo mundo e ficou desprotegido. Ele conhecia o salão dele mais do que todo mundo. Poderia ter se escondido”, conta André.“Valdir foi assassinado por engano ou uma conversa deturpada. Morreu de graça. Foi brutal. Eu acredito que a própria pessoa que fez isso com Valdir não está bem”, conclui o amigo.Irmão ‘sumido’ Reginaldo Macário, irmão de Valdir que teria se envolvido com a companheira do traficante Edgar da Silva Santos, não quer aparecer. Segundo as próprias irmãs, ele saiu de Salvador e está em um local seguro. “Tá sumido. Tá com medo de dar as caras. A coisa é muito séria”, afirma Paulo Cezar dos Santos Silva, o Paulo Taró, amigo de Valdir. “O cara é chefe do tráfico. Ele não vai ficar por aqui dando bobeira”, diz Neivaldo de Oliveira Sales, outro amigo de Valdir.