Memes: brincadeira tem que ser levada a sério no Enem

Segundo professores, conteúdo que exige interpretação textual do candidato pode ser cobrado na prova

Já pensou abrir o caderno de provas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e dar de cara com a foto da Nazaré Tedesco, vilã da novela Senhora do Destino? A possibilidade existe e não se espante se entre as 180 questões da prova deste ano estiver um meme. Afinal, além de populares na internet, eles são um elemento intertextual, ou seja, misturam linguagem verbal e não verbal, assim como as charges e os quadrinhos, gêneros mais comuns de aparecerem nas provas.

E se isso acontecer, nada de levar o conteúdo na brincadeira, até porque eles são tão importantes quanto os outros gêneros. "Quando pegamos uma imagem e conectamos ela com um texto, utilizando a ironia, por exemplo, ela pode ser considerada uma intertextualidade. E é isso que o exame exige do aluno, essa capacidade de interpretação", pontua Leonardo Mendes, professor de redação do Colégio Villa.

E nessa reta final, faltando pouco mais de dois meses para a aplicação das provas, os memes são, inclusive, uma boa ferramenta para trabalhar a capacidade de interpretação do estudante, e isso pode render uma boa vantagem em relação a outros candidatos."O Enem faz um passeio sobre esse cardápio de conteúdo e a melhor forma do estudante se preparar é tendo acesso a maior quantidade possível desse tipo de linguagem. As redes sociais são um cenário onde essa linguagem aparece e os estudantes podem beber dessa fonte", explica Mendes. Para o professor, as charges e os quadrinhos continuam sendo os gêneros mais prováveis de serem utilizados nas questões. Mas, a possibilidade do meme aparecer não pode ser descartada.

"Essa é a cara do exame, sempre com propostas mais ousadas, conectando o conteúdo com a realidade dos estudantes, contrapondo com um modelo de ensino vigente, aquele visto, muitas vezes, em sala de aula. Essa é uma tentativa da prova de dar sentido a esse conhecimento palpável", completa o professor. Ironia é uma das figuras de linguagem trabalhada no meme com o escritor Machado de Assis, morto em 1908 (Foto: Reprodução) Preparação A estudante Gabriella Santana, 17 anos, do terceiro ano do ensino médio do Centro Educacional Vitória Régia, vem se preparando para as questões que exigem, sobretudo, interpretação textual.

A jovem, que pretende cursar Engenharia de Produção, tem mais afinidade com os números e se esforça para não fazer feio na área da linguagem. "Sempre me preocupo em ler muitos jornais e revistas. Já na internet, procuro estudar conteúdos que façam parte do nosso mundo jovem, porque percebo que as provas estão cobrando mais conteúdo do nosso dia a dia", explica.

As pinturas, gráficos, fotografias e poemas também são outros elementos que costumam aparecer no Enem, na maioria das vezes, acompanhados de algum texto exigindo do candidato a capacidade de relacioná-los. 

Intertextualidade Das 39 questões da área de Linguagens, Códigos e Suas Tecnologias do Enem do ano passado, 14 apresentavam intertextualidade. A questão 100, do caderno de cor cinza, do segundo dia de provas, por exemplo, abordava o contexto social do século XX.

Na questão, o estudante deveria analisar a pintura Três Estudos para um Auto-Retrato (1974), do pintor anglo-irlandês Francis Bacon, e associá-lo ao trecho do livro O Amante (1986), da escritora francesa Marguerite Duras. Tanto na pintura, quanto no trecho do romance, os personagens apresentavam rostos dilacerados, que remetem aos conflitos que assolaram o século passado.

Um outro gênero comum de aparecer nas provas é o publicitário, que, assim como os quadrinhos, é um texto híbrido, que mescla imagem e palavras. "As imagens sempre tendem a se comunicar com o texto escrito, e estamos, todos os dias, rodeados desses exemplos. Na prova, devemos ter a consciência que o texto sempre vai ter relação com o imagético", explica a professora de Português Carol Silveira. 

Repertório E quem acha que os livros são a única solução para os estudos está enganado. O Enem exige, cada vez mais, que o candidato tenha um repertório rico. E para endossar o seu conteúdo, vale ler um poema e até escutar uma música que, além de relaxar a tensão dos estudos, pode também cair em alguma questão. 

"Geralmente, as músicas que falam sobre problemas sociais são importantes também para a redação, porque o estudante pode utilizá-la como exemplo para ilustrar o texto. Mas, é importante saber que não basta ir apenas ao teatro, cinema e estar em contato com esse mundo das artes. É preciso relacionar o conteúdo com aquilo que a questão pede", pontua Silveira. 

Entenda a diferençaCartum - anedota gráfica em que se visualiza a presença da linguagem verbal associada à não verbal. As abordagens dizem respeito a situações relacionadas ao comportamento humano, não situadas no tempo, por isso são denominadas de atemporais e universais. Charge - satiriza situações específicas, situadas no tempo e no espaço, também mesclando as linguagens verbal e não verbal. Meme - termo grego que significa imitação. Bastante utilizado na internet para "viralizar" informações geralmente humorísticas através de vídeo, imagem e frases. Tirinhas - gênero textual humorístico e, às vezes, político, que combina frases curtas, geralmente de efeito ambíguo, com desenhos que ilustram e complementam o sentido da obra.