Mesmo em carreira solo, Carlinhos Brown sempre reuniu parceiros em projetos

Quarta reportagem da série que celebra os 40 anos de Brown e do Correio destaca herança e legado artístico do cantor

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  • Da Redação

Publicado em 17 de agosto de 2019 às 06:05

- Atualizado há um ano

Se tem uma coisa que Carlinhos Brown diz sem titubear é que em seus 40 anos de carreira sua busca foi sempre uma: “ser um transeunte, um transitador de movimentos”. É dessa base que parte o show inédito que ele apresenta na Pupileira na próxima quarta-feira (21), que também homenageia as quatro décadas de história do CORREIO. Por mais que seu nome encabece diversos projetos musicais e sociais, ele garante que nunca lhe interessou construir uma carreira mirando o sucesso. ”Eu criei a Timbalada não foi pra mim, mas para gerar novas lideranças. Eu poderia me ensimesmar, mas meu interesse nunca foi esse”, diz o músico, sobre um de seus projetos mais reconhecidos e que, em breve, vai ganhar um museu para chamar de seu. Carlinhos Brown à frente da Timbalada, uma de suas criações mais reconhecidas (Foto: Divulgação) A Timbalada foi um dos grupos nascidos na década de 90 dentro do movimento de vanguarda Vai Quem Vem, que funcionou como um laboratório de sons e criação de novos instrumentos deixando um legado de mais de 30 ritmos. “As células musicais da Timbalada são as mais usadas na educação musical hoje em boa parte do mundo”, garante Brown. Do Vai Quem Vem também saiu os Zárabes, grupo de aproximadamente 250 percussionistas que costumava participar da Lavagem do Bonfim e do 2 de Fevereiro fazendo uma homenagem à cultura muçulmana presente na formação étnica e cultural da África árabe, que também nos passou parte de sua herança.Compromisso Se a Timbalada até hoje é reconhecida pela pintura corporal, os Zárabes também carregavam trajes próprios, com suas túnicas multicoloridas e instrumentos percussivos diferenciados: castanholas marroquinas de ferro, pandeirões, guizos, clarins, darbukas, tamas, gongos tibetanos, gonguê, tambores de PVC - estes criados e confeccionados pelo próprio Carlinhos Brown – e xequerês.

Aliás, isso também foi algo que Brown sempre prezou ao longo de sua trajetória: o desenvolvimento de uma estética multicultural na música e no gestual. Atribui isso ao mestre Pintado do Bongô. “Meu pai é pintor e meu mestre é pintado, Pintado do Bongô. Com todo esse desejo estético da Timbalada, essa vertente [de pintor] teria que fluir e isso aconteceu através de uma performance gestual despretensiosa”, diz o artista, que ao rememorar o passado, faz questão de citar o nome de muitas pessoas que o acompanharam nas mais diferentes fases. “A gente está falando de história, e eu não posso esquecer dos outros. Eu não estou sozinho nisso, apenas faço parte”, explica. Ao lado dos amigos Marisa Monte e Arnaldo Antunes, no grupo Tribalistas que retomou às atividades em 2017 depois de 15 anos (Foto: Divulgação) Por isso, evita listar quais lembranças guarda com mais carinho. “Todo caminho que se passa deixa lembranças. Só que elas não podem ser apenas prazerosas, têm que estar no âmbito da gratidão, porque eu fui formado por essas pessoas e por esses ambientes”, acredita.  Foi assim com a banda feminina Clara da Lua, criada antes da percussiva Bolacha Maria, e responsável por levá-lo ao teatro pela primeira vez. Foi assim também com a Acordes Verdes, de Luiz Caldas (“que inclusive nós tínhamos medo porque a banda só tinha cão”) , e com a Mar Revolto,  banda com a qual subiu pela primeira vez em um trio elétrico (“sendo precursores do rock nacional, eles promoveram uma revolução instrumental no Carnaval”). Foi assim também com os Tribalistas, grupo formado ao lado de Arnaldo Antunes e Marisa Monte, e que depois de um hiato de quinze anos voltou a lançar um trabalho inédito. ”Tudo isso foi me amadurecendo, e me levando ao que mais me interessava”, avalia Brown. Brown participou da banda Acordes Verdes, de Luiz Caldas, no início da carreira (Foto: Arquivo CORREIO) E agora, quais os próximos passos? “Há muito a se fazer: eu herdei um bairro de criança, e herdei uma história.  Eu estou no lugar inquieto, e que continue sendo assim”, deseja. Banda feminina Clara da Lua foi primeira a levar Brown ao teatro (Foto: Reprodução/ Instagram) Confira mais trechos da conversa com Brown: "O que eu quero dizer para essa entrevista e para o primeiro jornal que acreditou em mim é que fomos resilientes e que o axé music hoje, mais que um movimento musical, é um movimento de comunicação" 

"A primeira coisa que eu criei foi o Vai Quem Vem, e foi o Vai Quem Vem queme ensinou a liderar. Eu queria mudar o bloco afro, e nessa tentativa eu avancei quase 50 anos na rítmica - o próprio Neguinho do Samba falava isso. Então hoje, quando eu ouço trap, eu ouço o Vai Quem Vem e o que fazíamos naquela época". "O Vai Quem Vem era um desejo de criar um novo conceito de bloco afro, que agora sim eu estou retomando, porque eu não tinha canto, eu não tinha ritmo para aquilo antes"

"Quando eu vejo o Baianasystem hoje, eu digo: 'Meu Deus, isso também era um sonho, de que nós chegassemos a esse tempo'. A renovação vem sempre dos curiosos".

"Fui pro Bonfim com o Vai que Vem, dormi e acordei com a Timbalada. Pensei: 'amanhã eu vou fazer a Timbalada'. Meu interesse com a Timbalada era recuperar o timbal e que todos os músicos da percussão tivessem um lugar para se encontrar. Chamei todo mundo pra ser dono da Timbalada. Criei e convidei. Já tinha criado Vai Quem Vem, e tirei aquela célula"

"Eu não faço single, eu faço música, eu faço conceito. Pretendo lançar 40 músicas, não sei em que formato ainda, talvez faça um LP também, como se fosse um doutorado na Universidade. Está no meu desejo também reunir o Acordes Verdes, mas talvez não seja nem esse ano"

*Colaborou Laura Fernandes

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