Mortes de 12 homens no Cabula foram execuções, confirma MP; policiais serão denunciados

O resultado foi antecipado pelo CORREIO, no dia 2 de abril, com a publicação de informações exclusivas sobre os laudos cadavéricos que traziam, pelo menos, cinco indícios de execução

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  • Bruno Wendel

Publicado em 12 de maio de 2015 às 07:26

- Atualizado há um ano

Foto: Evandro VeigaO Ministério Público Estadual (MPE) concluiu, em investigação própria, que houve execuções na operação policial que resultou em 12 mortes, ocorrida no dia 6 de fevereiro, na comunidade de Vila Moisés, no Cabula. A apuração, concluída na sexta-feira, foi baseada em depoimentos e laudos periciais. O resultado foi antecipado pelo CORREIO, no dia 2 de abril, com a publicação de informações exclusivas sobre os laudos cadavéricos que traziam, pelo menos, cinco indícios de execução na operação contra suspeitos de fazerem parte de uma quadrilha de assalto a bancos e terminais de autoatendimento. DenúnciaSegundo o representante do MPE, promotor David Gallo Barouh, no entendimento do órgão, todos os policiais militares envolvidos serão responsabilizados. “Houve um crime e todos serão denunciados”, declarou o promotor, ontem. Sobre a quantidade de policiais acusados, Gallo preferiu não precisar. “Entre cinco e dez policiais (serão denunciados)”, informou. A operação foi realizada por guarnições da Rondas Especiais (Rondesp), após receberem uma denúncia de que um grupo de criminosos se organizava para realizar um ataque a um caixa eletrônico na região. A conclusão do Ministério Público Estadual contraria a versão de que houve um auto de resistência, assim divulgada pela Secretaria da Segurança Pública (SSP-BA). No entanto, a promotoria diz que ainda não pode dizer se os réus serão acusados de cometer homicídio qualificado. “As qualificadoras dependem do entendimento dos seis promotores”, declarou Gallo, que lidera uma comissão que apura o caso, numa investigação independente do inquérito policial e militar também instaurados pelo Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) e a Corregedoria da Polícia Militar. “O Ministério Público não depende do inquérito policial ou militar para adotar medidas. A lei nos dá autonomia para apurar e denunciar”, explicou o representante do Ministério Público. Ainda de acordo com Davi Gallo, esta semana os seis promotores que atuam no caso farão um relatório para ser entregue ao procurador-geral na próximo segunda-feira (18) que dará seu parecer, para, finalmente, o documento ser enviado à Justiça.ReaçõesAo saber do resultado da apuração do MPE, um dos parentes dos 12 mortos comemorou. “Essa é uma boa notícia. Justiça é para ser feita, mas isso já é alguma coisa. É uma esperança. Peço a Deus que os culpados paguem”, declarou a tia de um dos jovens mortos, que teve o nome preservado, por segurança.As mortes foram discutidas ontem durante CPI da Violência contra Jovens Negros e Pobres realizada na Assembleia Legislativa da Bahia. Deputados federais e representantes da sociedade civil debateram ainda violência policial nos casos da morte de Geovane Mascarenhas (sequestrado, torturado e morto por PMs) e do menino Joel, vítima de bala perdida numa ação policial em 2012 no Nordeste de Amaralina.Cautela Através de sua assessoria, o governador Rui Costa comentou o resultado da investigação do MPE. Em nota, disse que, por iniciativa dele, o Ministério Público foi convidado a participar da apuração, como acontece em todos os casos envolvendo policiais, mas que ainda não recebeu relatório ou qualquer documento que confirme a acusação de homicídio. Ele lembrou que algumas etapas importantes da investigação ainda serão realizadas. “Continuo com a postura de presunção da inocência das pessoas que estiverem atuando em defesa da sociedade. Nesse caso em particular, só me manifestarei após a conclusão de todas as apurações e quando for entregue à Justiça as versões que forem apuradas”, disse Rui. Na investigação em questão, ainda falta ser realizada a reconstituição. “Defendo uma Polícia cidadã, que aja com a energia e a força necessárias, mas dentro da lei. Não vou tolerar ação ilegal, que não condiz com essa instituição de 190 anos que é a Polícia Militar da Bahia”, continuou o governador. Também por meio de nota, a SSP-BA afirmou que “somente irá se manifestar oficialmente sobre o episódio do Cabula quando o inquérito for concluído”. Ainda de acordo com a nota, a secretaria aguarda a reconstituição, que deverá acontecer ainda esta semana.Já assessoria da Polícia Civil informou que o inquérito policial provavelmente será concluído no dia 28 deste mês, último prazo determinado pela Justiça, pois, além da reconstituição, nesse período serão realizadas novas oitivas e perícias. CORREIO enviou perguntas à assessoria da Polícia Militar sobre a ação que o Ministério Público Estadual deve mover contra os agentes da Rondesp envolvidos na operação na Vila Moisés, mas, até o fechamento da edição, as respostas não foram enviadas.INFORMAÇÕES NOS LAUDOS CORREIO antecipou resultado de laudos cadavéricos em abrilNa edição do dia 2 de abril, o CORREIO divulgou informações dos laudos cadavéricos realizados pelo DPT nos 12 corpos baleados na operação da Rondesp, no Cabula, que traziam indícios de execução. As informações foram obtidas com exclusividade, a menos de uma semana de o caso completar dois meses.

De acordo com as análises, parte dos disparos foi realizada de cima para baixo. Além disso, alguns mortos apresentavam perfurações na palma da mão, braços e antebraços, sendo que apenas quatro baleados tinham vestígios de pólvora nas mãos. Os laudos também apontam que a maioria apresentava pelo menos cinco marcas de tiros – alguns deles disparados a curta distância, de menos de 1,5 metro.

Em um dos casos, as perfurações no suspeito indicam que o projétil entrou na base da cabeça e saiu pelo queixo. Além disso, em alguns casos, foram identificados tiros que atravessaram, simultaneamente, antebraços e braços e um dos baleados levou um tiro na palma da mão. Consultada à época, uma fonte ligada à investigação do caso afirmou que disparos desse tipo indicam que as vítimas foram mortas em posição de defesa e afirmou que havia “sinais evidentes de execução”.

Procurado pelo CORREIO, um perito baiano, que pediu anonimato, também viu indícios de execução. Sobre os disparos de cima para baixo, afirmou que “isso indica que a pessoa morta está numa região mais baixa do que quem atirou”. “Isso subentende que a pessoa baleada estava deitada, agachada ou ajoelhada”, complementou.

Em relação aos corpos com marcas de perfurações no antebraço e braço, o especialista deduziu que a pessoa deve ter sido “pega de surpresa e que, por isso, elevou o braço”. O presidente  do Sindicato dos Peritos Criminais de São Paulo, Eduardo Becker Tagliarini, no entanto, ponderou que os indícios, por si só, não atestam que houve execução.

“Sem informações da topografia, posição dos atores, armamento utilizado, vestígios, sede e orientação das lesões e dos danos no local, não temos elementos suficientes que permitam propor uma hipótese para o ocorrido”, disse.[[saiba_mais]]