Motoristas temem aumento de pelo menos 20% com placas do Mercosul

Mudança é obrigatória para todos os veículos a partir de 1º de dezembro na Bahia

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  • Da Redação

Publicado em 6 de novembro de 2018 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Evandro Veiga/CORREIO

Emplacadores e despachantes ainda têm dúvidas sobre a nova placa (Foto: Evandro Veiga/CORREIO) Sempre que chega à loja de emplacamentos onde trabalha há 35 anos, na Avenida Antônio Carlos Magalhães, Edson Lima, 55, checa o portal do Departamento Estadual de Trânsito da Bahia (Detran). Nunca encontra o que busca: informações sobre quais serão os custos adicionais com a nova placa Mercosul, obrigatória para todos os veículos do estado a partir do dia 1º de dezembro. “Hoje mesmo olhei e não achei nada”, diz o proprietário do negócio, ao apontar a página aberta do site no computador. Os comerciantes, despachantes e estampadores de placas acreditam num acréscimo de, pelo menos, R$ 40 no preço final do produto.

A troca será obrigatória, primeiramente, para veículos novos e em caso de troca de domicílio de registro. O Rio de Janeiro, primeiro estado a adotar o novo modelo, enfrenta problemas, como impossibilidade de usar aplicativos de estacionamento com a nova placa e impedimento de que esses carros sejam multados por órgãos de trânsito.

Enquanto isso, na Bahia, a dúvida começa pelo básico: como fazer. O que se sabe é que algumas características diferenciam a nova da placa atual, cujo preço médio é de R$ 215: a cor mudará de cinza para branco e azul, haverá quatro letras e três números, e um QR CODE e uma marca d’água serão usadas para dificultar falsificação. Não que seja contra às mudanças, muito pelo contrário. Na verdade, Edson, acompanhado por outros comerciantes, reclamam apenas da ausência de informações. “A gente até entrou em contato com o Sindicato dos Despachantes, mas até agora não sabemos como isso vai acontecer mesmo. Eu até acho que isso vai aumentar o fluxo de clientes, porque muita gente vai precisar mudar a placa. A questão é só recebermos mais informações mesmo”.Num escritório próximo ao de Edson, Firmino Jesus, 62, atende um cliente enquanto comenta a mudança prevista para o próximo mês. “Que o cliente vai ter mais custo, isso é claro. Até porque é uma placa mais detalhada, né?”, comentou sobre um possível aumento de preço. O técnico industrial Fernando Alberto, 61, o atendido da vez, seguiu o despachante, profissional que intermedeia o contato entre o motorista e o Detran. A placa de sua carreta foi roubada, neste domingo (4), e ele precisou solicitar um novo emplacamento.                                                                 O técnico Fernando Alberto sobre troca de placa: 'Deveria ser o mesmo preço' Se fosse em dezembro, acredita, o custo seria ainda maior do que os mais de R$ 200 planejados na troca. “Eu acho o seguinte: deveria ser o mesmo preço. Quer dizer, olhe as condições dos moradores, as pessoas não conseguem arcar com um aumento”.O Detran, no entanto, contra-argumenta a tese da elevação de preços. “Toda mudança gera desconforto. Desde que estou aqui, há um ano e dois meses, falava-se em placa Mercosul e ninguém acreditava”, afirmou o coordenador do setor de placas do Detran, Matheus Braga. Ele diz, inclusive, que o órgão não pode interferir nos preços praticados, somente os próprios fabricantes. "Porém, estima-se que seja o mesmo praticado atualmente”, frisa. 

Não há média de quantos veículos trocarão as placas. Afinal, depende da quantidade de carros comprados no período e do fluxo de veículos entre cidades. O Detran calculou, a pedido do CORREIO, uma estimativa de 30 mil serviços de emplacamento mensais na Bahia. Inicialmente, no entanto, a intenção do órgão de trânsito era de que todos os veículos fossem emplacados até o final do dia 31 de dezembro de 2023. “Porém, esse prazo foi revogado, ficando facultativo aos veículos que não necessitem fazer nenhum dos serviços citados na obrigatoriedade”, falou o coordenador.O despachante Neilton Novaes, 55, acredita que, do contrário, “seria um caos”. “Se obrigasse tudo de vez não ia dar de jeito nenhum”, diz. Ele acrescenta críticas às informações de como funcionará a troca: “Tudo que a gente sabe é por notícia, por vocês (imprensa). Só sei que a gente, que presta esse serviço, não sabe como será”, completa.

"Nem sabia" “Nem sabia disso”, responde a engenheira Valquíria Sena, 31, ao ser perguntada sobre a previsão para a mudança de placas. Nesta segunda (5), ela foi à sede do Detran para uma vistoria do carro, cuja placa precisou ser transferida de Jequié, no Sudoeste da Bahia, para Salvador. Caso precisasse trocar o emplacamento em dezembro já precisaria se adequar às novas regras, completamente desconhecidas por ela.

Nem mesmo a troca de placas já em vigor no Rio de Janeiro deste setembro é conhecida pela engenheira. Lá, onde a procura ainda é voluntária, tem sido praticado o mesmo valor de fabricação do modelo antigo: R$ 219,35. “Acho que não foi muito divulgado, eu nem sabia”, comenta ela, depois de garantir com um funcionário do Detran de que não precisaria retornar ao pátio para trocar, novamente, a placa. 

A partir da data prevista para a obrigatoriedade do emplacamento com os moldes Mercosul, as vistorias também serão modificadas. “Na vistoria que acontece nos casos de troca de propriedade ou alteração de características, é obrigatória a presença do proprietário ou representante por ele designado. Quanto aos documentos, são referentes à identificação de propriedade do veículo, sendo assim, quanto aos procedimentos, estes serão iguais aos atuais”, explica Matheus Braga. 

No caso do comerciante Admilson Correio, 39, igual desconhecimento. Mudança para o Mercosul? “Não sei de nada”. O desafio dos motoristas é tentar, também, encontrar algum benefício possibilitado pela mudança.“Eu não sei nem qual é o benefício disso ainda. Vou precisar dar uma estudada”, brinca ele. Em seguida, ele conclui: “Acho que vai ser que nem o kit primeiro socorros [obrigatório em 1998]? Lembra?".Mais segurança Dos países integrantes do Mercosul, o Brasil é o terceiro a adotar a placa – o primeiro foi o Uruguai, em 2015, e o segundo a Argentina, em 2016. No território nacional, todos os estados devem implantar o novo modelo até o dia 1º de dezembro deste ano. A mudança proporcionará maior controle das rotinas de produção e personalização das placas. E o principal, para os motoristas: dificuldade para falsificação e clonagem. 

É justamente o que espera o gerente de transportes Maurino Souza, 55: mais segurança. Desde os 13 anos, trabalha com transporte de carga. Da experiência com veículos, surgiram alguns problemas. Em 2016, o mais grave deles: a placa do carro de Maurino foi clonada e, em casa, ele recebeu pelo menos 16 multas por infrações que não cometeu.“Tudo que vem para melhorar a segurança é válido. E eu acredito que isso vai melhorar a segurança, porque dificulta a alteração de placas [por conta de mudanças como a marca d’água e o QR Code”.Nem mesmo um provável acréscimo dos custos com os 46 veículos da frota onde é gerente o faz mudar de ideia. “A empresa está sempre comprando carros novos, custo a gente sabe que vai ter. Mas se é por uma boa causa, por que não? A gente até sabe que essa meninada do mal [criminosos] inventa é coisa, mas é torcer para dar certo”. A torcida geral é que resposta para a ponderação de Maurino seja positiva. 

As novas placas são adotadas por outros países do Mercosul visando padronizar a identificação de veículos de membros do bloco — assim como acontece na União Europeia. 

Além disso, o novo padrão oferece maior possibilidade de combinações, devido à sua sequência de identificação. Atualmente, as placas no Brasil seguem padrão de três letras e quatro números (AAA-1111), mas com o novo formato o padrão será de quatro letras e três números (AAA1A11). Números e letras não seguirão um padrão fixo, com exceção do último caractere que deverá ser obrigatoriamente um número para não prejudicar os esquemas de rodízio municipal.

Um dos argumento da unificação das placas entre os países do Mercosul é facilitar a fiscalização nas fronteiras. Com um sistema unificado, será possível o intercâmbio de informações entre os países e a unificação do sistema de consultas das placas. O repasse e a consulta de multas aplicadas fora do país de origem do veículo também será facilitado.

No Brasil, além das marcas d’água com o nome do país e do Mercosul, as placas terão um QR code que conterá a identificação do fabricante da placa, a data de fabricação e seu número serial. O objetivo é dificultar falsificações.

Outra exclusividade é o chip que será instalado em cada placa. Ele é compatível com o Sistema Nacional de Identificação Automática de Veículos (Siniav) e funcionará como um sistema de cobrança automática em pedágios. Ao passar por antenas instaladas nas vias, informações sobre chassis, ano, modelo e placa serão transmitidas para os órgãos de trânsito. O chip também substituirá o lacre das atuais placas.

O que muda? - Placa com QR Code e marca d’água;

- Placa com fundo branco e faixa azul, no lugar da placa cinza existente hoje;

- O novo modelo possui quatro letras e três números – o atual tem três letras e quatro números.

- A placa ainda possui o distintivo BR e, no lado direito, a bandeira do país, seguida pela bandeira do estado e pelo brasão da cidade.

- A categoria dos veículos será indicada pela cor da combinação alfanumérica: particular (preta), comercial/aprendizagem (vermelha), oficial (azul), especial (verde), diplomático (amarela) e colecionador (prateada). 

- O tamanho continua o mesmo com 40 cm de largura e 13 de altura.

- A tarjeta passa a ser representada pelo brasão do município e não mais pelo nome da cidade de forma escrita.

* Sob supervisão do chefe de reportagem Jorge Gauthier