Mulheres com câncer de mama transformam doença em injeção de autoestima

Confira seis projetos que apoiam pacientes com câncer de mama em Salvador

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  • Naiana Ribeiro

Publicado em 22 de outubro de 2018 às 06:31

- Atualizado há um ano

. Crédito: Geo Nunes/Divulgação

Olhar no espelho e reconhecer a própria imagem representou um processo de reinvenção não apenas na autoestima da publicitária Carolina Magalhães, 31 anos, como também na sua identidade. Aos 29, ela descobriu um câncer de mama e passou por uma dura batalha: enfrentou a quimioterapia, a cirurgia e a radioterapia, procedimentos que interferem no corpo e nas emoções de pacientes oncológicos.

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Além de náuseas, vômitos, fadiga, disfunção cognitiva, ganho de peso, palidez, menopausa induzida, redução do desejo sexual, entre outras possíveis consequências do tratamento, quem é diagnosticado com a doença precisa lidar também com a possibilidade de perder a mama e o cabelo, símbolos de feminilidade. Apesar de doloroso, esse processo é sinônimo de ressignificação da vida e suas prioridades para muitas mulheres.

Foi assim com Carolina, que perdeu cabelo, sobrancelhas e cílios durante o tratamento. “Passamos por momentos em nossas vidas que são, sem dúvidas, para nos fortalecer de alguma forma. A doença me trouxe o desapego. Fiquei preocupada quando descobri que teria que tirar a mama, justamente porque a sociedade diz e a gente vai cultuando padrões. Tive que me assumir e me gostar, sem me preocupar com  as outras pessoas”, afirma a publicitária, que viu beleza na careca após descobrir a liberdade e se reinventar com o cabelo curto.  Hoje, Carolina não quer mais deixar as madeixas crescer (Foto: Geo Nunes/Divulgação) O primeiro passo para ressignificar o câncer de mama é entender e questionar os padrões de beleza determinados pela sociedade, afirma a especialista em Psicologia Clínica Erika Scandalo.“Tudo o que aprendemos sobre nós está relacionado a nossa imagem. A cultura de cabelos longos, seios protuberantes, corpo magro, torna a vida das mulheres uma  batalha. Quando seu amor próprio não for ditado por regras sociais, você se sentirá menos impactada pelos efeitos do tratamento”, considera. A psicóloga ressalta ainda a importância de uma rede de apoio que ajude os pacientes oncológicos a se sentir bem consigo mesmos, “sem pensar no que os outros vão pensar se você preferir cortar o cabelo quando eles começarem a cair, ou se optar por usar lenços em vez de perucas”: “Tudo o que fizer deve ser para se sentir feliz consigo mesma. Lembre-se que é uma fase e que seu cabelo, por exemplo, crescerá”.  Processo de desconstrução levou Carolina a praticar o desapego (Foto: Alex Dantas/Divulgação) Além de desconstruir os padrões, o processo vivido por Carolina a levou a pesquisar mais sobre a doença e ao desapego. “Foi bem difícil, mas quando entendi que era algo  momentâneo, vi que ia passar. Fiz a reconstrução da mama e o  cabelo cresceu num tapa. Foi um trabalho diário de autoestima, mas  mantive o pensamento positivo, porque a gente atrai o que emana”, acredita Carolina.

Muitos nem sabiam que ela tinha câncer. Isso, inclusive, deu nome ao  seu livro, Nem Parece Que Você Tem Câncer, sobre sua trajetória com a doença: “Decidi lutar e continuei sorrindo. Não deixei de fazer nada. Me olhava e dizia: sou muito mais do que isso”. Livro Mas Nem Parece que Você tem CâncerPreço: R$ 29,90 (Foto: Alex Dantas/Divulgação) A doença também mudou a vida da ortodontista Patricia França Gomes, 55, que encontrou a sua missão após o tratamento. “Aproveitei algo que já tinha e criei o Projeto Repartir. Desde então,  fizemos muito para conscientizar a população, incluindo exposições para alertar sobre a importância da mamografia e do diagnóstico precoce”, explica. Assista a um flashmob realizado pelo projeto em parceria com o Studio A, no Shopping da Bahia, em Salvador.

Algumas fotos do projeto, inclusive, estão em cartaz no Mercado do Rio Vermelho até esta terça-feira (23), em mostra em parceria com a clínica Amo: “A fotografia ajuda a elevar a autoestima das pacientes e humaniza a doença”. Patricia é presidente do Projeto Repartir e participou da Exposição Toque de Vida (Foto: Divulgação) E foi focando nessa humanização que a publicitária Paula Dultra, 38, decidiu criar o blog Mão na Mama, para mostrar que é possível passar pela doença de forma leve. Isso aconteceu em 2011, quando  teve câncer de mama. “A doença mudou imensamente a minha percepção sobre a vida e sobre mim mesma. Você começa a repensar praticamente tudo e a dar valor a coisas que antes passavam simplesmente despercebidas”, afirma ela, que  foi acometida pelo câncer de ovário neste ano. Paula (meio) idealizou, junto com Carolina (direita) e Carla Oliveira (esquerda), o evento Papo de Câncer, que lotou o Teatro Eva Herz, em Salvador, na última quinta. Com objetivo de compartilhar vivências, a ação deve se repetir, mas ainda não tem data definida “A pessoa precisa ver que não está sozinha. O apoio da família e de amigos é essencial. Existem grupos de apoio, redes sociais, eventos, etc. Quando a gente se conecta com  pessoas que passaram pelo mesmo, fica menos doloroso”, destaca.

Nas duas vezes, Paula lançou mão de alternativas para se sentir bem e bonita sem pelos e cabelo. “Da primeira vez, fiz peruca e  amava lenço. Hoje saio sem nada ou uso faixas como acessório na cabeça. Adoro maquiagem e defendo que não é futilidade. Pode nos dar uma sensação de normalidade e ressaltar nossas belezas”, fala. Paula Dultra enfrentou o câncer duas vezes: em 2011 e em 2018 (Foto:Geo Nunes/Divulgação) Para ela, o importante mesmo é se sentir confortável: “Não deixe a doença te definir. Dá para passar por ela de uma forma quase normal: fiz faxina, cozinhei, pratiquei exercícios e  trabalhei. É só respeitar seu corpo com acompanhamento médico”.Segundo a psicóloga Erika, as indústrias de cosméticos, moda e acessórios têm desenvolvido cada vez mais produtos que ajudam nesse processo de resgate da autoestima de mulheres doentes. “Há batons, cílios postiços, lenços, perucas, maquiagem, chapéus, sutiãs com preenchimento ou espaço para alocação de próteses... Use o que quiser, lembrando sempre de consultar seu médico”, recomenda.

De acordo com Erika, não é raro pacientes com câncer se reinventarem e descobrirem que podem se amar e se cuidar mais depois do diagnóstico - seja na estética ou nos cuidados com alimentação, exercícios, etc.“O câncer pode ser uma oportunidade de grandes descobertas. A principal é que você é mais do que uma classificação. Ter ou não ter cabelo, com prótese mamária, cílios postiços, ou simplesmente não usar esses acessórios e mesmo assim se sentir bem. Você está lutando pela vida e não  só para sobreviver ao câncer, mas para ser feliz apesar dele”.Tatuagens ajudam pacientes a resgatar autoestima Apesar de representarem a superação de um momento doloroso, nem sempre as cicatrizes da mastectomia trazem sentimentos bons. Pensando nisso, algumas mulheres decidem cobri-las e ressignificá-las. Tem gente que prefere fazer desenhos realistas que reproduzam  mamilos reais e há quem prefira fazer outros desenhos. Em ambos os casos, não há contraindicações - basta esperar o término do tratamento. Flores, estrela e tribal: tatuagem ajuda mulheres a vencer o câncer de mama (Foto: Divulgação/ Tati Stramandinoli) Entre os procedimentos mais comuns estão a tatuagem tradicional e a paramédica (ou micropigmentação). O objetivo, na maior parte das vezes, é encarar o espelho com mais serenidade. “A reconstrução  da mama acaba sendo um processo difícil. Tocar no assunto ou remexer na área remete a todo sofrimento passado”, conta a fisioterapeuta Bruna Portugal, 29 anos, que é responsável pelo Projeto Florescer. Nele, ela  faz reconstrução do mamilo de pacientes oncológicos com uma técnica de tatuagem.

A especialista, inclusive, realiza o procedimento gratuitamente em parceria com o Salvador Norte Shopping na próxima quarta, a partir das 10h. Na ação A Arte de Fazer o Bem, Bruna utiliza a variação de sombras e cores para redesenhar o mamilo e a aréola do seio. Ação que faz alusão ao Outubro Rosa será realizada pelo Salvador Norte Shopping na quarta-feira (24) (Foto: Samuel Freitas/Divulgação) Dessa forma, ela contribui para o  resgate da autoestima de mulheres. “Realizar esse trabalho o ano inteiro é muito recompensador. Não tem dinheiro que pague”, afirma Bruna, que trabalha com pacientes oncológicos em Feira de Santana,  onde mora."Os relatos são meu pagamento. Devolvo não só o sorriso e a esperança como a autoestima", afirma a fisioterapeuta Bruna Portugal, que faz reconstrução do mamilo de pacientes oncológicos (Foto: Reprodução/Facebook Reviva) A profissional possui o curso de Estética Paramédica e Pigmentação, além da expertise nas áreas de estética e dermatofuncional, e conta que a vontade de auxiliar vítimas do câncer de mama cresceu quando perdeu  avô e duas tias por causa da doença. “O processo é muito duro. São dias de tensão horríveis. Quando começa o tratamento, muitos perdem a esperança. Adoece o psicológico. Como os seios também têm o papel de ‘sedução’, quando se perde um mamilo, isso mexe com a autoestima da mulher”, ressalta ela, que recebe inúmeros depoimentos de como seu trabalho é importante para as mulheres se sentirem melhor consigo mesmas: “O procedimento não dói e leva 40 minutos”.

Para saber mais sobre o procedimento, basta entrar em contato pelo telefone (75) 99129-5068. O atendimento é gratuito para pacientes oncológicos. Em outros casos, o tratamento custa de R$ 700 a R$ 1.000.

Projetos que apoiam pacientes com câncer de mama em SalvadorIvecan - Instituto Vencer o Câncer: Com sede no bairro do Monte Serrat (Rua Rio Negro, Avenida Boa Sorte, nº69), funciona das 9h às 16h e presta apoio aos diagnosticados com câncer de mama. Recebe palestras, bate-papos e outras atividades. Informações através da página no Facebook: fb.com/institutovencendoocancer. Grupo de Apoio à Mulher Mastectomizada (Gamma): O grupo de voluntários da Liga Bahiana Contra o Câncer atua desde 1985 junto às pacientes que tiveram câncer de mama assistidas no Hospital Aristides Maltez (HAM). Realiza ainda atividades como confecção de próteses, ações sócio-culturais como artesanato, biodança, coral,  teatro e yoga, entre outras. Também oferece tardes de beleza gratuitas às pacientes do Gamma. Infos: 3357-6800. NASPEC - Núcleo Assistencial para Pessoas com Câncer: Realiza ações e palestras sobre câncer de mama. Também ajuda com apoio de logística para recém-diagnosticados em Salvador. O órgão tem sede no fim da linha do Engenho Velho de Brotas (Rua Padre Luiz Figueira, 50). Mais informações pelo site www.naspec.org.br e pelo Instagram @naspecnucleo. Projeto Repartir: Trabalham na conscientização da população com ações específicas como exposições, flashmobs e entrega de lenços. Infos pelo Insta: @projetorepartir. Projeto Sakura: Idealizado por fisioterapeutas do Centro Estadual de Oncologia (Cican) e por pacientes que tiveram diagnóstico de câncer de mama, o grupo é uma rede de apoio para melhorar a autoestima  de quem passa ou passou pelo câncer. Tem encontros mensais. e realiza oficinas e  eventos   externos. Sábado (27) farão uma mesa redonda, às 9h, no Cican (Av. Vasco da Gama, s/nº). Infos pelo Insta @sakuraprojeto. Rede Por Você: Grupo de ex-pacientes e especialistas orienta e apoia mulheres jovens de até 40 anos com câncer de mama. Na sexta-feira (26), estarão no Shopping Vilas Boulevard, às 16h, com palestra sobre o universo. Também ajudam através dos telefones (71) 98884-2164, 98101-1794 e 99316-2671 e pelo Instagram @redeporvoce. TRÊS PRODUTOS CONFIÁVEISTiaras e faixas  -  A marca baiana  Com Amor, Dora (@comamordora) vende acessórios super estilosos na Loja Guapa, no Rio Vermelho. Itens custam a partir de R$ 22,90. Perucas -  A Salvador Hair, no Politeama, vende perucas sintéticas (a partir de R$ 130) e naturais (a partir de R$  500). Também faz itens personalizados por R$ 300. É só levar os fios de cabelo. Sutiã pós-mastectomia -  A Lojas Americanas vende a peça com suporte para prótese por R$ 77,95 nas cores preto e chocolate. A Fast Fashion Marisa também lançou coleção com o produto. (Foto: Divulgação) Campanha estimula publicação de histórias

Há dez anos, o Outubro Rosa chegava de maneira organizada ao Brasil, com ações em diversas cidades, pelos braços da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama). Com quase 60 mil novos pacientes surgindo anualmente, hoje  a entidade segue promovendo a importância do diagnóstico precoce e do tratamento adequado do câncer de mama.

Para este ano, o tema da campanha nacional estimula a formação de redes de apoio. Sob o mote #CompartilheSuaLuta, a ação visa mostrar que pacientes e familiares podem encontrar em ONGs e mesmo junto a outras pessoas que entendem o que o paciente está vivendo a ajuda e a informação úteis para enfrentar o câncer e as bases para fazer uma transformação no cenário da doença no país. “Ter acesso a dados referentes ao câncer de mama, sabendo de seus direitos e possibilidades, também é parte do combate à doença. Com pacientes amparados, ampliamos sua visão política e social acerca da doença - assim, cada indivíduo torna-se um potencial agente transformador da realidade brasileira  e pode contribuir com seu engajamento”, reforça a presidente da Femama, a Dra. Maira Caleffi (Foto: Divulgação) Como parte da campanha, a Federação  também  desenvolveu o MAMAtch, aplicativo (app) que promove a formação de uma rede de interesse e informação relacionada ao câncer de mama, conectando pacientes, familiares, ONGs, profissionais de saúde e pessoas envolvidas no enfrentamento da doença. Clique aqui para fazer download do app para iOS e aqui para baixar no aparelho Android. Em parceria com a Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama), a Mestiça criou o aplicativo 'MAMAtch