Ninguém esquece um filho perdido: uma análise sobre a série 'Pacto Brutal'

Gloria Perez expõe bastidores do assassinato de Daniella Perez em produção da HBO Max. Veja lista com outros filmes e seriados sobre crimes reais

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  • Doris Miranda

Publicado em 14 de agosto de 2022 às 11:00

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A dramaturga Gloria Perez é uma mulher extremamente corajosa. Não só perdeu a filha Daniella, assassinada aos 22 anos de forma covarde, como estabeleceu uma meta para continuar sobrevivendo: descobrir provas de que o  ator Guilherme de Pádua e sua esposa na época, Paula Thomaz, tinham sido os autores do crime que mobilizou o país naquele final de 1991 e início de 1992.

Para nós, a constatação da fibra dessa mulher pode ser vista agora, três décadas depois, na boa minissérie Pacto Brutal: O Assassinato de Daniella Perez, que se tornou uma das maiores audiências entre as produções originais da HBO Max desde sua estreia, há pouco menos de um mês.  

Dividido em cinco episódios,  o documentário dirigido por Tatiana Issa e Guto Barra narra o assassinato cometido pela dupla não só pela perspectiva da polícia e de testemunhas, mas também de Gloria Perez, que traz depoimentos muito sofridos de se ouvir. "Não tem como virar a página para a existência de um filho. Não consegui viver o luto porque tive que me manter atenta aos acontecimentos", destaca ela, a certa altura do programa.  

Não há, com muita razão de ser, depoimentos atuais dos criminosos. De acordo com os diretores, o trabalho não pretendia dar mais visibilidade a Guilherme e Paula, que tiveram a conduta espetacularizada pela mídia na ocasião. Em entrevista recente, a diretora Tatiana Issa explicou que uma das motivações para a obra foi justamente desmentir o que foi contado na época. Como Daniella e Guilherme eram uma espécie de casal na novela De Corpo e Alma, a imprensa na época especulou uma série de fatos que misturavam ficção e realidade. 

Veja o trailer de Pacto Brutal:

“As versões deles puderam ser ouvidas por todo mundo por 30 anos. E o lado de Daniella, da mãe, da família, não havia sido ouvido. A Gloria não pôde nem depor no julgamento. Então, a gente optou por mostrar esse lado”, explica Issa. “A série tem tido uma repercussão gigantesca, muito maior do que a gente esperava. Era importante que a história desse crime tão brutal e absurdo fosse relembrada por mais gente, fosse entendida da forma que ela de fato aconteceu. Em cima dos autos do processo, e não da forma que  foi contada por tantos anos”, completa a diretora 

É muito importante ver a luta de Gloria para validar assassinatos premeditados, como foi o caso de Daniella, na lei de crimes hediondos. Numa odisseia que reuniu mais de 1,3 milhão de assinaturas, ela levou o projeto ao Congresso Nacional e pressionou tanto que conseguiu resultado.  Como ela mesma afirma, não fez só pelo próprio interesse, mas pelo bem de todas as mães do país. 

Pacto Brutal vai trazendo à luz vários aspectos que ficaram nas sombras ao longo do processo (e para a população, que já não lembra), como a relevância do depoimento dos frentistas que testemunharam Guilherme de Pádua nocautear Daniella para levá-la ao local do crime. Ou o reconhecimento facial que um morador fez de Paula Thomaz no carro do marido, depois do assassinato. 

Claro que, costurando o factual de forma nem sempre ritmada, estão as falas emocionadas da família ou uma narrativa, digamos, mais enfática, o que soa um tanto apelativo. Mas, diante da brutalidade do caso, e do apreço do público por títulos que recriam crimes reais, dá para relevar na boa.  Se isso não for suficiente, tente se colocar no lugar de Gloria Perez, cuja filha foi esfaqueada 18 vezes. Ela deu ‘sorte’ de ter os protagonistas dessa história famosos e de, por isso, poder gritar muito alto por justiça. Pior é o caso das milhões de outras mães brasileiras cujos filhos são perdidos sem que seus nomes sequer sejam pronunciados.

Filmes e séries de true crime para conhecer 

A Escada (HBO Max)  Uma mulher caiu da escada de sua casa e morreu. Tudo não passaria de um infeliz acidente se o marido não tivesse estado envolvido numa morte similar 20 antes.  

Em Nome do Céu (Star+)  Inspirada em eventos reais, a partir da adaptação do livro homônimo de Jon Krakauer, conta  sobre um crime macabro que assombrou uma comunidade mórmon dos EUA nos anos 1980.  

BlackBird (Apple+)  Homem preso por tráfico de drogas  recebe a proposta do FBI de infiltrar-se numa prisão de segurança máxima e fazer amizade com um serial killer. 

Night Stalker:  Tortura e Terror (Netflix)  No verão de 1985, uma série de crimes aparentemente sem conexão assombram Los Angeles. Dois detetives, então, se unem em busca do assassino e estuprador. 

The Act (Globoplay) e Mamãe Morta e Querida (HBO Max)  Tanto a série quanto o documentário abordam o mesmo caso. O de mãe e filha que tinham uma relação exemplar. Tudo muda quando a garota descobre que suas doenças foram inventadas pela mãe e arma um plano para assassiná-la e fugir.  

Olhos Que Condenam (Netflix)  Em 1989, seis adolescentes não-brancos foram acusados e condenados injustamente de estuprar uma jovem, em Nova York. 

Elize Matsunaga: Era Uma vez Um Crime (Netflix)  Em 2012, Elize Matsunaga matou e esquartejou o marido, num crime que chocou o Brasil. Nove anos depois, ela quebra o silêncio.  

Em Nome de Deus (Globoplay)  Conhecido como João de Deus, o ex-líder espiritual João Teixeira de Faria foi denunciado em 2018 por abuso sexual de mais de 300 mulheres que haviam buscado seu auxílio.  

O Caso Evandro (Globoplay)  Documentário baseado nas pesquisas de Ivan Mizanzuk sobre o desaparecimento do menino Evandro Ramos Caetano, no interior do Paraná, em 1992.  

Lorena (Prime Video)  Em junho de 1993, uma mulher cortou o pênis do marido enquanto ele dormia. O documentário recria o caso, dando luz aos abusos sofridos por ela ao longo do casamento.