Nós dissemos love, love, love

Repararam que, ocupadas por mulheres, as ruas se tornaram seguras?

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  • Flavia Azevedo

Publicado em 30 de setembro de 2018 às 16:30

- Atualizado há um ano

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Primeira imagem é uma "comissão de frente" com mulheres usando pernas de pau. Seguravam uma faixa onde estava escrito "juntas somos gigantes". Atrás delas, um belíssimo grupo feminino de percussão. A voz (doce e forte) vinha de um pequeno trio elétrico e havia sorrisos por toda parte. Depois, o texto de Carlinha que falava sobre a manifestação em Salvador e era mais ou menos a mesma coisa de falar de amor.

Teve a passeata do Capão, o coro forte de Mossoró, as meninas que acordaram cedo e fizeram a parte delas no Recôncavo Baiano. Famosas desceram pro asfalto, anônimas filmaram e fotografaram porque, em tempos de fake news, é importante gerar provas (e memórias). A ladeira da Barra ficou pequenininha. Minha amiga Ronna disse que, lá no Rio, passaram de um milhão. Alice fez um cartaz pra Gui onde estava escrito "# elenão caca boudin" (algo como "linguiça de cocô") e foram para a rua, em Bruxelas. Foi um dia importante, imenso. E muito além da questão política.

Elza Soares disse outro dia que o mundo é difícil porque o feminino nunca ditou as regras. Eu concordo demais. E os motivos estavam todos nas ruas, ontem, no dia do #elenão. Vocês viram que não teve briga? Vocês viram que os homens que nos acompanhavam não foram abusados sexualmente nem importunados? Repararam que, ocupadas por mulheres, as ruas se tornaram seguras? Viram quantas crianças? Observou que o protesto acolheu a todos e todas que dele quiseram participar? Observaram que é possível mandar recados seríssimos com leveza e amor? Aliás, perceberam quantas vezes a palavra "amor" surgiu em nossas bocas?

Inclusive quando a palavra "amor" nem foi dita: milhares de mulheres se agacharam, na Cinelândia, durante o protesto, para que o filho de uma delas fosse encontrado, no meio da multidão. Uimael é o nome dele e elas não precisaram chamar a polícia. E foram milhões de exemplos como esse, infinitas situações que mostram o quanto fazemos as coisas de outro jeito e o quanto esse outro jeito pode ser a solução.

Quando você ler "a revolução é feminista" em algum meme por aí, é disso que estão falando. Num mundo envenenado pela pior faceta da energia masculina, onde pingam gotas de sangue nos programas de tevê, no qual nada parece seguro, tranquilo ou amoroso, a revolução é mesmo ocupar espaços com delicadeza, generosidade, diversidade e inclusão. Foi lindo, ontem. Será lindo sempre que mulheres derem o tom, o ritmo, a solução.