Novo protesto marca revolta pela morte de jovem barbeiro em São Félix, no Recôncavo

Moradores voltaram a fechar entrada de ponte histórica pedindo justiça para o caso do assassinato de Davi Oliveira, de 23 anos. 3º protesto está previsto nesta terça

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  • Hilza Cordeiro

Publicado em 7 de dezembro de 2020 às 18:25

- Atualizado há um ano

. Crédito: Fotos: Anastácia Flora Oliveira (@naudetacia)/Cortesia

A população de São Félix não descansou e amanheceu novamente em protesto, nesta segunda-feira (7), pela morte do jovem barbeiro Davi Pereira Santos de Oliveira, de 23 anos, assassinado a tiros pela polícia na madrugada de domingo (6), na cidade localizada na região do Recôncavo, na Bahia. Com cartazes pedindo justiça e esclarecimentos sobre o caso, os moradores voltaram a fechar a entrada da Ponte Dom Pedro II, histórica via que leva ao município de Cachoeira. 

A ponte foi interditada por volta das 11h30 e permaneceu fechada para passagem até às 13h, quando os veículos foram liberados para fazer a travessia. Pelo menos 200 pessoas estiveram presentes. No domingo mesmo, o pessoal demonstrou revolta queimando pneus e fechando dois acessos da cidade. Nos dois dias, militares acompanharam a movimentação.

Davi deixou esposa e um filhinho de um ano. O prefeito da cidade, Alex Aleluia (DEM), lamentou a morte do jovem e prometeu tomar providências. Um terceiro protesto, no mesmo local, está previsto para esta terça-feira (8). Davi Oliveira tinha 23 anos (Foto: Reprodução/Redes sociais) Como aconteceu no fim de semana, o fato foi registrado no plantão da Delegacia de Cruz das Almas e as circunstâncias da morte serão investigadas pela delegada Ana Neide dos Anjos, da unidade de Cachoeira, já que São Félix está sem titular.

Vereador do município, Silvino Conceição, mais conhecido como Dido, disse que a reação da população foi imediata porque o barbeiro era um jovem popular e muito esforçado. O estabelecimento principal de Davi funcionava ao lado do Mercado Municipal, no Beco do Fuxico, perto da prefeitura.“Era uma pessoa do bem, estava trabalhando para sobreviver, realizar seus sonhos. Nunca teve ato mal visto pela sociedade. Todos os dias estava na barbearia. Acho que foi uma falha muito grande de quem cometeu isso. Foi perverso e a gente não pode deixar assim. É inaceitável o que aconteceu”, manifestou-se.De acordo com informações da TV Bahia, a Polícia Militar informou que os policiais militares envolvidos no caso foram afastados das ruas e será instaurado um inquérito para analisar a ação deles. A conduta será avaliada pela corregedoria da corporação. Um posicionamento foi solicitado à PM por e-mail, mas não houve retorno até esta publicação.

Barbearias Três Irmãos

O CORREIO conversou no domingo com a irmã mais velha do jovem, Geisa Oliveira. Ela contou que Davi era o filho do meio, dono de dois estabelecimentos chamados Barbearias Três Irmãos. Ele aprendeu a profissão ainda criança, aos 11 anos, com o próprio pai, já falecido. “A cada ano, ele ia se aperfeiçoando. Ele fez cursos, se empenhou bastante, tem diploma. Ele deu um ponto pro nosso irmão trabalhar, não cobrava nada dele. O que eles ganhavam, era deles. Ele não tinha nada nas mãos, era humilde", lembra ela.

Para a família, a droga e a arma que a polícia disse ter encontrado entre as coisas de Davi foram implantadas. O dinheiro que ele havia ganhado trabalhando no sábado, dia de grande movimento na cidade, não foi entregue aos parentes. "Ele ganhava muito bem, comprou carro, comprou casa, comprou dois pontos de barbearia. Meu irmão era gente de bem", assegura ela. A família morou grande parte da vida no Bairro 135 e recentemente Davi tinha comprado um ponto da sogra no centro da cidade.

Ainda segundo o vereador Dido, há poucos meses Davi havia vendido um veículo modelo Palio antigo para poder comprar uma casa para a esposa, seu filho e sua mãe, que estavam no aluguel. O jovem estava prestes a se mudar para o imóvel novo."A esposa dele está desolada, ainda não acredita em nada disso. O filhinho dele de um ano, coitado, era apegado demais ao pai. Ele era extrovertido. Brincava com todos, era humilde. É muita revolta", completa a irmã. "Ele estava com um amigo de moto, o amigo correu e ele ficou e eles ainda mataram meu irmão. Não sei o que ganham tentando incriminar uma pessoa. Meu irmão nunca usou drogas, nunca chegou em casa atormentado por isso. Se tivesse, nós saberíamos", conclui.Em entrevista à TV Bahia, o amigo que estava com Davi no momento em que ele foi morto contou que ambos iam para casa quando ouviram um disparo. Ao olhar para trás, teriam visto que era a polícia. Atingido pelo tiro, Davi caiu da moto e a reação do amigo ao ver a cena foi correr. Por medo de represália, o rapaz que sobreviveu preferiu não aparecer e nem se identificar.

De acordo com a Polícia Militar, policiais da 27ª CIPM (Cruz das Almas) estavam realizando rondas no município quando teriam se deparado com dois indivíduos numa moto. Ao perceber a aproximação da viatura, a dupla teria efetuado disparos contra a guarnição, que revidou. A PM disse que, ao fim dos tiros, um homem foi encontrado caído no chão e levado para o Hospital de São Félix, onde foi constatado o óbito. 

Com ele, os militares disseram ter encontrado um revólver, dois tabletes de maconha, sete trouxinhas da mesma droga, 153 pinos vazios para acondicionar cocaína e a própria moto que usavam. 

Amiga do barbeiro, Ana Caroline dos Santos esteve presente nos dois dias de manifestação. Carol vivia passando na barbearia para "resenhar" com Davi. Segundo ela, o profissional sempre costumava sair tarde do estabelecimento. Ao fim daquele dia de trabalho no sábado, ele teria passado para tomar uma cerveja com amigos na praça, que se estendeu até a madrugada e em seguida foi para casa com o colega, quando teria sido atingido.

"O que eu vejo é que a gente não tem o direito de ir e vir. Saímos às 19h e não vê mais um pé de pessoa na rua porque estamos com medo da violência. Chegou num estado que a gente não tem nem medo de bandido mais, a gente tem medo da polícia. E gente sabe que vai acusar eles e não vai dar em nada. Em qualquer lugar que você procurar saber de Davi, todo mundo vai dizer que ele trabalhava para ter o dele", lamenta a amiga. 

CONFIRA NA ÍNTEGRA A NOTA DO PREFEITO:

"Meus amigos e minhas amigas de São Félix, 

Recebi com consternação a notícia da morte do jovem Davi. Ainda não sabemos ao certo o que aconteceu, mas por conhecer o histórico de um jovem trabalhador, tranquilo, querido por todos, nos entristece muito e causa indignação. Estou tomando as devidas providências para buscar entender o que houve, mas no momento meu sentimento é de pesar e de solidariedade a seus familiares, amigos e toda comunidade sanfelixta, que sofre com esse fato lamentável.

Me coloco à disposição da família do jovem Davi, para o que necessitar. Estamos juntos nesse momento de tristeza, dor e pela busca de justiça, para que esse caso seja investigado.

Alex Aleluia Prefeito de São Félix"