O arco-íris está na Boca do Rio: precisamos falar sobre a diversidade no Festival

Jorge Gauthier é editor do canal Me Salte, no jornal CORREIO

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Publicado em 31 de dezembro de 2017 às 14:56

- Atualizado há um ano

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No primeiro dia, Pabllo Vittar arrastou uma legião de fãs. As bees afeminadas deram close sem medo de ser feliz. No segundo dia, Claudia Leitte foi o principal imã cor de rosa para levar os LGBTQ+ para o Festival da Virada Salvador. Ontem – sem nenhuma atração dita LGBTQ+ – pensei que seriamos um pontinho colorido na multidão. Errei (ainda bem). Casais homoafetivos dançaram coladinhos ao som de Matheus e Kauã e gritaram quando Carlinhos Brown tocou o single A Namorada e ainda deu o recado: “Hoje temos Pabllo Vittar e outras expressões do amor. O casamento homoafetivo é uma realidade. Ninguém precisa ser gay para lutar contra a homofobia”.

Em festas populares, normalmente, nós LGBTQ+ ficamos acuados e temendo eventuais ataques. O que pude ver no Festival, até o momento,  é que – graças às grandes divas compondo a grade – tivemos orgulho de colocar a nossa cara na rua. Mas não é somente por esse motivo. Isso é reflexo do momento em que vivemos na sociedade e principalmente de coragem de quem não teme colocar um short curto, fazer uma make ou até mesmo ficar dançando de rostinho colado com o boy enquanto os heteros apenas observam. E Sebastian Dance, que divou no palco com a Vittar e virou assunto na cidade? As bees estão cada dia mais poderosas (amém!).

Obviamente que os gays (que foram maioria nos dias de festa) gostam de outras atrações, mas as divas acabam tendo maior chamariz e atenção. Teve muito gay lacrando ao som de Safadão, quebrando com o Harmonia do Samba e dançando coladinho ao som do mestre Gilberto Gil. Afinal, não existe barreiras quando o assunto é gosto musical.

E os heteros, como ficam? Bom…aí como diz o ditado são outros 500.

“Porra, fudeu vei! Agora é sucesso mesmo. Não tem mais jeito”, disse um cafuçu quando (pela milésima vez) a FitDance cantou K.O., single de Pabllo Vittar em um dos intervalos entre os shows. Esse falou num tom de resignação. Vi outros com a cara fechada, bico torcido quando passava algum casal homoafetivo de mãos dadas (e foram muuuuuuuuuuitos!!!!!! alô, alô Graças a Deus). Mas também vi gente como a vendedora ambulante Valéria Santos. “Ouxe, eu gosto mesmo é da viadagem. Vocês são mais de boas. Sem problema. Não vejo briga entre vocês”, brincou ela que tem dois filhos gays.

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As músicas ‘de gays’ já chegaram aos ouvidos heteros inclusive no acolhimento e apropriação de falas (isso aqui é assunto para outro post). Fiquei no chão quando vi casais heteros dançando Lacradora de Claudia Leitte ou até mesmo um cafuçu 4×4 ir até o chão na coreografia de Sua Cara (Pabllo Vittar, Major Lazer e Anitta). Rebolou mais do que Carla Perez nos tempos de Gera Samba.

Como nem tudo são flores vale aquela atenção, principalemnte, na hora de ir ao banheiro. A opressão machista e homofóbica não se deixa ofuscar. Vi muitas bees recebendo xurria de hetero por se vestir de saia. “Aqui é lugar de homem/Saia é coisa de mulher/Lugar de viado não é aqui”. Essas foram algumas das frases que presenciei. Nos momentos que vi, pelo menos, quem ouviu usou uma ótima estratégia de enfrentamento: EXISTIR. Sem brigar, mas deixando claro que aquele espaço é de todxs nós independente da orientação sexual. Inclusive, teve gente que aproveitou o ar condicionado para fazer o famoso banheirão! #pas

Uma amiga trans – que pediu que não citasse seu nome – contou que ficou surpresa com a reação das outras mulheres quando ela foi usar o banheiro nos dois dias que foi para o Festival. “Eu fico sempre com medo em locais assim cheios, mas me surpreendi positivamente quando precisei ir ao banheiro feminino. Fui bem acolhida. Sei que isso é um oásis numa vida de opressão, mas é sempre um passo de cada vez”.

Longe dos banheiros o que pude perceber é um enfrentamento pela presença. É sempre bom ver dois homens ou duas mulheres, por exemplo, se beijando em público sem ser agredido verbal ou fisicamente. A agressão do olhar de reprovação dos preconceituosos vai sempre existir esteja onde estivermos. Mas, a forma com que reagimos é o que faz a diferença. Ou seja, lacrando mais, beijando mais e vivendo mais.

E não paramos por aí. Afinal, hoje tem Ivete Sangalo, Marília Mendonça… E dia primeiro de janeiro tem a rainha de todas nós, Daniela Mercury, para arrastar ainda mais o arco-íris para a Boca do Rio e começarmos 2018 lacrando e mostrando que JUNTXS SOMOS MAIS FORTES. Que esse empoderamento ultrapasse as linhas do Festival e que esse arco-íris possa florescer ainda mais em outros cantos. #ACEITAOUSURTA