O jornal digital feito para explicar os fatos: conheça a experiência do Nexo

O exemplo do Nexo Jornal é um dos que será abordado no seminário O Futuro do Jornalismo, nesta sexta-feira (26)

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  • Thais Borges

Publicado em 23 de julho de 2019 às 05:30

- Atualizado há um ano

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No início, podia parecer uma idealização. Pensar em uma nova forma de fazer jornalismo, no começo de 2015, soava distante da realidade. Era um momento em que muita informação – talvez mais do que nunca – estava ao alcance das pessoas, mas, ao mesmo tempo, também um excesso de desinformação. Porém, o que era apenas uma ideia de três profissionais acabou se concretizando: meses depois, em novembro daquele ano, foi lançado o Nexo Jornal. 

Desde o início, a proposta dos co-fundadores do site – Paula Miraglia, Renata Rizzi e Conrado Corsalette – era de fazer o chamado jornalismo de explicação. Mais do que noticiar os fatos, essa especialização do jornalismo é bem literal: explica, interpreta e aprofunda o que é noticiado. “Fui editor na grande imprensa e sentia que, às vezes, a gente estava escrevendo coisas que eram mais voltadas para as fontes que a gente ouvia ou para o nosso concorrente. Parecia que o leitor não estava na conta”, explica Conrado Corsalette, editor-chefe do Nexo. Corsalette é um dos palestrantes do Seminário O Futuro do Jornalismo, que acontece nesta sexta-feira (26), das 8h às 12h30, no Hotel Quality, no Stiep. Promovido pelo CORREIO, o evento vai debater os próximos caminhos do jornalismo através da ciência de dados e das inteligências artificiais.

Além do Nexo, serão apresentadas iniciativas de outras duas organizações brasileiras – o Jota e a Operação Serenata de Amor – para, através da tecnologia, transformar a maneira como se faz jornalismo e controle social no Brasil. As inscrições são gratuitas e podem ser feitas pelo bit.ly/jornalismodefuturo.

Explicativo No caso do Nexo, uma das principais inspirações veio do Vox, um portal de notícias lançado em 2014, nos Estados Unidos, com a proposta do jornalismo de explicação. Lá, assim como na Europa, essa forma de noticiar os fatos de maneira mais clara e didática já era uma tendência. 

No jornal brasileiro, foram adotados, assim, três princípios: clareza, transparência e equilíbrio. Clareza, o primeiro deles, significa encontrar a melhor maneira de explicar um assunto para os leitores. 

A transparência, de acordo com o editor-chefe, é uma nova forma de lidar com leitor. Se, em muitos contextos, os leitores pareciam alguém com quem era impossível interagir, agora, a perspectiva deve ser outra. Não se deve apenas explicar, mas incorporar o que o leitor tem a dizer. 

É por isso que eles adotam estratégias como, por exemplo, ler tudo que é escrito nas redes sociais do Nexo. Se existe alguma tentativa de diálogo, ela deve ser respondida. Se há algum questionamento a uma reportagem, a equipe procura fazer uma rechecagem para ver se o questionamento tem sentido; depois, deve responder ao questionamento. “Depois que uma notícia está consolidada, a gente vai acrescentar camadas a esse fato. A gente ‘linka’ os materiais que a gente usa para que, ao final de cada conteúdo, o leitor possa fazer uma apuração reversa, com todas as fontes que a gente usou para chegar naquilo”, explica Corsalette.Por fim, o equilíbrio diz respeito à não ser militante de nenhum tema e buscar ouvir as mais diferentes vozes da sociedade. 

Por aqui, eles também tentaram trazer a informação com recursos digitais. Para Corsalette, é mais do que simplesmente poder contar uma história de várias formas. “Na verdade, a vida digital permite encontrar a melhor maneira de contar uma história. É por meio de um texto, de um vídeo, de uma visualização de dados?”, explica. 

Jornal digital O Nexo se define como um jornal digital. Por dia, são publicados 11 ou 12 conteúdos novos. E é por isso mesmo que, para Conrado, não dá para fugir dessa definição, ainda que seja um jornal digital. É preciso, acredita, atualizar o próprio conceito do que é um jornal. 

“A gente não é revista, não é um portal eletrônico. Somos diários, produzimos de 11 a 12 conteúdos inéditos por dia, lidamos com os temas mais variáveis possíveis e tentamos estar no centro do debate público”, diz. A diferença dessa produção é que, ao invés de 150 reportagens como numa cobertura em tempo real sobre a reforma da previdência, em um dia de votação, o Nexo terá uma única, mas com bastante conteúdo e desdobramentos. 

Só que, nesse contexto, desenvolveu suas próprias ferramentas de trabalho – inclusive o próprio paywall - uma barreira de pagamento em que, a partir de um determinado número de textos, somente assinantes têm acesso ao conteúdo.

Apesar de não divulgar números de audiência, nem de faturamento, o Nexo tem um modelo de negócios baseado, principalmente, na assinatura. Nos primeiros meses, até meados de 2016, não houve nenhum tipo de cobrança. O objetivo, com isso, era torná-lo conhecido. Depois, o paywall que permite a leitura de até cinco textos por mês foi implementado. 

Além disso, em abril, a empresa recebeu um aporte de cerca de US$ 1 milhão de uma iniciativa do Centro Internacional para Jornalistas (ICFJ) e da organização filantrópica internacional Luminate, através de um projeto para apoiar a sobrevivência de startups de jornalismo na América Latina. A Luminate é ligada ao grupo Omidyar, fundador de veículos como The Intercept.

Mesmo buscando outras fontes de financiamento, as assinaturas ainda são o foco do Nexo. Editor-chefe e co-fundador do Nexo, Conrado Corsalette trabalhou por 15 anos em jornais como Folha de S. Paulo e Estadão (Foto: Divulgação) “A gente é muito horizontalizado. O nosso foco é assinatura e a busca por assinatura, o que faz com que a gente possa abrir mão, a princípio, da publicidade. O site fica mais bonito, mais 'clean'. A experiência do usuário é muito importante e ausência da publicidade tira uma pressão da gente a respeito da busca pelo clique a qualquer coisa”, completa o editor-chefe. Formação Hoje, a redação conta 45 pessoas, incluindo a direção do jornal, o núcleo de redatores e repórteres especiais, que produzem os conteúdos; o núcleo audiovisual e de opinião; o núcleo de pesquisa e infografia e o grupo da tecnologia, que são os desenvolvedores e que têm uma forte conexão com a redação. 

A formação de cada um dos profissionais é diversa. Tem jornalistas, mas também tem historiador, antropólogo, advogado, cientista político, cientista de dados, desenvolvedores. A própria diretoria tem perfis diferentes: além de Corsalette, que é jornalista, há uma engenheira e uma cientista social. 

Todos podem sugerir as pautas, ainda que o roteiro de produção diário seja consolidado pelos jornalistas. E não há limites fixos sobre quem faz o quê. O editor de economia, de fato, escreve mais sobre economia. Mas se num dia ele quiser fazer um vídeo sobre táticas de futebol, isso será encaixado em sua rotina de produção diária. Dentro disso, porém, há uma grade: pelo menos três grandes infográficos por semana, dois vídeos no mesmo período e assim por diante. 

Muitas das pautas são fundamentadas no jornalismo de dados, daí a importância da presença do cientista de dados ali. Mesmo assim, o editor-chefe defende que todos os profissionais devem, minimamente, saber lidar com dados. 

Produtos Um dos principais produtos é a newsletter diária, chamada a_nexo. Todos os dias, os assinantes da newsletter recebem, por email, o principal que está acontecendo no dia, como na primeira página de um jornal. Existe uma curadoria com links para reportagens de outros veículos também, que vão do The New York Times à Folha de S. Paulo. 

Mas talvez o produto mais conhecido do Nexo seja a calculadora de salários. Publicada originalmente em 2016 e atualizada em 2018, a ferramenta permite que o leitor compare seu salário com os demais habitantes do estado onde mora e do Brasil. A calculadora também compara o salário com o de um deputado federal, de um juiz de primeira instância, de um médico e de um professor da educação básica. (Imagem: Reprodução) "Essa calculadora, que foi desenvolvida pelo pessoal de dados, é um hit do jornal. Tem uma seção 'em alta' e ela está em primeiro quase sempre", diz. A ferramenta é um dos exemplos de como, a depender da situação, um formato pode ser mais atraente ou surpreendente do que outro."Essa história contada em um texto seria tão atraente? Assim como temos várias histórias que seriam mais atraentes em um texto", reflete. Produtos assim costumam agradar os leitores do Nexo. Outra bem parecida é a que mostra se as pessoas conhecem a realidade da cidade onde moram. Na ferramenta, os leitores devem dizer o percentual que acreditam que sua cidade tem em diferentes aspectos de desenvolvimento humano, a exemplo de índice de casas com coleta de esgoto e de crianças que frequentam a escola.   (Imagem: Reprodução) “Lidar com a informação é muito desafiador porque os meios mudaram muito e isso vai mudar a cada momento. A gente tem que estar pronto para essas mudanças, principalmente com a base do jornalismo”, completou Corsalette. 

O projeto Correio 40 Anos tem oferecimento do Bradesco, patrocínio do Hapvida e Sotero Ambiental, apoio institucional Prefeitura de Salvador, e apoio de Vinci Airports, Senai, Salvador Shopping, Unijorge, Claro, Itaipava Arena Fonte Nova, Sebrae e Santa Casa da Bahia.

Seminário será realizado nesta sexta-feira (26); inscrições são gratuitas O seminário O Futuro do Jornalismo, que discutirá os novos rumos e perspectivas do setor, faz parte das ações comemorativas dos 40 anos do CORREIO. Promovido pelo jornal, o evento ocorre nesta sexta-feira (26),  8h às 12h30, no Hotel Quality (Rua Dr. José Peroba, 244 – Stiep). 

As inscrições, que são gratuitas, podem ser feitas pelo bit.ly/jornalismodefuturo. O evento contará com apresentação de representantes de três iniciativas inovadoras que se tornaram referência mundial pela maneira como combinam comunicação, design e tecnologia: o co-fundador e editor-chefe do Nexo, Conrado Corsalette; a diretora de produto do Jota, Paty Gomes, e o líder técnico da Operação Serenata de Amor, Mário Sérgio. 

Conheça os palestrantes: 

Conrado Corsalette, cofundador e editor-chefe do Nexo, jornal digital que coleciona prêmios internacionais de jornalismo e design, entre eles um Malofiej e dois ÑH.

Patrícia Gomes, diretora de produto do Jota, site focado em cobertura do Judiciário, que acaba de ser eleito a melhor startup de jornalismo do mundo, pela Associação Mundial de Jornais e Editores (WAN-IFRA).

Mário Sérgio, líder técnico da Operação Serenata de Amor, projeto de inteligência artificial (IA) focado na investigação de gastos públicos e responsável pelo desenvolvimento da Rosie (@RosieDaSerenata), uma robô que monitora e divulga gastos suspeitos de deputados federais. Mário é também presidente da Associação Python Brasil (APyB) e gerente do programa de Inovação Cívica da Open Knowledge Brasil.

Correio 40 anos O projeto Correio 40 Anos tem oferecimento do Bradesco, patrocínio do Hapvida e Sotero Ambiental, apoio institucional Prefeitura de Salvador, e apoio de Vinci Airports, Senai, Salvador Shopping, Unijorge, Claro, Itaipava Arena Fonte Nova, Sebrae e Santa Casa da Bahia.