O melhor do Brasil numa menina de 13 anos

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  • Gabriel Galo

Publicado em 27 de julho de 2021 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Ainda muito novo, cresci demais. Aos 13 anos, media 1 metro e 74 centímetros, mais alto que quase todo mundo da minha família. Aos 14, batia em metro e 92. Logo rompi a casa dos 2 metros. E como sói ocorrer em estirões nessa idade, exibia frágil chassi sem carne, ossos que se destacavam e uma certa falta de desenvoltura coordenada. Por favor, evite me julgar que você sabe muito do seu passado: todos somos feios aos 13 anos.

(Erga, pois, leitor, seu dedinho da exceção e faça valer a máxima: “nem todo mundo!” Não esqueça da indignação.)

Não tive algumas oportunidades que fazem parte do imaginário infantil. Meu pai nunca me levou para empinar pipa. Rolimã inexistia na nossa bolha, embora de topada no dedão jogando bola na rua, essa dor lancinante que molda caráter, tive meu quinhão. E nunca, nem de brincadeira, subi num skate. Ou patinete. Ou qualquer tipo de prancha, generalizemos. Meu esporte radical mesmo era atravessar a Avenida Vasco da Gama às seis horas da tarde para comprar pão.

No que se fez em minha mente de adolescente que estirava – permanecendo até hoje – o embasbacamento com quem neles se equilibra e faz manobras. Certa vez – houve essa época, call me cringe – ganhei um skate de dedo. A lógica era a mesma dos pés, só que na ponta dos dedos, indicador e do meio buscando radicais manobras. Qual o quê. O bicho voava a cada tentativa, nunca dava certo, provei-me leigo por completo ainda inocente, puro e besta. Pelo menos o vexame da incapacidade era privado. Desisti.

O tempo passa, o tempo voa, e o tempo se encarregou de endurecer o menino. Forjamos mecanismos de defesa de acordo com o impacto percebido da porrada. E só depois de muito tempo, mais velho e vivido, é que fui me desvencilhando de algumas certezas concebidas no concreto armado do choque com a realidade.

Eis que na madrugada do fim de semana olímpico, um grupo de garotas se divertia no skate, essa incongruência quântica no meu perceber. Esporte olímpico, carimbando formalidade a uma tribo que foi inclusive perseguida.  Mais que competidoras, estava ali a representação de comunidade. A vitória de uma era a vitória da outra. Com o extra de dancinhas de TikTok e uma quase ingenuidade. E um carisma imensurável.

Rayssa Leal levou para a pista de Tóquio não a carranquisse arrogante dos desbravadores, mas a doçura contagiante, mesmo ainda desbravadora. Maranhense, sorriso de aparelho, calça cargo, reviralizações do vídeo da fadinha, amiga protegida do Tony Hawk, lenda do esporte. E nos vimos como nação, unanimidade incontestável na torcida. Rayssa é identificação.

Há de se ter cuidado, no entanto. Afinal, são apenas 13 anos. Não é justo que seja colocado nos ombros de Rayssa cobranças e responsabilidades de ser uma nova liderança nacional, ainda mais num esporte que engatinha, num país em que atletas imploram migalhas para terem mínimas condições de se manterem no topo.

Enquanto isso, vou revendo aqui as manobras da pequena notável com meus joelhos apitando de dor, cálculos impossíveis de movimentos precisos, numa junção que não poderei jamais entender, muito menos explicar. Permanecerei leigo na diferença entre 4,53 e 5,17, bem como não lembrarei depois de amanhã do nome em inglês de quase nenhum movimento.

Mas que é bonito, é. Pela plasticidade e principalmente por quem o faz.

*Gabriel Galo é escritor e não consegue nem ficar de pé parado num skate