O triste fim de um grande projeto

Waldeck Ornelas é especialista em planejamento urbano-regional

  • Foto do(a) author(a) Waldeck Ornelas
  • Waldeck Ornelas

Publicado em 8 de dezembro de 2018 às 05:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: .

A Conder  nasceu Conselho de Desenvolvimento do Recôncavo, no governo Luís Viana Filho, fruto de proposta da Missão Técnica do BID que trouxe para a Bahia, como seu coordenador, o arquiteto peruano Eduardo Neira Alva, que aqui terminou fixando residência. Datam dessa época, dentre outros, a delimitação da área metropolitana de Salvador, os primeiros estudos de transportes e o Projeto Agropecuário do Recôncavo, cujos estudos pedológicos e zoneamento ainda merecem ser resgatados, além do Plano de Turismo do Recôncavo, aos cuidados de Rômulo Almeida.

Em 1973 foram criados, pelo governo do estado, o Fundo Especial de Equipamento da Área Metropolitana e, pelo governo federal, a Região Metropolitana de Salvador. O antigo Conder  absorveu a nova missão institucional e foi transformado em empresa pública (1974), mudando de gênero e assumindo a implantação da RMS.

Seguiram-se os trabalhos para consolidar o planejamento metropolitano. Destaco o Estudo de Uso do Solo e Transportes da RMS (EUST), já no governo Roberto Santos, sob a liderança do economista Osmar Sepúlveda, quando, simultaneamente, realizávamos, na Prefeitura de Salvador, o Plano de Desenvolvimento Urbano (Plandurb), que marcou a retomada do planejamento municipal, depois do Epucs, que datava dos anos 1940. Num exemplo que precisa ser retomado, os dois trabalhos realizaram-se de forma articulada e complementar. 

A passagem dos anos 1970 para os 80 foi marcada pelo equacionamento do abastecimento de água de Salvador e RMS, projeto de grande vulto, que envolveu a construção da barragem de Pedra do Cavalo, no Recôncavo, e que exigiu a constituição de uma outra empresa pública – a Desenvale, com foco no aproveitamento hídrico do rio Paraguaçu, a maior e mais importante bacia hidrográfica estadual.

Secretário do Planejamento na primeira metade dos anos 1980, tendo a Conder sempre vinculada à Seplantec, executamos o Projeto Metropolitano, financiado pelo Banco Mundial, com destaque para o equacionamento do destino final dos resíduos sólidos. Data dessa época o sistema que ainda hoje atende à RMS, com os três grandes aterros – Centro, Camaçari e Candeias, tendo este último sido perdido. Deve-se também à Conder a implantação do programa de parques metropolitanos, do Abaeté ao Dique, passando por Pituaçu e Costa Azul.

No terceiro governo ACM (1991-1994), outra vez como secretário do Planejamento, por meio do Convênio Conder-Ipac, associamos a capacitação técnica da Conder à expertise do Ipac para a realização de uma obra ciclópica – a recuperação do Pelourinho.

Depois iniciaram-se as transformações administrativas da Conder, primeiro absorvendo a função habitacional, logo tornando-se empresa de desenvolvimento urbano e já agora com área de atuação em todo o estado. Em um último desvio de finalidade, incorporou as atividades da antiga Sucab, dedicada às edificações públicas. Em grave distorção, a Conder deixou de ter uma diretoria de planejamento metropolitano trocada por uma diretoria do Centro Antigo de Salvador, uma atenção minimalista para a importância, complexidade e relevância dos desafios metropolitanos.

Com isto, ao longo do tempo, a Conder perdeu o foco e a identidade. A consequência é o que se vê agora, com a proposta a sua extinção. Enquanto isso, a Urbis, que há décadas não constrói uma única casa popular, continua viva, com uma sede grande e luxuosa, em área nobre, no bairro do Rio Vermelho. Salvador passa a ser, a partir de agora, a única das grandes regiões metropolitanas do país sem um plano de desenvolvimento e sem uma agência executiva. A Bahia avança de marcha a ré. Waldeck Ornelas é especialista em planejamento urbano-regional e ex-secretário do Planejamento, Ciência e Tecnologia da Bahia.