Orgasmo jurídico

Por Aninha Franco

Publicado em 3 de fevereiro de 2018 às 11:22

- Atualizado há um ano

. Crédito: .

Da trilha de sábado passado, que preferi não publicar, conservei apenas o título que descreveu minha sensação quarta-feira, 24 de janeiro, quando escutei os acórdãos dos jovens desembargadores confirmando a sentença de Moro no processo do “triplex”. Vivi para escutar juiz e desembargadores, todos com 45 a 54 anos, condenarem o político mais famoso do Brasil, de 72 anos, presidente da república que, no fim do segundo mandato, em 2010, esnobava 83,4% de aprovação popular. A confirmação da sentença foi a maior derrota que a impunidade – que nos devasta desde sempre – sofreu em sua vida brasileira, e demoliu o mais amado líder que o país já teve.

Os acórdãos desmontaram, com precisão cirúrgica, o argumento primário de que não havia provas contra Lula, mantra repetido diante de provas documentais, testemunhais e periciais que sustentaram a sentença de Moro, contratos, termos de adesão, fotos, declaração de IR, depoimentos e benesses aprovando instalações de elevador, cozinhas, armários e dormitórios, deck de piscina e compra de eletrodomésticos, pacote burguês que enobrece e dá status no Brasil de capitalismo predatório. E foi esse pacote burguês que fez de Lula da Silva inelegível para desespero do PT, partido de líder único, que se autodeclara de esquerda.

Ser corrompido é desprezível, ser corrompido por essas miçangas é duplamente desprezível, mas ser Lula da Silva e ser corrompido por elas é não ter nenhuma ideia de quem é, confiar demais na impunidade e entrar na overdose de poder. A corrupção do “triplex” é clichê patrimonialista que seduz a maioria dos políticos brasileiros, mas que não poderia chegar no pau-de-arara que se moveu da miséria ao poder máximo, e desmontou essa conquista quase milagrosa por um elevador privativo e uma cozinha Kitchens, mostrando de que barro é feito quando viajou para assistir ao espetáculo do desmonte num jatinho de Michael Klein, dono das Casas Bahia, e se hospedando no Sheraton.

Desconfio que ele não tem dimensão do que construiu e desconstruiu neste país de milhares de analfabetos, ainda, neste continente onde em se plantando tudo dá, mas que guarda famintos. Desconfio que ele não tem consciência do que fez com o povo que diz amar e de como será difícil construir outro cara saído do povo com o poder que ele teve. E, por fim, desconfio que o cara que fica tão bem de chapéu de couro e roupa de camponês era, é, sempre foi, apenas o personagem de uma opereta em cartaz. Lula da Silva em Concerto nunca foi de verdade. Seus espectadores é que fizeram dele um líder real.

Aquele líder que representou o povo no poder pela primeira vez em cinco séculos é mentira. De verdade é o cara que asfixiou o Palácio e o país com essa corrupção avassaladora, demoliu instituições e estatais, embotou a cultura, desempregou milhares de brasileiros de todos os estratos e levou a criação e a produção de volta aos anos 1980, desmoralizando o discurso de que a “esperança venceu o medo”. Lula fortaleceu a ideia de que o medo estava certo e empurrou o país para trás, de volta a 1989, às candidaturas de Collor e Bolsonaro, depois que conseguir fazer da democracia, literalmente, o povo no poder.