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Da Redação
Publicado em 19 de agosto de 2018 às 05:15
- Atualizado há um ano
Aos 17, Fulano de Tal (F.T) era adolescente em pânico por estar em mundo no qual nunca pedira para nascer. Acordou no meio da madrugada, zonzo, grogue, apoplético, e se perguntou: - Que merda é essa? O que estou fazendo aqui e agora? Quem sou eu? [Preparava-se para o vestibular. Tinha absoluta certeza: ser gay e ser o cocô do cavalo do bandido eram a mesma e desoladora miséria. Desse poço de azedume resultou simulacro de leproso de ‘Ben-Hur’ (William Wyler, 1959].
Alguém sugeriu: - Leva prum médico de tratar doido. [Levaram-no].
O ‘médico de tratar doido’ consultado receitou tranquilizantes, e o encaminhou a psicólogo com consultório na Avenida Joana Angélica, nesta Salvadores. Diante desse desconhecido – homem corpulento com cabeça de javali - escancarou a alma, o coração e o ânus – metaforicamente, claro.
Certo dia F.T. o encontrou no alvoroço do centro desta urbe – nas Mercês, na Avenida Sete. Desavisado, não só o abordou como lhe deu efusivo abraço. O homem da cabeça de javali manteve-se rijo, A seguir, desvencilhou-se grosseiramente da criatura que o acarinhava e fugiu. [Depois ficou sabendo: nessa época a relação terapeuta-paciente devia se resumir às quatro paredes do consultório].
Neste desalentado 2018, após mais de trinta e cinco anos se deitando em divãs alheios, F.T. reconhece: alguns psicólogos e psicanalistas o marcaram de maneira indelével. Como diria Jack-o-estripador, vamos por partes, ou melhor, por corpos, ou, melhor ainda, por ordem de entrada em cena.
1) Alejandro. Argentino de Mendoza apaixonado pela Bahia. Indicou a F.T., então com 28 anos, a leitura de ‘Dom Quixote’, de Miguel de Cervantes – e por isso lhe foi grato para todo o sempre. Também tentou lhe enfiar na cabeça o seguinte: Tudo que lhe acontecia e lhe aconteceria lhe era de inteira responsabilidade. [Estava absolutamente certo, mas F.T. achou esse inegável teorema demasiado cruel].
2) Vera. Amou-a até o dia em que, na pressa de inflar o ego em baixa do paciente, contou-lhe a seguinte história: em coquetel na noite anterior vários jornalistas teriam lhe dito que F.T. era um dos melhores ‘textos’ de São Paulo. [Nunca mais voltou ao consultório da rua Sergipe, Higienópolis, na capital paulistana].
3) Manoel. Paulistano almofadinha. Sempre de terno e gravata, era incansável em ouvir os queixumes de F.T., que jactava lamúrias caudalosas. Mas enfim capitulou, e ordenou ao paciente: - Meu filho, aperta o botão do foda-se!
4) Ângela. Brasiliense pragmática. Fumava feito chaminé durante as sessões e F.T. era obrigado a pagar ‘cash’ o valor da consulta – 90 reais à época – ao final de cronometrados 30 minutos.
5) Humberto. Carioca deliciosamente lacaniano. Costumou – e costuma – atender F.T. sem cobrar 1 centavo sequer. Tornou-se, por justos motivos, o psicanalista de estimação de Fulano de Tal.
[Na busca do (não) sentido da vida Sigmund Freud, Gustav Jung e Jacques Lacan são a nossa santíssima trindade][Fulano de Tal bate cabeça para essa trinca de ases]. [Eu, também].