Para um cavalo marinho

Por Mariana Rios

  • D
  • Da Redação

Publicado em 25 de agosto de 2017 às 17:52

- Atualizado há um ano

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Não dá pra esquecer o pequeno tênis azul da imagem registrada por cinegrafistas e fotógrafos que estavam no Terminal Náutico de Salvador, nesta quinta-feira (24), quando 18 pessoas morreram na corriqueira travessia de 12 km, em uma lancha, entre Mar Grande e Salvador.

A calça jeans, a jaqueta listradinha cobriam o corpo de Davi Gabriel, 6 meses, que vinha para a consulta com o pediatra na capital. Dia de pediatra é arrumar o pequeno para sair de casa, de lhe mostrar as coisas do mundo - fora da casa, para além da praça vizinha, do bairro onde moramos. Ficamos tão excitados quanto eles. (Foto: Reprodução/TV Bahia) É dia que teremos respondidas expectativas - de que estão crescendo bem, de que as habilidades cognitivas estão se desenvolvendo, se ganharam peso. Nos atemos às medidas como notas de um boletim. No fim, a apreensão em saber se estamos fazendo tudo certo, dá um orgulho danado - ainda mais quando se encara pela primeira vez essa missão. 

Quando a gente tem um filho, é inevitável não se colocar no lugar do outro, não imaginar a dor que sentiu/sente sua família, sua mãe, seu pai, de ver seu pequeno, carregado, inerte - é muito forte isso, e embora já tenha ouvido falar sobre esse sentimento, nunca havia sentido.

Mas esse bebê não chegou ao seu destino, não chorou ao ficar nuzinho na balança do consultório, não mostrou o que já havia aprendido. Morreu.  Ao montar aquele cavalo marinho que não concluiu sua missão de transportá-lo, de levá-lo ao pediatra em segurança.

Porra seu cavalo marinho, por que não foi forte? Que se empinasse nas ondas, permitisse que Davi te segurasse pela crina e não soltasse mais. Para que ele viesse ao pediatra, pra que a mãe dele soubesse que crescia bem, pra que não doesse tanto assim, na gente e em mim.

Mariana Rios é editora do CORREIO, texto originalmente publicado no Facebook

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