Parentes de menina morta por padrasto desconfiavam de abusos 

Ágatha, 2 anos, foi enterrada nesta manhã; mãe não compareceu ao enterro

Publicado em 22 de janeiro de 2019 às 16:27

- Atualizado há 10 meses

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Alguns sinais, como comportamento arredio, fizeram com que familiares de Ágatha Sophia desconfiassem que a pequena já vinha sendo estuprada pelo padrasto, o ajudante de pedreiro Edson Neri Barbosa dos Santos, 27 anos. A menina morreu no domingo (20), depois de ter sido abusada sexualmente na casa onde morava com a mãe e o padrasto, na Rua José Gomes de Aguiar, no bairro de Vila Canária, em Salvador.

"No Réveillon, carreguei Ágatha no colo. Ela começou a gritar: 'Ai, ai, não, não, está doendo'. Fiquei assustada porque a mãe deixava a menina sozinha com o padrasto. Ele costumava dar banho, trocar a roupa, colocar a menina no colo e ainda dar beijo na boca", declarou a tia da menina, a manicure Jacira Sales de Souza, 41, no velório da criança, que aconteceu na manhã desta terça-feira (22), no cemitério municipal de Pirajá.  Cortejo com o corpo de Ágatha no cemitério municipal de Pirajá na manhã desta terça (22) (Foto: Bruno Wendel/CORREIO) Segundo a tia de Ágatha, o comportamento de Edson com a menina chamava a atenção dos parentes, mas a mãe, a diarista Jéssica de Jesus, 21 anos, não teria notado nada anormal. "A gente perguntava a ela se havia alguma coisa de errado com a criança, mas ela dizia que não, que a criança gostava do padrasto", disse."Ela era uma mãe muito ausente. Uma vez a população tentou linchar Edson, quando rolou um boato de que ele havia tocado Ágatha de forma diferente. Ele escapou daquela vez por que a polícia chegou na hora, mas desta vez ele não teve a mesma sorte", completou a tia, na porta do cemitério.

Suspeito do crime, Edson foi morto na noite de segunda-feira (21), depois de ser capturado por uma facção criminosa. Em um vídeo que circula nas redes sociais e que foi obtido pelo CORREIO é possível ver o suspeito sem roupas e ferido na cabeça. 

A Polícia Civil informou que corpo encontrado com marcas de tiros no CIA/Aeroporto, na noite de segunda-feira (21), é mesmo do ajudante de pedreiro – segundo a família de Ágatha, é ele quem também aparece nas imagens da tortura, divulgadas no WhatsApp. Polícia Civil divulgou foto de Edson Neris Barbosa, 27: suspeito do crime (Foto: Divulgação/Polícia Civil)  A morte de Edson é investigada pela 1ª Delegacia de Homicídios / Atlântico (1ª DH/Atlântico), que já recebeu o laudo pericial com a confirmação do Departamento de Polícia Técnica (DPT) sobre a identificação do corpo, que permanece no Instituto Médico-Legal Nina Rodrigues na tarde desta terça-feira (22).

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Edson era procurado pela polícia - ele estava com mandado de prisão temporária em aberto por conta do estupro e morte de Ágatha. Segundo a família, o pai da menina, Ítalo Roque Lázaro da Costa, foi morto pela polícia no dia 22 de outubro de 2017, quando tinha 20 anos.

Ausência em enterro Em depoimento à polícia, a diarista disse que saiu para fazer uma faxina e, depois, decidiu não voltar para casa, porque ia encontrar com amigos no bairro de Tancredo Neves.  Jéssica, 21 anos, com a filha Ágatha Sophia (Foto: Reprodução) Jéssica não foi ao sepultamento da filha. "Ela sabe que todo mundo está retado com ela. Ela desistiu de vir ao enterro por medo da reação de todo mundo. Ela ficou na casa da mãe", disse tia da menina, a auxiliar de serviços gerais  Elisângela Novais, 33. 

O enterro da pequena Agatha Sophia foi marcado por momentos de emoção. Durante o velório, muitas pessoas choravam. "Meu Deus, toma conta do nosso anjinho", repetia Elisângela. Uma outra tia da criança, Cassia, chegou a desmaiar mais de uma vez e foi necessário levá-la a uma Unidade de Pronto Atendimento Médico (UPA). 

Abuso sexual Ágatha deu entrada na UPA de São Marcos, no domingo, na companhia da mãe e já sem sinais vitais. Uma equipe de médicos que estava de plantão realizou procedimentos a fim de reanimá-la, mas a menina já estava morta, segundo a assessoria de comunicação da Secretaria da Saúde de Salvador (SMS).

Parentes afirmavam que médicos da unidade os alertaram sobre a possibilidade da menina ter sido abusada sexualmente antes de sofrer uma parada cardiorrespiratória – o que teria sido a causa da sua morte. “A SMS esclarece que não realiza investigação da causa da morte, procedimento de anuência do IML, local para onde o corpo foi encaminhado”, disse em nota. 

De acordo com o Departamento de Polícia Técnica (DPT), o laudo que atesta o que matou a menina só deve ficar pronto em 15 dias, podendo ser prorrogado caso haja necessidade. O DPT não informou quais exames seriam realizados no corpo de Ágatha.

Saiba como prevenir, identificar e denunciar esses casos A ONG Childhood Brasil, que busca promover e defender os direitos das crianças e adolescentes com foco na questão da violência sexual, dá dicas sobre como identificar indícios de que a criança é alvo de violência doméstica e sexual.

Itamar Gonçalves, um dos gerentes da ONG, conversou com o CORREIO e explicou como observar e agir nesses casos. Confira:

Autoproteção: Pode ser ensinada para crianças a partir de 3 anos. Veja como:3 aos 5 anos - Nesta idade, as crianças já podem aprender a identificar as partes íntimas de seu corpo e o que ela não pode permitir que façam com seu corpo.A partir dos 5 anos - A criança pode aprender noções de segurança pessoal, assim como ela já aprende, por exemplo, situações de risco como atravessar a rua.A partir dos 8 anos - Deve-se iniciar um trabalho de informação sobre as condutas sexuais que são aceitas, de acordo com crenças e convicções de cada família

Observe os sinais: *Mudanças no comportamento sem explicação aparente, mudança de humor, comportamentos regressivos e agressivos, sonolência excessiva, perda ou excesso de apetite;

*Lesões, hematomas e machucados que não tenham explicação clara ou coerente de como aconteceram;

*Ocorrência de doenças sexualmente transmissíveis;

*Medo de adultos, medo de alguma pessoa específica que pode ser o potencial agressor, medo de escuro ou de ficar sozinho;

*Interesse sexual precoce através de brincadeiras de cunho sexual e uso de palavras ou desenhos que se referem às partes íntimas de forma precoce podem indicar uma situação de abuso.

Acha que uma criança está sofrendo violência sexual? Busque canais como Disque 100, que é anônimo, o aplicativo do Ministério dos Direitos Humanos Proteja Brasil, ou dirija-se ao Conselho Tutelar (veja endereços aqui) e delegacias especializadas mais próximas. Eles irão investigar o caso.

Busque também o Ministério Público da Bahia (MP-BA) (sede em Salvador, na Avenida Joana Angélica, nº 1.312, Nazaré, e telefone (71) 3103-6400), os Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) ou as delegacias comuns para denunciar.