Passado presente: a luta antirracista de Luiz Gama

Filme de Jeferson De faz retrato do poeta e advogado baiano vendido como escravo pelo pai

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  • Ana Pereira

Publicado em 7 de agosto de 2021 às 07:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Pedro Iglesias Amaral

O cineasta paulista Jeferson De vem pondo em pauta diferentes aspectos da negritude  e do racismo no país, como nos filmes Bróder (sobre um jogador da favela que fica rico) e M8: Quando a Morte Socorre a Vida (sobre um jovem negro que vai estudar medicina em uma escola de elite).

Mas há muito tempo uma ideia o acompanha: fazer um longa-metragem sobre o poeta e advogado baiano Luiz Gama (1830-1882). Mais precisamente oito anos, durante os quais ele foi reunindo as condições de tirar do papel a produção, que estreou este fim de semana nos cinemas - em Salvador, pode ser visto no Cine Itaú Glauber Rocha,  às 16h50.

 E digamos que o tempo fez bem ao filme, que faz uma boa reconstituição de época, tem um elenco coeso e um bom recorte da vida do abolicionista, sem a pretensão de esgotar o assunto. Nem de dar conta da complexidade daquele momento. Quem quiser, por exemplo,  sabermais  do escritor, considerado um dos autores negros mais importantes do país, vai se frustrar.

O filme acompanha a vida de Luiz Gama a partir do momento em que é vendido, aos 10 anos, pelo pai português, para traficantes de pessoas escravizadas e mandado para São Paulo, em 1847. A mãe dele foi uma escrava liberta, mas pouco se sabe sobre ela. E que poderia ter sido a líder revolucionária Luiza Mahin. 

É na provinciana capital paulista que o garoto vai aprender a ler e passa a se dedicar ao direito, conquistando a própria liberdade, aos 18 anos. Posteriormente vai exercer a advocracia, dedicando-se à defesa de pessoas negras. Ele libertou mais de 500 pessoas.      O ator Angelo Fernandes é o Luiz Gama jovem: liberdade conquistada (foto: divulgação) Um dos acertos do filme, que tem roteiro de Luiz Antonio, é mostrar a atuação de Luiz Gama a partir de um caso específico e marcante: a defesa que ele fez de um escravo que assassinou o seu dono. Um julgamento em que o advogado exibe sua retórica para mostrar as injustiças e contradições do sistema escravocrata, que seguia em vigor e do qual ele foi uma grande vítima.   

As cenas do tribunal valorizam  a boa atuação de César Mello, que vive o Luiz Gama adulto. Ele divide o papel com  Pedro Guilherme (criança), Angelo Fernandes (jovem) “Pensei comigo, essa é uma história que eu gostaria de contar, deste homem que tinha uma trajetória pessoal muito parecida com a de um herói”, afirma Jeferson, que optou por uma narrativa que não explora a violência física.

 “O filme surge desta vontade de conectar as pessoas em uma ponte com a pesquisa histórica de sua vida. Esta não é uma obra definitiva sobre Gama, sua história pode ser, e espero que seja, desdobrada em muitas outras obras”, resume  Jeferson De.