Premiado musical Cartola: O Mundo É um Moinho ganha duas apresentações no TCA

Estrelado pelo ator gaúcho Flávio Bauraqui, montagem traz 25 artistas em cena, entre músicos e atores

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  • Da Redação

Publicado em 25 de julho de 2017 às 09:10

- Atualizado há um ano

A vida de um dos maiores sambistas da história vai virar enredo de escola de samba. A Estação Primeira de Mangueira, finalmente, vai homenagear um de seus fundadores e  filho ilustre: Agenor de Oliveira ou, simplesmente, Cartola (1908-1980). Só que não será preciso esperar fevereiro chegar. A preparação do desfile é, na verdade, o enredo do espetáculo Cartola: O Mundo É um Moinho, que chega a Salvador nesse fim de semana. As apresentações acontecem no Teatro Castro Alves, sábado, às 20h, e  domingo, às 19h. Com duas participações especiais: Lazzo no primeiro dia e  Margareth Menezes no segundo.Flávio Bauraqui foi indicado ao prêmio APCA por sua atuação em Cartola: O Mundo É um Moinho(Foto: Aline Aquino/ Divulgação)O espetáculo se vale da relação de Cartola com a Mangueira como uma espécie de comissão de frente, um abre- alas para o enredo, que acompanha de forma cronológica a vida do sambista carioca, que cantou como poucos a vida prosaica e os infortúnios do coração em clássicos como As Rosas Não Falam, Alvorada e O Mundo É um Moinho.Relação antiga Quem dá vida ao protagonista é o ator gaúcho Flávio Bauraqui, 51 anos, que contracena com outros 25 artistas, entre músicos e atores – à exceção de Bauraqui e de Virginia Rosa, que interpreta Dona Zica, grande paixão da vida de Cartola, todos os outros artistas foram selecionados através de uma audição que mobilizou milhares de atores negros pelo  país.Idealizado pelo ator e produtor Jô Santana, o espetáculo tem dramaturgia do jornalista Artur Xexéo, direção e encenação de Roberto Lage, pesquisa de Nilcemar Nogueira, neta de Cartola e secretária de Cultura do Rio de Janeiro,  e direção musical de Rildo Hora.O musical destaca o papel que as mulheres tiveram na vida do artista (Foto: Aline Aquino/ Divulgação)Essa não é a estreia de Bauraqui em musicais, nem é a primeira vez que ele interpreta Cartola. Em 2004, ele protagonizou o espetáculo Obrigado, Cartola!, que ficou em cartaz por apenas três meses. A curta temporada fez o ator se perguntar por anos o que faria com a preparação tão longa que fez para viver o personagem. “O Obrigado, Cartola! era um musical, mas não com a potência do Cartola: O Mundo É um Moinho. Tinha música, mas não tinha um elenco numeroso, nem espaço para grandes coreografias, era bem calcado na dramaturgia do teatro”, compara. "É um resgate da família, da autoestima do negro,da nossa conexão com o Cartola, com o teatro ecom o gênero musical", diz Flávio Bauraqui(Foto: Walter Firmo/Divulgação)Ele reflete que o Cartola que faz hoje surgiu naquela montagem, a partir de seu estudo de timbre de voz, da análise das fotos e dos vídeos, que mostravam detalhes, como a elegância ao andar. “Cheguei a comprar um terno em um brechó e saía andando feito o Cartola pelo Humaitá, um bairro do Rio. As pessoas me olhavam e diziam que eu era louco. E eu fazia esse estudo diariamente, ficava obsessivo mesmo”, lembra o ator, que  usou um anel do próprio Cartola em cena. “Uma bênção para mim”, conclui.O fim abrupto do espetáculo, por questões de produção, levou o Cartola de Bauraqui a outros lugares até então não imaginados. “Participei das homenagens aos 100 anos do sambista, em 2008, levei o personagem para a minissérie JK, da TV Globo, e fiz alguns shows com Beth Carvalho, em que ela cantava clássicos do samba”, lembra.MulheresA atuação em Cartola: O Mundo É um Moinho também pode ser considerado outro desdobramento daquele trabalho. Afinal, foi por causa dele que Nilcemar Nogueira, neta de Cartola, fez questão de recomendar Bauraqui para o papel. “Da mesma forma que Cartola lutou por sua arte e só conseguiu gravar um disco aos 65 anos, tive de ter paciência para poder vivê-lo como sempre sonhei”, diz.Principal responsável pela obra do artista, Nilcemar é neta biológica de Dona Zica, última esposa de Cartola - ele era estéril. Quando se casaram, em 1954, Cartola e Dona Zica já tinham mais de 40 anos. Vizinhos no Morro da Mangueira, os dois se conheciam desde jovens, mas nunca haviam namorado. Viveram juntos por mais de 26 anos, até a morte de Cartola, em 1980. “Cartola sempre teve mulheres muito fortes ao lado. A primeira, Deolinda, tinha a pá virada, lidava tranquilamente com a vida dele de malandro da noitada e da bebida. Depois da morte dela veio Dona Zica, que tinha uma veia mais maternal, de cuidar, de recuperar a saúde dele, que já estava comprometida. Acho que o espetáculo recupera esse afeto e carinho e dá o devido destaque às mulheres da vida de Cartola”, conta Bauraqui.Busca por espaçoAs histórias de Cartola e Bauraqui se encontram em outros aspectos. Curiosamente, os dois foram porteiro já no decorrer da trajetória artística. Sumido misteriosamente do Morro da Mangueira na década de 40, com samba-enredo premiado e obra gravada por Carmen Miranda, Cartola vivia de lavar carros e vigiar prédios em meados dos anos 50. Foi justamente esse último o trabalho que impulsionou a carreira de Bauraqui, quando, aos 26 anos, chegou no Rio, depois de ter atuado por mais de uma década no Sul.“O Cartola era muito determinado. Ele tinha um grande talento e sabia disso, confiava e partia para ação, apesar de todos os pesares que sabemos que incidem em nós, negros”, diz o ator, que já faturou vários prêmios pela atuação, como o de ator pela Associação Paulista de Críticos de Arte - APCA. O gestual tímido, a postura ereta, a voz límpida aproximam Bauraqui de Cartola, mas o ator foge da tentativa de imitar o sambista, o que poderia dar um tom cômico à encenação. No ápice do musical, Augusto Pompêo, que interpreta Sebastião, pai de Cartola, e Virgínia Rosa, que dá vida a Dona Zica - com quem Cartola foi casado até a morte - cantam ao lado de Flavio Bauraqui O Mundo é um Moinho (Foto: Edson Lopes Jr./ Divulgação)Ele ressalta que sua história, assim como a de Cartola, é a de um artista negro que busca ocupar seu espaço em uma sociedade excludente. “Este musical representa uma conexão com o passado, com as raízes, uma homenagem e, ao mesmo tempo, um reencontro com um personagem que já passou pela minha vida em diversos lugares”, comenta. “É um resgate da família, da autoestima do negro, da nossa conexão com o Cartola, com o teatro e com o gênero musical, que também pode ser brasileiro”.O espetáculo chega a Salvador depois de já ter sido visto por mais de 70 mil espectadores. “Salvador sempre esteve nos planos dessa turnê. Quando você vê uma plateia negra assistindo negros no palco, você vê que há uma identificação imediata”, diz Bauraqui. O musical conta com um samba-enredo inédito, composto por Arlindo Cruz e Igor Leal, que embala o desfile fictício da Estação Primeira de Mangueira nas cenas finais.

Serviço:O QUÊ: Espetáculo Cartola, o Mundo É um Moinho, com Flávio Bauraqui, Andréa Cavalheiro, Hugo Germano e Adriana Lessa; Direção de Roberto LageONDE: Sala Principal do Teatro Castro Alves, Campo GrandeQUANDO: 29 e 30 de julho (sábado, às 20h, domingo, às 19h)QUANTO: R$ 100 |R$ 50 (A a P), R$ 80|R$ 40 (Q a Z6) e R$60| R$30 (Z7 a Z11)