Primeira greve que parou a Cidade da Bahia é tema de livro de João José Reis

Historiador lança nesta sexta (23) o livro Ganhadores - A Greve Negra de 1857, no MAB

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  • Ana Pereira

Publicado em 23 de agosto de 2019 às 05:50

- Atualizado há um ano

. Crédito: Reprodução

È só pensarmos nas  consequências da greve dos caminhoneiros  em 2018 para entendermos o impacto da primeira greve que parou a  Bahia no século XIX. Este é o tema de Ganhadores - A Greve Negra de 1857 na Bahia, novo livro do historiador e professor baiano João José Reis, que tem lançamento nesta sexta- feira(23) no Museu de Arte da Bahia, às 18h30.   

Fundamentais na engrenagem da cidade, os ganhadores - negros escravos ou libertos, muitos africanos - transportavam todo tipo de mercadorias e até pessoas, nas famosas cadeiras de arruar. Também prestavam serviços  variados e ainda vendiam quitutes e comidas  na movimenta Salvador da época. 

“A cidade praticamente parou junto com os ganhadores. Seria como se hoje todos os meios de transportes deixassem de funcionar na cidade por dez dias”, afirma Reis, referindo-se ao movimento, que durou dez dias e instalou o caos, apavorando a elite e os governantes. João Reis retrata greve que paralizou força de trabalho em Salvador no ano de 1857 (Foto: Divulgação) Com uma pesquisa intensa e uma narrativa envolvente que se aproxima da ficção, João Reis descreve o panorama da época e o desenrolar dos acontecimentos, acompanhados  de perto pela imprensa. A greve, pacífica e organizada, se deu por conta do arrocho fiscal e do controle policial que a Câmara Municipal exercia sobre os ganhadores. 

Além de exigências que os trabalhadores não mais aceitavam, como usar uma placa de identificação, como as colocadas  em carruagens e tabuleiros e consideradas muito humilhantes. “As chapas foram um dos aspectos mais antipáticos da lei municipal que motivou a greve”, resume Reis.  

Por que escolher esta foto mais fechada para ilustrar o trabalho? Essa foto de um ganhador africano foi feita no início da década de 1860 por Alberto Henschel. O fotografado é uma pessoa anônima mas que, com toda certeza, participou da paralização de 1857. Assim, além de muito expressiva, a fotografia tem tudo a ver com o tema do livro. A bonita capa foi concebida por Mariana Newlands.

 A título de comparação, qual a importância que os ganhadores teriam na sociedade hoje? Os ganhadores que pararam eram os principais responsáveis pelo transporte de cargas leves e pesadas na Salvador da época, além de conduzir passageiros em cadeiras de arruar, também chamadas cadeirinhas. A cidade praticamente parou junto com os ganhadores. Seria como se hoje todos os meios de transportes deixassem de funcionar na cidade por dez dias. Por aí você pode avaliar o impacto do movimento. (Foto: Reprodução) O que a greve negra de 1857, absolutamente inédita na época, pode nos ensinar para os dias de hoje? Ensina que se deve tratar muito bem quem cuida do setor de transporte em qualquer sociedade.

Você poderia falar um pouco sobre o papel da imprensa na greve? A imprensa, no caso o Jornal da Bahia e alguns jornais cariocas, foram a minha principal fonte de notícias, embora não a única, sobre o andamento da greve. Sem a imprensa não teríamos sabido sobre um episódio que foi pouquíssimo tratado nos documentos oficiais. Apesar disso, o teor das notícias era de horror à paralisação, vista como uma perigosa audácia dos africanos escravizados e libertos. A imprensa queria que o governo provincial reprimisse de alguma forma os grevistas, mas não havia como porque inexistia legislação que criminalizasse um movimento inédito como este. Mas há um outro aspecto da cobertura jornalística a se levar em conta: o Jornal da Bahia era um órgão conservador e o presidente da província, João Luis Vieira Cansação de Sinimbu, era liberal, e a greve foi usada como um bom pretexto para atacá-lo. Por exemplo, escreveram que o presidente era um fraco e a Bahia estava sendo “governada pelos africanos”. Que tal?

 As mulheres que trabalhavam como ganhadeiras também eram obrigadas a usar as chapas? As chapas foram um dos aspectos mais antipáticos da lei municipal que motivou a greve. Os africanos, além de pagar um novo imposto de serviço e, no caso dos forros, ter que apresentar um fiador que garantisse pelo seu bom comportamento, seriam obrigados a usar uma chapa de metal ao pescoço. Os ganhadores consideraram a medida humilhante. As ganhadeiras já usavam uma tal chapa, mas coladas a seus tabuleiros e caixinhas de mercadejar, não sobre o corpo. Além disso já pagavam um tributo quatro vezes maior do que aquele agora imposto aos ganhadores, isto porque labutavam num setor do mercado de trabalho urbano bem mais lucrativo do que o de carregar. Elas viviam do comércio de rua

FICHA

Livro: Ganhadores - A Greve Negra de 1857 na BahiaAutor: João José ReisEditora:  Companhia das LetrasPreço:  R$ 99,90 e R$ 44,90 (ebook) (451 páginas) Lançamento:  Sexta-feira (23),  às 18h30Onde:  Museu de Arte da Bahia (Corredor da Vitória)Editora: Companhia das Letras