'Quero que lembrem de mim nos palcos', desejou Vanusa

Conheça o legado da cantora de voz poderosa que morreu aos 73 anos

Publicado em 8 de novembro de 2020 às 18:30

- Atualizado há 10 meses

. Crédito: Foto: Marcos Pacheco/Divulgação

“Quero que as pessoas lembrem de mim nos palcos, cantando, a minha obra, a minha música”. O desejo da cantora Vanusa, ainda em vida, foi acompanhado por um pedido para o filho Rafael Vannucci: “Não deixe as pessoas me verem doente”. Missão nada fácil que Rafael tentou atender até os últimos dias da mãe, morta na manhã de ontem aos 73 anos, em decorrência de uma insuficiência respiratória.    Estrela vanguardista, como é lembrada por muitos, a cantora Vanusa estava sumida nos últimos anos. O motivo é que sofria de uma demência grave, semelhante ao mal de Alzheimer, e não queria ser lembrada dessa forma. Mas o anúncio da sua morte trouxe à tona a doença degenerativa que enfrentava há 15 anos. Ao mesmo tempo, a notícia fez admiradores mergulharem na importância do seu legado.    “Descanse em paz, estrela vanguardista dona de tantas ‘Mudanças’”, disse a atriz e humorista Nany People, em seu Instagram, fazendo referência a dos sucessos de Vanusa. “Poucas mulheres impactaram e fizeram tanto pela ‘liberdade de expressão’ da causa #lgbtq como você e sua arte! Sua postura e sua música encorajaram toda uma geração (principalmente a minha) quando não era ‘modinha’ dar voz à nossa causa!”, exaltou.     Já o cantor Daniel contou como Vanusa serviu de inspiração para sua vida e carreira. “Era uma das artistas que eu sempre ouvia em casa através da minha Mãe!!! Perdemos mais uma grande voz, mais uma partícula da nossa MPB, que deixa seu legado pra todos nós!!!”, reforçou, sobre a cantora que será enterrada nesta segunda-feira (9), em São Paulo.“Filho, cuida de mim, me protege. E, por favor, não deixa as pessoas me verem doente, acamada, se eu ficar feia… Porque eu quero que as pessoas lembrem de mim nos palcos, cantando, a minha obra, a minha música” - Vanusa, quando fez um pedido para o filho Rafael VannucciExperimental  Ao todo, 23 discos gravados e a marca de mais três milhões de cópias vendidas dão uma ideia do que foi a passagem de Vanusa por aqui, quando o sucesso ainda não era medido pelo número de visualizações. Sua carreira começou cedo, com 16 anos, e contou com momentos marcantes como a passagem pela Jovem Guarda e sua consolidação como cantora românica.    Fã de música desde criança, Vanusa Santos Flores nasceu em Cruzeiro, no interior de São Paulo, foi criada nas cidades de Uberaba e Frutal, em Minas, e ainda adolescente tornou-se cantora de um grupo de rock. Chama a atenção que em seu primeiro álbum, gravado em 1968, Vanusa se mostrava antenada à luta antirracista impulsionada por Martin Luther King (1929-1968), assassinado no ano em que o disco foi lançado.    “Fiquei muito triste com a notícia da morte da cantora Vanusa. Ela foi uma fada que anunciou a chegada do Avôhai. (...) Vanusa tinha uma voz poderosa e se diferenciava, nos anos 60, com composições políticas e sociais definidas. Ícone da Jovem Guarda, linda e sexy! Para sempre vou me lembrar dela! Viva Vanusa!”, elogiou o cantor Zé Ramalho.    Depois de uma apresentação vista pelo empresário Sidney Carvalho, Vanusa acabou fazendo parte de programas de televisão como o humorístico Os Adoráveis Trapalhões, na extinta TV Excelsior. Sua carreira musical ficou marcada por músicas como Mudanças, Manhãs de Setembro, Sonhos de um Palhaço e Paralelas. 

Hino  Depois dos anos 2000, a cantora viveu longe dos holofotes e só reapareceu em 2009, em um episódio que trouxe feridas emocionais severas. Vanusa pensou em desistir da carreira, entrou em depressão e teve Síndrome do Pânico por causa daquele momento que já dava indícios da doença que a acometeria anos depois.    Em uma cerimônia na Assembleia Legislativa de São Paulo, em agosto de 2009, ela foi convidada a interpretar o Hino Nacional. Na hora de cantar, atrapalhou-se com os versos e trocou as palavras. O momento foi filmado, o vídeo viralizou e foi tratado como uma peça de humor. Na época, Vanusa explicou que tomou remédio para labirintite e ficou tonta na hora da apresentação.    “Foi uma maldade de quem fez, de quem retirou aquela gravação da Assembleia. Eles cortaram a parte inclusive em que eu desmaiei depois de cantar. Eu comecei a cantar e não sabia mais o que estava fazendo, e pouca gente sabe ainda que eu desmaiei. Mas olha só: com essa história do Hino Nacional, até as crianças de 5 anos passaram a me conhecer”, lembrou Vanusa, em entrevista ao Estadão, em 2015.    Foi neste ano que gravou seu último disco, idealizado e produzido por Zeca Baleiro: Vanusa Santos Flores (2015). A artista fez releituras de Angela Ro Ro, Zé Ramalho e até uma parceria com Baleiro. “Ela é uma cantora muito importante na história recente da nossa música popular, e depois daquele episódio do Hino, precisava dar a volta por cima”, lembrou Zeca, nas redes sociais. “Era uma pessoa doce e foi uma grande aula trabalhar com ela. Viva Vanusa!”, completou. “Ela é uma cantora muito importante na história recente da nossa música popular, e depois daquele episódio do Hino, precisava dar a volta por cima. Levamos dois anos trabalhando na feitura do cd, que levou seu nome completo: Vanusa Santos Flores. Ela era uma pessoa doce e foi uma grande aula trabalhar com ela. Viva Vanusa!” - Zeca Baleirohttps://www.instagram.com/p/CHVmSSWn650/?utm_source=ig_embed&utm_campaign=loadingVer essa foto no InstagramCerto dia convidei a Vanusa pra ir no meu estúdio e lá falamos sobre a possibilidade de fazermos um cd novo. Ela ficou muito feliz. Ela é uma cantora muito importante na história recente da nossa música popular, e depois daquele episódio do Hino, precisava da volta por cima. Levamos dois anos trabalhando na feitura do cd, que levou seu nome completo: Vanusa Santos Flores. Ela era uma pessoa doce e foi uma grande aula trabalhar com ela. Viva Vanusa! ???? foto de Marcos Pacheco, no Tom Jazz, em 2014.

Uma publicação compartilhada por Zeca Baleiro (@zbaleiro) em 8 de Nov, 2020 às 9:03 PST

‘Cantou, brincou e riu’, diz família de Vanusa sobre seus últimos momentos  Ao lado da filha mais velha, Amanda, fruto do casamento com o cantor e compositor Antônio Marcos (1945-1992), Vanusa passou seus últimos dias antes de morrer. As duas chegaram a cantar juntas na casa de repouso onde a artista estava internada em Santos, em São Paulo, segundo nota divulgada pela família.    “Ontem [ela] teve um dia muito feliz com a visita da Amanda. Cantou, brincou, riu, se alimentou bem”, afirmou a nota. “Nos últimos anos, Vanusa teve depressão, problemas gerados pelo uso de medicamentos tarja preta em excesso, o que a deixaram muito debilitada”, completou.    Nas redes sociais, outra filha de Vanusa, Aretha Marcos, se pronunciou sobre a morte da cantora. A irmã de Rafael Vannucci compartilhou uma foto da mãe com o ex-marido, Antônio Marcos, e lembrou que o dia de sua morte era também a data de aniversário de seu pai.     “O amor é impossível. Hoje, aniversário do meu pai, ele veio buscar minha mãe para viverem juntos na eternidade”, publicou Aretha. Em outubro, a filha de Vanusa também usou as redes para falar sobre um suposto desentendimento que teve com a mãe no passado, e sobre a atual situação da cantora.    “Foram inúmeras matérias de sites e jornais, além de programas de TV onde ela estava doente e disse inverdades que me levaram a sair da mídia por anos”, afirmou Aretha. “Eu estive com ela no hospital há dois anos revezando com a Amanda, morei na casa dela para ajudá-la. Hoje quem tem a guarda dela é meu irmão”, disse.    Depois de revelar que levou muito tempo para se recuperar do que foi veiculado na imprensa, Aretha disse que se sente em paz com a mãe. “Não existe pedir perdão porque não lhe fiz nada. Sempre ajudei no que pude. Me afastei para me proteger dos inúmeros boicotes midiáticos gerados entre eu e ela”, concluiu.