Resenha: O Animal Cordial é um filme desconfortável desde o início

Filme que participa da Competitiva Nacional do Panorama Coisa de Cinema será exibido nesta sexta (10), às 20h10

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  • Da Redação

Publicado em 10 de novembro de 2017 às 11:04

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Divulgação

O restaurante La Barca está para fechar. Um único cliente devora seu coelhinho gourmet e a turma da cozinha já está impaciente, pois o metrô fecha e não há condução certa depois de determinado horário. Inácio (Murilo Benício) é o dono do restaurante. Ele controla o possível motim com gestos e palavras duras. Parece estar pronto a levar qualquer um ao pelourinho. Djair (Irandhir Santos) é o cozinheiro. Justo ele, o mais rebelde entre todos. Inácio não está contente. Nem com os empregados, que estão sempre a um passo da insubordinação, nem com os clientes, que não sabem apreciar com a educação devida todo seu esforço para manter aquele elegante estabelecimento. Como é difícil manter a civilização! Ou melhor: como é difícil se manter civilizado (vale aqui a imagem de um dono de um carro luxuoso, capaz de atropelar pedestres ordinários que ousam atrapalhar o seu ir e vir).   Logo no início do filme, Inácio se aproxima do espelho. Ele se olha, finge uma entrevista. Falseia estar feliz. Há traços de psicopatia evidentes. Algo inescapável está a acontecer. Está acontecendo.O Animal Cordial, de Gabriela Amaral Almeida, é um filme desconfortável desde o início.  O som amplificado ajuda a construir a tensão. O abrir de portas ou um simples sacar de rolha de uma garrafa de vinho são ações tensas. A música suave ao fundo amplia o nervosismo.   Tudo piora quando dois ladrões playboys invadem o recinto. Eles são despreparados e levarão, certamente, uma lição. Ali, explode a briga de classes e entre classes. Ninguém confia em ninguém. São todos contra todos! Murilo Benício é Inácio, dono do restaurante La Barca (Foto: Divulgação) Inácio rapidamente domina a situação auxiliado pela enigmática garçonete Sara (Luciana Paes). O que Sara deseja ao auxiliar de forma tão perversa o seu patrão? Sexo? Dinheiro? A perversidade aflora e perde-se qualquer limite. Veremos sangue sendo derramado, muito sangue, quando o ódio vem à tona.   A brutalidade é o padrão em “O Animal Cordial”, um espelho de um país fundado nos navios negreiros. La Barca é o nome do restaurante. A nossa “civilização” nasceu dos tumbeiros, de uma escravidão sistêmica e cruel como jamais vista. Enfim, um restaurante com a cara do nosso país.Tentaremos lavar o chão de sangue e vômito, mas não vamos conseguir esconder as evidências de tantos crimes já cometidos em nome do progresso....

*Cláudio Marques é cineasta e coordenador do Panorama Coisa de Cinema