Rico Dalasam volta em álbum com produtores baianos

Lançamento marca retorno depois de rapper ser 'cancelado' nas redes

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  • Roberto Midlej

Publicado em 18 de março de 2021 às 06:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Larissa Zaidan/divulgação

Já faz tempo que o rapper paulista Rico Dalasam, 31 anos, vinha flertando com a música da Bahia. Desde seu primeiro sucesso, Aceite-C, de 2014, que tinha um sample de O Mais Belo dos Belos, um clássico do samba-reggae gravado por Daniela Mercury. Depois, ele se juntou ao baiano Mahal Pita, que em 2015 produziu um remix de uma música dele, Riquíssima. E aquele flerte acabou crescendo, até que uma turma baiana invadiu o novo álbum do rapper, Dolores Dala, o Guardião do Alívio, o segundo de sua carreira.

Além de Mahal, outros três produtores baianos atuam no álbum: Rafa Dias, Wallace Chibatinha e Netto Galdino. “Acho que consegui juntar um pessoal com quem tenho trocado umas ideias nos últimos anos e o álbum condiz com o que tenho feito ultimamente. Vinha trocando umas pesquisas sonoras com Mahal e há muito tempo queria trabalhar com Rafa”, revela Rico. Há ainda outros três produtores que não são baianos: Pedrowl, Moisés Guimarães, Dinho Souza.

A “assinatura” dos produtores pode ser facilmente percebida, mas a identidade de Rico permanece intacta, apesar da diversidade proposta por eles. “Não há uma disparidade estética entre as músicas. Não é um disco de músicas locais. Rafa Dias, no meu álbum, não faz o pagodão que costuma fazer. Mahal, que é conhecido por sua colaboração com o BaianaSystem, não faz música eletrônica comigo”, argumenta. O baiano Rafa Dias é um dos produtores (divulgação) Tem ainda o caso de Netto Galdino, baiano de Caravelas que pesquisa a música do sul da Bahia e forró. “Mas no meu disco a gente faz música latino-americana”, ressalta Rico. Segundo o rapper, mesmo com um acabamento popular, não dá pra dizer que seja um álbum comercial com a cara do Brasil. “É world music”, define.

Volta por cima Dolores Dala, o Guardião do Alívio significa uma volta por cima para Rico, depois de passar pela experiência de ser “cancelado” nas redes sociais depois de um embate jurídico que envolvia Pabllo Vittar. O rapper havia gravado a música Todo Dia com a drag queen e era o autor da letra. Mas não estava recebendo os direitos autorais, que ficavam com o produtor de Pabllo, Rodrigo Gorky. Rico então determinou que a música não fosse veiculada. Os fãs de Pabllo se mobilizaram e “cancelaram” o rapper paulista.

Rico afirma que, depois disso, passou por um período emocional muito ruim. “Achei que já era, que não tinha outro caminho e que ia acabar ali a minha relação com a música”, recorda-se. Mas ele relaxou e ficou esperando até que a música o chamasse novamente. Deu uma parada na carreira e viveu com a reserva que tinha acumulado nos anos prósperos anteriores. 

Até que em 2019, depois de quase uma ano e meio sem apresentar um single, finalmente lançou Braille, sobre um amor inter-racial. “Aí, as pessoas voltaram a olhar pra mim”, comemora.

Queer Logo que surgiu, Rico chamou a atenção pela sua música. Mas o fato de ser o primeiro rapper brasileiro a se assumir gay também fez as atenções se voltarem para ele. O artista acabou se tornando símbolo brasileiro do queer rap, movimento surgido nos EUA e que Rico conheceu de perto em 2015, quando esteve em Nova York.

Lá, conheceu Mykki Blanco e Cakes da Killa, expoentes do queer rap americano. Os artistas representavam uma resposta a Snoop Dogg, que anos antes dissera, numa entrevista, não saber se o rap aceitaria a homossexualidade. “O rap é muito masculino”, disse Snoop Dog.

“Fui aos EUA pra entender, a partir de uma perspectiva brasileira, o que era o queer rap. Dali nasceu meu primeiro EP, Modo Diverso”, afirma Rico. Depois dele, a cena queer rap nacional cresceu. Surgiram Siamese, em Curitiba; Bruna BG, em Belém e Enme Paixão, no Maranhão. Em Salvador, Di Cerqueira e Hiran são exemplos. 

“O queer rap brasileiro tá se estruturando, tá em fundação. E tem influência de outros ritmos que não são o rap. No Brasil, é rap com brega funk, com piseiro, com pagodinho de São Paulo. E aí vai virando outra coisa”.