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Samba reggae e pedido de paz marcam saída de blocos afros no Campo Grande


 

Olodum, Cortejo Afro e outros nomes transformaram a Avenida em um tapete branco

  • Yasmin Garrido

Publicado em 01/03/2019 às 21:04:00
Atualizado em 19/04/2023 às 12:36:05
. Crédito: Yasmin Garrido/CORREIO

Quem diz que Carnaval é só axé e pagode está muito enganado. A sexta-feira (1º), segundo dia oficial do Carnaval de Salvador, arrastou uma multidão vestida de branco no Circuito Osmar, o Campo Grande, e marcou os desfiles dos blocos afro. 

E é ano de comemorações. O Olodum, nascido em 1979 no Pelourinho para celebrar a herança cultural africana e estimular a autoestima e orgulho de ser afrodescendente, comemora, em 2019, 40 anos de história. E o tema escolhido para o desfile desta sexta-feira (1) foi uma homenagem a Oxalá, que reúne todas as divindades.

Com o tema “As Duas Histórias: O Perfume das Rosas – Olodum 40 Anos”, o bloco perfumou a avenida e representou um pedido de paz na luta contra a intolerância religiosa. Todos estavam usando trajes brancos e espalhavam, de fato, o perfume de rosas ao longo do percurso.

Outra novidade fica a cargo do repertório, já que, neste Carnaval, o bloco afro traz novas canções, a exemplo de Minha Tez, Saladino e Olodum Made In Pelô. No entanto, quem estava esperando ouvir os clássicos, não saiu decepcionado. Teve Requebra (sucesso de 1994), Faraó, Alegria Geral, Vem Meu Amor, Protesto Olodum e outros tantos hits que fazem parte da história da banda.

ACOMPANHE TODAS AS NOTÍCIAS DO CARNAVAL CORREIO FOLIA 2019 (Foto: Yasmin Garrido/ CORREIO) Para o presidente do bloco, João Jorge, “o Olodum é a expressão da cultura negra, da mudança de um povo. E o pedido de paz é, mais do que nunca, uma necessidade em nossa sociedade”. 

Ainda segundo João Jorge, a escolha do tema, que contou desde a história do sultão egípcio Saladino (1138/1193), apesar de não fugir do tom político do bloco, traz para a música a aura da humanidade”. O presidente do Olodum comentou também sobre a dificuldade de patrocínio que enfrenta os blocos afros.

Rainha do bloco Olodum desde 2003, Negra Jhô estava segurando uma rosa vermelha como adereço e usando um turbante ornamentado de flores. Para ela, representar a cultura afro e os batuques do afro reggae é uma emoção indescritível. "É manter viva uma tradição que já sobrevive há 40 anos". Negra Jho é rainha do Olodum desde  2003 e está acompanhada dos filhos Afro Jhow, artista residente na Suíça, e Kayo Aloha, que é músico percussionista (Foto: Yasmin Garrido/ CORREIO) E Negra Jhô não estava sozinha. Neste ano, ela desfilou acompanhada dos filhos, que estavam comandando a percussão do chão. Afro Jhow, que é artista e mora na Suíça, e Kaio Apoia, músico percussionista, desejaram boa sorte à mãe antes da saída do trio no Circuito Osmar. 

Como 40 anos não são 40 dias, o Olodum reuniu nesta sexta-feira (1) uma multidão heterogênea. Fãs de todas as idades acompanharam o bloco pela Avenida. Dona Marli Souza, 63 anos, era uma das mais animadas do bloco. Ela esperou ansiosa pela saída dos tambores e não conteve a emoção. "Meu sangue pulsa com esse batuque. É algo que eu não consigo descrever", contou. Ao lado dela estava a neta, de apenas 16 anos, mostrando que o samba reggae não tem idade. "Sempre acompanhei o Olodum por influência de minha avó, mas é a primeira vez que vou atrás do bloco", disse Liane Souza Alves.

Ex-vocalista do Olodum e participante do Projeto desde que tinha 9 anos, Lucas Di Fiori faz parte de mais da metade da história do Bloco. De volta em 2019, ele confessou que, apesar da felicidade por ver a proporção do desfile do Olodum, fica triste com a falta de investimentos em grupos menores que representam a cultura afro. "O mundo reconhece e abraça o Olodum. Já estivermos em 38 países e a expectativa é que, até o final do ano, a gente feche 40 destinos, levando o som do tambor para todos", disse.

No entanto, para Lucas, "o ideal era que nosso povo, nossa Bahia, também valorizasse os blocos afro e nossa cultura".Primeira maestrina do Olodum, Andreia Reis, também não escondeu a emoção antes do desfile. "É muita luta, muita resistência", confessou. 

Neste ano, o desfile do Olodum é patrocinado pela Prefeitura de Salvador e o bloco vai participar dos próximos dias da folia, com desfile neste domingo (3) no Circuito Dodô, às 15h, e na terça de Carnaval (5), o bloco sai no Campo Grande, sem cordas, às 17h. (Foto: Yasmin Garrido/ CORREIO) Lucas Di Fiori (Foto: Yasmin Garrido/ CORREIO) Mãe Santinha de Oyá Nascido dentro do limites do terreiro Ilê Axé Oyá, comandado por Mãe Santinha, em 1998, no bairro de Pirajá, o Cortejo Afro levou para a avenida sombreiros, enfeites e muita dança que remete à cultura africana. 

E, nesta sexta-feira (1), não poderia ser diferente. Como em todo desfile, o bloco, que marcou presença no Circuito Osmar, reafirmou a importância do respeito à cultura negra na Bahia. Com o tema “Porque Oxalá Usa Ekodidé”, o Cortejo fez o percurso levando uma mensagem de paz e tolerância.

"Esse é um momento emblemático para o Cortejo Afro, porque são 21 anos de Avenida. E o desfile de hoje não poderia cair em dia da semana melhor. Sexta-feira, dia de Oxalá, representa a paz e a gente quer levar esse sentimento por todo o percurso, porque estamos precisando muito", disse Veko Araújo, um dos integrantes do Cortejo Afro.

De acordo com ele, o tema deste ano tem uma relação com a mulher. "Ekodidé é a pena vermelha que usamos na cabeça, símbolo da mulher, da menstruação", explicou Veko.

Um grupo de amigos de Salvador acompanhou o desfile do Cortejo Afro, que, neste ano, homenageia Oxalá. Todos de branco, como manda a tradição. Ana Maria Dos Santos, Dina Silva, Natanael Pereira, Antônia Ribeiro, Marília Lopo, Carla Costa, Silvana Barros e Maria Cristina Costa seguem o bloco há 10 anos.

As amigas Bel Cica, Marcilene Ferreira e Clarice Machado acompanham o Cortejo Afro há muitos anos e fizeram a concentração no Corredor da Vitória à espera da saída do trio. Vestidas de branco e com o traje oficial do bloco, elas disseram que "a sexta na Bahia é assim, de muita paz". Vestidas de branco e com o traje oficial do bloco, as amigas disseram que "a sexta na Bahia é assim, de muita paz" (Foto: Yasmin Garrido/CORREIO) À frente há 17 anos do Grupo Cultural da Terceira Idade, que reúne idosos entre 60 e 90 anos, Silvia Rita de Cerqueira estava orgulhosa ao lado das alunas, já posicionadas para o início do desfile do Cortejo Afro. "A mais velha tem 90 anos e a gente acompanha o bloco com muita dança e Ijexá, representando a ancestralidade da cultura afro", disse.

Com a união de dança, música e artes visuais em um mesmo espetáculo, os foliões acompanharam o bloco pela avenida, que este ano, foi idealizado pelo artista plástico Alberto Pitta, que há mais de 30 anos desenvolve trabalhos ligados à estética e cultura africana. Para ele, a intenção foi resgatar as cores, sons e ritmos do carnaval.

O Cortejo está só começando a participação no Carnaval 2019. O bloco desfila também domingo (3) e segunda-feira (4) no Circuito Dodô - Barra/Ondina.

Quem não gosta de samba? Além do desfile dos blocos afro, a sexta-feira (1) no Campo Grande foi palco de muito samba. Atrás do Olodum saiu o bloco Filhos de Marujo, com o bom é velho samba. Homens e mulheres usavam chapéu, representando o ideal do sambista. 

E quem disse que família não vem junto para o Carnaval? Esse grupo reuniu todas as gerações, até às crianças. Todo mundo empolgado para sambar na Avenida. Claro que a cerveja não poderia faltar. "É bom que refresca", disse uma das sambistas.

Além dos Filhos de Marujo, o Campo Grande sacudiu com o trio Samba Popular, que juntou Fundo de Quintal, A Grande Família, Samba Trator, Pagodêa e Samba dos Amigos L8. O Circuito Osmar ficou pequeno para tanto pandeiro e coreografias.

*Sob orientação do editor Geraldo Bastos