São Paulo x Vitória e as certezas de Dia dos Namorados

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  • Gabriel Galo

Publicado em 13 de junho de 2018 às 13:12

- Atualizado há um ano

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Até onde a gente vai por amor? O que você faria pela pessoa amada? Por amor, somos capazes de mover mundos e fundos, atravessar mares e montanhas, cruzar desertos escaldantes e geleiras congelantes… Mas tudo, claro, tem limite. O limite, no caso, era a proposta oferecida à minha esposa: “Amor, eu sei que é Dia dos Namorados… Mas hoje tem jogo do Vitória no Morumbi, e…”

Havia, claro, recheios de sobrenatural nesta infame pergunta. Chovia no árido outono paulistano. O horário da partida era desagradável sobremaneira, começando tarde, acabando amanhã. Além do que, se há certezas nesta vida, pagar impostos e a morte entre elas, está a de que o Vitória perde do São Paulo quando sai de Salvador. Mais a mais, somando tudo, confesso: o pacote não era um programa de Dia dos Namorados sonhado pela digníssima.

Possuído de esperança, incorporando Marisa Monte em “Bem que se quis”, o quê que a gente não faz por amor? Apelei: “Mas você é são-paulina”! Ouvi: “mas não sou maluca”. Assim, seco, na lata. Aparentemente, Marisa, tem uma resposta aí, e é ir ao Morumbi numa terça-feira às 21h30 debaixo de chuva para ver o seu time perder.

Atencioso que sou, montei mesa e preparei o cardápio. Velas espalhadas pela casa – "mim julguem" -, Dia dos Namorados é dia de dar vida a todos os clichês possíveis. Na vitrola, Barry White acalenta os poros, acelerando batimentos, fluxo sanguíneo e respiração. (Atestem: Barry White é o maior afrodisíaco do planeta. Estimo que cerca de 975 milhões de seres humanos não teriam nascido sem ele). Abro um vinho tinto italiano que estava na promoção no mercadinho aqui do lado. Um luxo só!

Ela chega do trabalho. É recebida por um caloroso beijo. Ofereço uma massagem nos ombros depois de um longo dia de trabalho, prontamente aceita. Seu delicioso cheiro toma conta de minhas mãos, estou inebriado de paixão! Trago uma taça de vinho, bebericamos e, cúmplices, contamos como foi o dia.

Tilinta o forno apitando o jantar pronto. Sirvo e empreendemos nossas primeiras garfadas. Não é porque fui eu que fiz, acredite, está divino. Somos interrompidos na nossa celebração a dois pelo toque do alarme do celular. “Um minuto”, digo, me levantando. Ela é a cara da expectativa. Imagina surpresas, presentes, joias, aquela viagem!, será? Mas tudo que vê é eu ligando a televisão: “Vai começar o jogo.” Do céu ao chão no aperto de um botão.

Volto à mesa, e eu naquelas, um olho no peixe e outro no gato. Espia aqui, um ataque ali. Yago titular, Mancini? Pode isso, Arnaldo?

Nenê abre o placar, num golaço. Para o São Paulo, claro. Yago é expulso com requintes de crueldade, precisava daquilo, senhor seu juiz? Nenê faz o segundo ainda no primeiro tempo, depois Everton sacramenta o terceiro no segundo…

Neste instante, meus amigos, em verdade vos confesso, já tanto fazia como tanto fez. Emudeci a tela, Barry e seus graves sussurros de pé de orelha invadiram de novo o ambiente, arrepiando fios de cabelo até onde não há. A troca de olhares foi extinta. Agora fixo-me na companheira da vida, ali pertinho, cheia de amor (mas com limites). Ela sorri maliciosa. “Deixa comigo que eu dou um jeito nessa derrota aí”. Levanta me estendendo as mãos num “vamos” gestual, conduzindo-me pelo corredor da felicidade ao nosso ninho.

O amor, meus caros, nunca falha. É certo como o raiar do sol, tão certo quanto dois e dois são quatro. Assim como o Vitória perder do São Paulo no Morumbi. Isso nunca falha também.

Gabriel Galo é escritor. Texto originalmente publicado no site Papo de Galo.