'Soube daquela trágica notícia pela TV', relembra filho de Luis Eduardo Magalhães sobre morte do pai

Luis Eduardo Magalhães Filho é empresário e vice-presidente da Rede Bahia

Publicado em 21 de abril de 2018 às 10:54

- Atualizado há um ano

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A adolescência é uma fase decisiva na vida de todo ser humano. É ali que começam a ganhar forma, de maneira definitiva, os contornos do caráter da pessoa adulta. Por isso mesmo, é período de enorme sensibilidade, de muitos sentimentos contraditórios e conturbados e onde, mais do que nunca, a presença de uma família estruturada e o exemplo oferecido pelos pais são fatores decisivos, capazes de fazer com que a travessia desses tempos atribulados possa ser vencida com maior segurança e menor desgaste emocional.   Nessa fase da vida, sobretudo para os rapazes, a figura do pai ganha, muitas vezes, a dimensão de um ídolo, de um herói, sobretudo quando a relação entre os dois foi construída sobre a base sólida do carinho e da amizade. No meu caso, além da natural devoção filial, tinha ainda o privilégio e a honra de poder conviver e admirar de perto um dos grandes homens de seu tempo, Luis Eduardo Magalhães. E  isso me enchia de orgulho e entusiasmo.   Mas o destino pregou uma peça em minha vida, impedindo-me de seguir o processo normal de relacionamento entre um pai e um filho que mantinham uma relação estreita. Marcou irreversivelmente a minha existência e  de toda a minha família e acabou impondo enormes desafios afetivos, de maneira repentina e precoce, para todos nós.   O dia da morte de um pai é uma daquelas datas que, em qualquer momento da vida, ninguém é capaz de esquecer. Trata-se de um momento definidor, um marco divisório. Mas, no meu caso, ainda um menino em formação, o fato de estar na órbita de uma figura estelar como Luis Eduardo fez com  que recebesse a mais assustadora notícia de toda minha vida de uma forma que poucas, pouquíssimas pessoas, poderiam estar preparadas para receber.   Lembro-me muito bem dos detalhes daquele dia, 21 de abril de 1998, feriado nacional de Tiradentes, quando ouvi na televisão a inconfundível vinheta do plantão de notícias da Rede Globo. Na sequência, a informação: o  deputado Luis Eduardo Magalhães, meu pai, sofrera um infarto em Brasília após uma sessão de ginástica. Soube daquela trágica notícia juntamente com milhões de brasileiros.

Para a maioria absoluta dos telespectadores, aquela informação era apenas uma curiosidade, um tanto trágica, do noticiário político. Para minha família,  significava o desmoronamento das nossas bases, a iminente perda do nosso ente mais querido, nosso exemplo. Para mim, pessoalmente, a possível perda da minha maior referência. Às 20 horas, recebi a pior notícia de toda a minha vida: meu pai estava morto.   Somente quem desceu do abismo de uma perda tão profunda e tão precoce sabe o que ela significa. Palavras nunca serão capazes de descrever a tristeza de encarar num esquife um pai jovem com quem havia falado no dia anterior. Não há como dimensionar a angústia que vi tantas vezes, durante tanto tempo, nos olhos da minha mãe ou o sentimento de perplexidade ininterrupta na expressão de minhas irmãs ou ainda a sombra do desespero que marcou até o fim da vida as interações com meu saudoso avô Antonio Carlos Magalhães.   Porque Luis Eduardo, e tudo o que ele foi,  significa para nós, antes de tudo, um sentimento. Um sentimento de gratidão, pelo exemplo que ele nos legou. Um sentimento de perda profunda, pela forma precoce que fomos forçados a interromper nosso convívio. Um sentimento de saudade, por ser ele nosso pai. Um sentimento de honra, por nos sentirmos determinados a preservar o que ele significou.

Ao longo de toda sua vida e, sobretudo, depois da sua morte, sua dimensão maior sempre foi a imaterial, a transcendente, a intangível e, acima de tudo, a afetiva. Porque foi no sentimento do amor que se deu nosso convívio e foi em outro sentimento, o da dor, que se deu nosso afastamento. Mas sempre foi o sentimento, sempre ele, o fio condutor do nosso vínculo. E sempre será.   Após um trauma dessa dimensão, espero que pais e filhos não desperdicem nem um segundo. Que consigam transformar momentos ruins em bons ensinamentos. Que, em vez de divergir, amem desmedidamente, superem as adversidades e sejam felizes ininterruptamente. Em vida, ainda é possível desfrutar desses sentimentos. Não percam o célere e precioso tempo de vocês. Hoje, meu pai está morto e não tenho mais essa oportunidade.   Tragédias pessoais fazem parte da vida. Mas a vida nos reserva recompensas que somente a escala do tempo pode nos fazer perceber e aquilatar. Sim, perdi precocemente meu amado pai. Mas, nesses 20 anos, pude contar com o pilar sólido do amor da família que ele me legou. Na dor, minha mãe, Michelle, e minhas irmãs, Paula e Carolina, foram e são o esteio onde aprendemos a nos consolar e a consolidar a ligação que nos une e nos unirá até o fim dos nossos dias.

O homem público Luis Eduardo será lembrado pela história por muitas de suas virtudes. Meu pai nunca será esquecido por nós por ter nos amalgamado na família sólida e harmoniosa que ele sabiamente conseguiu construir como ser humano.   Nestes  20 anos,  muitas coisas mudaram. O Brasil mudou, a Bahia mudou, eu pessoalmente mudei. Luis Eduardo, um estadista, deputado constituinte, soube, ao seu tempo, exercer uma liderança política com sabedoria e sem limitações partidárias. Foi capaz de conviver com as diferenças e superá-las. Lutou pela estabilização da moeda e a concretização do plano real,  pois sabia da importância do país superar a hiperinflação.

Lutou pelas reformas que até hoje são pautadas diariamente na política nacional. Lutou pela valorização do poder legislativo a partir da produtividade, ao presidir a Câmara dos Deputados. Hoje, ao relembrar duas décadas sem o deputado Luis Eduardo,  me enche de orgulho saber que ele estava certo na sua maneira de enxergar o Brasil. Muitos dos seus ideais,  a história provou estarem certos. E seu exemplo de que é possível mudarmos para melhor serve de aprendizado a todos nós.

Me sinto privilegiado por ter sido concebido por um estadista, homem, pai, que tinha essa visão política, essa concepção de Brasil e da Bahia. Para mim, ele sempre será uma saudade e, sobretudo,  um exemplo. De homem, pai, cidadão e ser humano.