Sustentabilidade avança pouco?

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  • Da Redação

Publicado em 28 de março de 2019 às 16:55

- Atualizado há um ano

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Grandes companhias globais falam muito de sustentabilidade, mas o que fazem é por demais insuficiente, concluiu recente estudo feito no notável IMD (Lausanne). Menos de um terço das empresas analisadas mostraram alguma coerência entre discurso e prática, alerta o livro “Winning Sustainability Strategies” (Palgrave, 2019).

Entrevistados por Assis Moreira, os autores foram além: “a implementação de programas de sustentabilidade corporativa tem sido lenta e, na melhor das hipóteses, desleixada e ineficaz” (Valor, 18/03/19). Avaliação mais do que confirmada por Rodrigo Zeidan, ao dizer que a maioria dos relatórios de sustentabilidade é “só vento” ou “greenwashing” (Folha, 23/03/19).

Claro, nunca será excessivo denunciar tão irresponsáveis dissonâncias, especialmente em corporações que até chegam aos píncaros do “Dow Jones Sustainability Index” por estarem bem antenadas aos riscos de reputação. Mas seus relatórios constituem excelentes armas para os que deveriam pressioná-las mais. A experiência mostra que as melhores empresas mudam com rapidez surpreendente quando o público exige que tenham outro comportamento e, simultaneamente, recompensa as que o adotam e pune as demais.

Por isto, é imprescindível completar tais comparações estáticas entre retórica e realidade factual com avaliações sobre a evolução do comportamento corporativo, desde as pioneiras formulações sobre desenvolvimento sustentável, que engendraram a emergência de um novo valor. E até uma utopia voltada a garantir às futuras gerações, ao menos os parcos direitos humanos duramente conquistados ao longo dos últimos 75 anos.

Por dois decênios, a sustentabilidade foi tratada como mera perfumaria. Nem mereceu atenção a grandiosa “Agenda 21”, aprovada na Rio-92. Em vez dela, foram inventados os oito “ODM”, em 2002. Que tiveram excelente papel pedagógico junto a executivos do setor privado, agentes públicos e ativistas em geral, mesmo que muito precários no tocante à sustentabilidade.

Entre 2005 e 2013 uma forte confluência de fatos socioambientais e econômicos deu séria sacudida na mentalidade de lideranças da sociedade civil internacional e de representações  estatais em fóruns de governança global. Mais: o estratégico setor financeiro começou a despertar para as grandes incertezas ambientais no fim desse período (2012-2013), como deixa bem claro o livro “Moving the trillions”, organizado por Alfredo Sirkis em 2015: http://www.zeeli.pro.br/4915 .

Esse início de conversão das finanças internacionais certamente contribuiu para que se pudesse chegar, no final de 2015, à dobradinha de promissores consensos globais em vigor. Os dezessete “ODS” da “Agenda 2030” foram adotados pela Assembleia Geral da ONU apenas 78 dias antes do “histórico” Acordo de Paris. E, só agora, fica-se sabendo que os “bancos terão ‘régua’ para risco climático no crédito”, pois o Financial Stability Board (FSB) quer o setor preparado “para não ter uma crise sistêmica em função do clima como foi a de 2008” (Daniela Chiaretti, Valor 19/03/19).

Inevitável que se ache exasperador tamanho contraste entre a lentidão com que brotam estes arranjos institucionais e o sentido de urgência que tem prevalecido em quase todos os trabalhos científicos e relatórios oficiais sobre clima, biodiversidade e oceanos. Mesmo assim, faz muito pouco sentido minimizar os avanços da sustentabilidade, por mais que possam se mostrar  incapazes de impedir o comprometimento irreversível da biosfera, já neste início do Antropoceno (tema de vários textos neste espaço desde 22/12/16).

O que avançou ainda menos nas últimas três ou quatro décadas foi a ambiciosa Ciência do Sistema Terra, colossal esforço transdisciplinar, cujo principal objetivo é entender e explicar as interações de quatro dinâmicas bem distintas: a dos 4,5 bilhões de anos do planeta propriamente dito; a dos 3,8 bilhões de anos da vida em geral; a dos poucos milhões de anos da “breve história da humanidade” (subtítulo do mega best-seller “Sapiens”, de Yuval Harari); e a dos ínfimos milênios de processo civilizador.

Três grandes hipóteses orientam os pesquisadores voltados a tamanho desafio: a popular Gaia, a quase ignorada Medeia e a de “caminho do meio” entre as duas lógicas, na esperança de que se nutram uma da outra, completando-se ao mesmo tempo que se opõem. É exatamente com o intuito de esmiuçar as dificuldades desta vastíssima empreitada que a Editora 34 acaba de publicar o livro “O Antropoceno e a Ciência do Sistema Terra”.

Em São Paulo, o lançamento foi nesta quinta (28), às 10 horas, no auditório da Unibes-Cultural, em conversa com Lia Diskin, líder da Associação Palas Athena, e Paulina Chamorro, animadora do programa “Vozes do Planeta”, da Rádio Vozes. Em solo carioca, será no Museu do Amanhã, terça, 16 de abril, às 17 horas, em conversa com a jornalista Amélia Gonzalez, do blog “Natureza”, do G1; o economista Sergio Besserman Vianna, presidente do Instituto de Pesquisas do Jardim Botânico; e o geógrafo, deputado estadual e ex-ministro Carlos Minc.José Eli da Veiga é professor sênior do IEE/USP (Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo) e autor de O Antropoceno e a Ciência do Sistema Terra (Editora 34, 2019). Mantém dois sites: www.zeeli.pro.br e www.sustentaculos.pro.br

Artigo publicado originalmente no jornal Valor Econômico, edição de 27 de março de 2019.