Terreiro de candomblé é invadido em Cachoeira e MP faz recomendações

Segundo as lideranças da casa, uma empresa está reclamando a posse do terreno

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  • Da Redação

Publicado em 1 de março de 2019 às 19:41

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Betto Jr/ CORREIO

O Terreiro Ilê Axé Icimimó Aganjú Didè, em Cachoeira, no Recôncavo da Bahia, foi invadido por homens armados nesta quinta-feira (28). O grupo fez ameaças ao pai e aos filhos de santo da Casa, entraram em locais sagrados e disseram que vão voltar com máquinas para derrubar os barracões.

O templo é reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial do Estado da Bahia desde 2015, junto com outros nove terreiros de candomblé, em Cachoeira e São Félix. Além disso, em 2012, teve início o processo de tombamento pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

Segundo os filhos de santo, os invasores são funcionários do Grupo Penha, empresa de derivados de celulose proprietária de uma fazenda que fica ao lado do terreiro. Desde o início desta semana, os empregados estariam circulando no entorno do terreiro e demarcando o território, que fica a 6 km do centro de Cachoeira, na zona rural da cidade.

A filha de santo Roberta Nascimento, 38 anos, contou que entrou em contato com a empresa e foi informada, por telefone, que o Grupo Penha possui a propriedade do terreno desde 2005. “Mas isso não é possível, porque o terreiro foi criado em 1736 e temos a escritura da terra desde 1916. São 102 anos de escritura”.

Roberta contou que a ação mais agressiva aconteceu na quinta-feira. “Cinco homens armados entraram no terreiro e fizeram ameaças. Eles ficaram mais de 1h no terreno, foram em locais que nem os filhos de santo têm permissão para entrar e disseram que voltariam com máquinas para derrubar as estruturas, barracões com mais de 100 anos de história”.

Respostas Nesta sexta-feira (1º), o Ministério Público do Estado (MPE-BA) expediu uma recomendação para que o Grupo Penha não adentre o Terreiro e para que a Polícia Militar fique atenta ao caso. Isso porque um dos temores dos religiosos é que a empresa aproveite a diminuição do efetivo policial na cidade, por conta do Carnaval em Salvador, para cumprir as ameaças.

O documento é assinado pelo promotor de Justiça de Cachoeira, Savio Damasceno, e pela promotora de Justiça Lívia Vaz, coordenadora do Grupo de Atuação Especial de Proteção dos Direitos Humanos e de Combate à Discriminação (Gedhdis).

Em nota, o MP-BA informou também que o Terreiro possui prova da propriedade do imóvel e que é frequente a grilagem de terras na região do município de Cachoeira. O órgão frisou que, de forma recorrente, empresas privadas utilizam-se deste artifício para invadir áreas de matriz africana pertencentes aos terreiros de candomblé.

“Eles (promotores) recomendaram que o Grupo Penha se abstenha de adentrar o imóvel, especialmente munidos de ferramentas, maquinário, veículos, ou qualquer outro instrumento que venha a alterar, extrair, queimar, mutilar, modificar qualquer bem, local, recurso natural ou cultural, da fauna, flora ou hídrico, afeto ao Terreiro Ilê Axé Icimimó Aganjú Didè, até o fim do processo de tombamento do terreiro e sua demarcação territorial”, diz a nota.

Uma audiência está marcada para a próxima semana, no Ministério Público, em Cachoeira. A objetivo é discutir a questão.

A Secretaria de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi) também está acompanhando o caso. As lideranças do terreiro foram ouvidas, por telefone, e uma visita técnica está marcada para depois do Carnaval.  

O CORREIO não conseguiu contato com o Grupo Penha.