Travesti prostituta de luxo fala da vida de “Patrícia” na Europa

Cibele conta detalhes da profissão, episódios de sua vida pessoal e curiosidades sobre sexo, sexualidade e gênero

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  • Da Redação

Publicado em 30 de abril de 2014 às 07:31

- Atualizado há um ano

Cibele Patrícia* é uma jovem travesti prostituta de 26 anos. O nome fictício foi escolhido pela própria entrevistada que disse que as amigas a reconheceriam pelo vulgo “Patrícia”. Natural de Salvador, do bairro do Nordeste de Amaralina, Cibele mora há dois meses na Itália. No dia da entrevista ela estava em Saluzzo, província de Cuneo, na região de Piemonte, norte do país. Ela conta que costuma passar 20 dias em cada cidade e assim viaja boa parte da Europa. Sua morada fixa, onde guarda suas coisas e raramente tira folga para descansar, é Milão, segunda maior cidade e centro comercial da Itália.

Ela conta que durante um período em que trabalhou em Belo Horizonte (MG), chegava a ganhar R$ 8 mil reais por mês prestando serviços sexuais. Nesta nova fase no Velho Mundo, os negócios andam ainda mais promissores. “Já ganhei um cheque de um cliente uma vez de €10 mil euros. Já estive com “mariconas” que me levavam pra passear de Ferrari, me chamavam para grandes coberturas de luxo. Mas teve uma vez que superou tudo, nunca pensei que um cliente meu fosse sair da Europa pra me visitar em Salvador”, revela. Ostentação faz parte da composição estética das travestis. Foto: Arquivo pessoal Cibele PatríciaNa entrevista ao Trabalho Com Sexo, a baiana garante que sempre usa preservativo, “tem muita bicha morrendo por aí, não quero isso pra mim”. Ela também diz que organiza bem as finanças e tem planos para o futuro. “Vou casar um dia, ter um bofe e só transar com ele”, afirma.Correio de Futuro: Essa é a primeira vez que você vai trabalhar na Europa?

Cibele Patrícia: A segunda. Da primeira vez passei quatro anos e fui deportada.Correio: Como aconteceu?

CP: Eu estava aqui mesmo na Itália. Eles têm uma regra para estrangeiros: três delitos e eles te deportam. Eu morava em uma casa com outras garotas, nós atendíamos lá e alguém denunciou o local como ponto de prostituição. A polícia chegou e levou todo mundo pra delegacia, me ficharam e fui liberada. Eu estava na Itália há um mês. Da segunda vez havia um ano que eu estava aqui. Era noite e eu passeava na rua. O caso é que eu só ando assim, chamando atenção [Cibele me mostra o decote avantajado, segundo ela os seios mais caros que o dinheiro pode comprar], a viatura passou e me abordou pedindo os documentos. Pelo meu perfil percebem logo que não sou daqui. Eu questionei: por que os documentos? “Porque você está neste lugar, nesta hora, no momento que estamos passando”, é assim que eles falam.Correio: E por que você estava sem documento? Onde estava seu passaporte?

CP: Em casa. A gente aqui não tem costume de sair com documento porque como a gente é ilegal, a primeira coisa que eles fazem quando veem seu passaporte é te levar presa e te deportar. Me ficharam mais uma vez mas não me levaram pra delegacia. Da terceira vez eu estava na rua indo trabalhar e tava fumando um baseado, os “alibã” (polícia no dialeto LGBTT) se aproximaram e eu não percebi, quando vi estavam perto e me mandaram parar. Fingi que não era comigo, corri e não teve salto alto certo. Fiquei 26 dias presa e vim parar no Brasil. Era a terceira vez que eu estava sendo fichada. Nestes quatro anos além da Itália, trabalhei também na França, Inglaterra e Suíça.Correio: É comum deportarem as prostitutas?

CP: O quê!? Pegam a gente na rua e mandam embora como um saco de lixo. Quem não tem um namorado importante, com dinheiro, que ajude com a polícia, é mandada embora com a roupa do corpo. Tanta trava que constrói a vida e não tem direito de levar nada.Correio: Sua família sabe com o que você trabalha?

CP: Finge que não, mas é com o dinheiro do meu trabalho que eles vivem melhor e disso eles gostam. Eu tenho um sobrinho de 12 anos que crio como filho com o dinheiro da prostituição desde que ele tinha 8 meses. Os pais do menino são irresponsáveis, quem sempre cuidou dele foi eu e minha mãe. Pago colégio particular, escola de futebol, roupa que ele gosta, merenda escolar, tudo de melhor que eu posso dar a ele eu dou.Correio: Qual seu grau de escolaridade?

CP: Agora é a hora que você se surpreende: Terminei o ensino médio e graduei em Administração. Além disso sou cabeleira e maquiadora formada.Sem que eu pergunte Cibele deixa claro que o negócio tem sido promissor, “eu sou p* de elite, sou Patrícia”. Ela se adianta e me diz que mesmo indo bem nos negócios a aposentadoria deve vir em breve:

CP: Vou parar aos 30 anos. Não tenho vergonha nenhuma do que faço, foi com isso que melhorei a minha vida e a da minha família, mas eu não quero passar a vida toda, desculpe a expressão, “chupando p.e dando o c.”.Correio: Quando e onde começou a se prostituir?

CP: Comecei aos 17. Tem dez anos. Aí mesmo em Salvador, na Manuel Dias, conhece? [A Avenida Manuel Dias da Silva, no bairro da Pituba, tem pontos tradicionais de prostituição. Nos últimos anos os pontos ocupados pelas travestis são mais numerosos que os de prostitutas mulheres].CP: Quando eu comecei eu era um menino, sem peito, bunda, mega – eu usava peruca, alta, pezão. E foi justamente por isso que resolvi embarcar, eu queria me plastificar.

Correio: E as mudanças físicas? Quantas cirurgias você fez?CP: Eu fiz peito, nariz, boca, queixo, testa e bunda. Ao todo foram cinco cirurgias. Pretendo fazer mais algumas.

Correio: E o pênis, você quer tirar? As transexuais costumam ser mais bem sucedidas nesta área de trabalho?CP: Tinha vontade, mas desisti. Uma trava ou trans nunca vai passar por mulher, pode ser a mais perfeita que ainda assim alguma coisa de menino vai denunciar no corpo e muitos homens gostam é disso mesmo. Sem contar que tenho várias amigas que fizeram a cirurgia e ficaram doidas. E ainda para o trabalho ter “p.” é bom, uma possibilidade a mais.

Correio: Você me disse que já se prostituiu em Salvador, Belo Horizonte, diversas cidades da França, Itália, Espanha e Suíça. Qual a diferença das condições de trabalho nos lugares que você passou?CP: O valor do programa no Brasil é R$ 50,00 no carro e R$ 100,00 no motel, qualquer estado. Eu sou uma das travas mais desejadas do Site Elite Club, o mais famoso em Salvador. Mas o diferencial não é quanto se ganha por programa e sim quantos programas se faz em uma noite

Correio: Quanto você costumava tirar por noite em Salvador?CP: Mil, R$ 800,00, R$ 600,00. Quando a gente volta pra casa com R$ 300,00 na bolsa é uma noite de penação.

Correio: Quantos programas por noite você costumava fazer aqui no Brasil?CP: Já consegui fazer 25 programas numa noite em Salvador. Em Minas Gerais tem um “puteiro”, um “motelzinho barriado”, lugar sujo. Foi lá que eu passei a pior fase da minha vida. Para eu juntar dinheiro e vir para Europa fiquei um mês dentro desse lugar. Eu precisava juntar R$ 10 mil reais, o preço da passagem. Ganhava entre R$ 20,00 e R$50,00 por programa, trabalhava das 9h da manhã às 4h da tarde pegando homem sujo. Não sei nem quero lembrar quantos programas fazia nesta época, mas era bastante. Só com o objetivo na cabeça “vou fazer minha passagem”. Eu era estrela e de repente precisei parar no vintão (programa a R$ 20,00 reais). E olha que normalmente em lugares que pra transar com mulher é vinte, pra travesti é cinquenta. Fiz muito a vinte porque queria tá aqui hoje.Cibele Patrícia na antiga república para prostitutas, em Belo Horizonte. Foto: Arquivo pessoal

Correio: Por que o programa das travestis é mais caro? Os homens pagam às travestis por que querem ser penetrados?CP: Não necessariamente. Tem muito homem que paga e é só pra ser ativo. Homem que dá “c.” costuma pagar melhor, mas a maioria que vem fazer programa com a gente vem porque tá atrás de uma beleza diferente, independente de ser ativo ou passivo.

Correio: E por que você foi pra Minas Gerais?CP: Melhorar a vida né, amiga. Salvador já não dava muito dinheiro. Eu tinha muitas amigas da Bahia que trabalhavam em BH. Em Salvador valoriza-se mais as loiras, eu já estava lá há quase três anos, esse mercado gosta de novidades, você vira figurinha repetida rápido. Quando cheguei em Minas eu era Cibele Patrícia, a morena da Bahia. Neste tempo cheguei a fazer R$ 8 mil reais por mês.

Correio: E esses sites que anunciam os serviços das prostitutas, quais os custos?CP: É uma média de R$ 500,00 a mensalidade, tanto em Salvador quanto em BH. Acho que é assim no Brasil todo. Estamos a mais ou menos 1h e meia de entrevista. O telefone dela toca pela quinta vez. Cibele atende a ligação. É mais um cliente. Eles marcam um horário e ela retorna. Comento a respeito e ela responde imponente:CP: Eu sou conhecida, irmã. Além de anunciar nestes sites de prostituição tenho um site pessoal. Já fiz filme pornô na Suíça, o filme tá no meu site. Tenho vários books lá também, de três em três mêses publico fotos novas.Catedral em Milão. A cidade recebe prostitutas do mundo inteiro que aspiram sucesso profissional. Foto: Reprodução

Correio: E aí na Europa, me fale a respeito. Por semana quanto você chega a ganhar?CP: Prefiro não comentar (risos). Mas é muito melhor por causa da moeda, € 1,00  vale R$ 3,00 reais, amiga. Ganhar em euro é coisa de Patrícia!Insisto, tento convencer Cibele a falar, ela brinca, enrola e não fala. Pergunto quanto custa o programa:CP: €100,00 euros.Correio: E o idioma? Você sabe falar italiano?CP: Sei. Aprendi no giro com os “homi” da outra vez que morei aqui.

Correio: Para finalizar, Cibele, o que já aconteceu nestes dez anos de profissão que te surpreendeu de tão bom?CP: Já ganhei um cheque de um cliente uma vez de €10 mil euros. Já estive com “mariconas” que me levavam pra passear de Ferrari, me chamavam para grandes coberturas de luxo. Mas teve uma vez que superou tudo, nunca pensei que um cliente meu fosse sair da Europa pra me visitar em Salvador. Ele levou meu perfume predileto e o último modelo de bolsa da marca que eu gosto. O bofe tirou férias e foi passar um mês de namoradinho comigo no Brasil, eu nem sabia. Ele alugou um chalezinho em Itapuã, organizou tudo pra ir a Salvador e não me avisou. Quando ele me ligou dizendo o horário que estaria no aeroporto para eu ir buscá-lo, eu não acreditei. Quando vi o bofe no desembarque eu me tremi toda, fiquei gelada, ele me tascou um beijo na boca e me disse que ficaria um mês e que eu ficaria com ele. Eu disse “mas eu tenho contas a pagar”, ele me disse “a gente resolve”. (muitas risadas)