Ufba reforça segurança após ameaça de morte a professora; grupo protesta na Federação

Educadores e servidores fazem ato na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas

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  • Nilson Marinho

Publicado em 22 de novembro de 2017 às 12:01

- Atualizado há um ano

. Crédito: Mauro Akin NAssor/CORREIO

Após receber ameaças de morte por conta de projeto de pesquisas de gênero, uma professora da Universidade Federal da Bahia (Ufba) está dando aula com vigilância reforçada. A informação foi divulgada pela reitoria nesta quarta-feira (22). "A instituição tem tomado todas as providências para garantir a segurança dos envolvidos e a realização dos eventos científicos, aumentando, inclusive, a segurança nos locais em que a professora ministra aulas", destacou a Ufba, em nota.

O fato veio a conhecimento público depois que o reitor João Carlos Salles, que é presidente do Conselho Universitário (Consuni) da Ufba, afirmar que a educadora estava sendo ameaçada de morte.

Na manhã desta quarta, um grupo formado por aproximadamente 80 professores, servidores e alunos realiza um ato de solidariedade em favor da docente no Centro de Estudos e Pesquisas em Humanidades (CRH) da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Ufba, na Federação.

A professora, que teve o nome preservado, recebeu as ameaças por desenvolver pesquisas relacionadas à divisão sexual do trabalho. Os ataques contra ela ocorrem há cerca de um mês. Além de lecionar, a vítima é pesquisadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (Neim), grupo de estudos sobre gênero e sexualidade vinculado à graduação de Ciências Sociais.

Representantes do Neim confirmaram ao CORREIO que a segurança nos locais onde a educadora leciona estão reforçadas há pelo menos uma semana.

O ato foi convocado pelo Neim e grupos de pesquisa Trabalho, Precarização e Resistências, História dos Partidos e Movimentos de Esquerda na Bahia e Representações Sociais: Arte, Ciência e Ideologia. O movimento também é em solidariedade ao docente André Mayer da Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), alvo de um inquérito movido pelo Ministério Público Federal (MPF) por coordenar a pesquisa Liga Comunista – Núcleo de Estudos Marxistas no âmbito da Ufop.  Comunidade acadêmica reunida no final da manhã na Faculdade de Filosofia, em São Lázaro (Foto: Nilson Marinho/CORREIO) "Estamos, portanto, em um debate que abrange para além da faculdade. Aqui tem sido foco dessa violência. Estamos aqui também para defender aquelas que também se sentem ameaçadas no exercício da sua profissão, da sua luta e das suas crenças", afirmou a diretora da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Maria Hilda Baqueiro Paraíso, que propôs ao Consuni uma moção de repúdio contra os ataques. A carta, assinada pelo reitor, foi aprovada e divulgada nesta segunda (20). Salles é presidente do conselho universitário. 

Ensino ameaçado Ao menos três professores da Ufba foram ameaçados - um deles de morte - por conta do teor de pesquisas que desenvolvem na instituição. Além dos docentes, uma aluna do mestrado também foi ameaçada dias antes de apresentar sua dissertação.“Em episódios recentes, verificamos ameaças de morte e outros tipos de violência contra uma de nossas docentes, pesquisadora do Neim; a tentativa de impedimento de defesa de uma dissertação de Mestrado de aluno do IHAC (Instituto de Humanidades, Artes e Ciências), tendo que solicitar a segurança da própria universidade; e a perseguição e ridicularização nas redes sociais de projetos de pesquisa e extensão que versam sobre essas temáticas”, afirmou Salles, em moção de repúdio às ameaças. Segundo Maíra Kubik Mano, uma das 15 pesquisadoras do Neim e escolhida como porta-voz do grupo, as mensagens de ameaça à professora vêm de diversos perfis em redes sociais. Mas ainda não se sabe quem estaria por trás delas. Por conta da situação, o núcleo pretende mover uma ação judicial contra os ataques que a professora vem sofrendo.

O caso está sendo acompanhado pela Procuradoria Federal junto à Ufba, que recomendou que a vítima preste queixa na Polícia Federal. Provas estão sendo reunidas para que possam ser levadas à polícia.

No dia 6, a Ufba precisou reforçar a segurança na porta de uma sala onde acontecia a defesa de uma dissertação de mestrado depois que a estudante que apresentava o trabalho foi ameaçada. O orientador do trabalho, professor Leandro Colling, contou que a pesquisa era sobre sexualidade e diversidade de gênero na educação infantil.“A dissertação foi apresentada sem problemas, mas tivemos que pedir reforço da segurança. Eu tive que explicar para as pessoas por que havia seguranças na porta”, contou.Colling criou e coordena o grupo de pesquisa Cultura e Sexualidade (CUS) da Ufba, que discute sexualidade e diversidade de gênero. Ele acredita que, nos últimos anos, houve um aumento da intolerância no país e que essas ações estão sendo potencializadas pela internet.

Outras ameaças A assessoria de comunicação do Sindicato dos Professores das Instituições Federais de Ensino Superior da Bahia (Apub) informou ao CORREIO que, durante uma assembleia com discentes, pelo menos três casos de ameaça contra professores foram identificados. Os educadores, ainda segundo a Apub, teriam relatado durante a reunião uma onda crescente de conservadorismo também dentro da instituição.

"Eles (professores) relataram um aumento de autoritarismo e da violência contra professores que estudam pautas relacionadas às questões de gênero e sexualidade. Todo tipo de violência acaba fazendo com que esses professores não tenham liberdade, não só para colocar seus pensamentos em sala de aula, mas, também, de desenvolver seus trabalhos acadêmicos”, explica Luciene Fernandes, presidente da Apub."Os professores estão sendo intimidados, não estão podendo levar suas pesquisas adiante", completa a dirigente.Levantamento de casos Um levantamento para identificar novos casos de ameaça e violência contra professores está sendo feito pela Apub.

Entre os casos já identificados pelo sindicato está o de duas professoras - incluindo o da pesquisadora do Neim. Um outro caso envolvendo um professor está sendo apurado.

"Estamos fazendo esse trabalho de pesquisa e recolhendo os depoimentos para, possivelmente, divulgar um documento da entidade sobre esta questão", informa a Apub.