Uma viagem de caiaque foi o primeiro furo da imprensa brasileira

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  • Nelson Cadena

Publicado em 14 de setembro de 2018 às 05:00

- Atualizado há um ano

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Em 16/6/1808, um grupo de 18 nativos de Olhão, município do Algarve, embarcou num caiaque com o objetivo de atravessar o oceano para levar a Dom João VI a boa nova da expulsão dos franceses da região, primeira baixa sofrida pelas tropas de Napoleão. O episódio não é referência histórica no Brasil, mas é lembrado pelos portugueses que todo ano comemoram o heroísmo dos nativos da cidade, uma epopeia e tanto, segundo os relatos de seus protagonistas e de autoridades da época, nos documentos hoje existentes na Biblioteca Nacional de Lisboa.

 E o que tem a ver essa viagem com os primórdios de nossa imprensa? Muito.

Foram esses homens que possibilitaram à Gazeta do Rio de Janeiro, nas suas edições de 24 e 28 de setembro do referido ano, publicar as primeiras reportagens (cabe aqui a palavra considerando o espírito da narrativa) sobre a retomada do território pátrio, já que o público alvo do jornal era o português aqui residente, pelas circunstâncias da diáspora, em decorrência da ocupação de seu país por tropas estrangeiras.

Quando os marítimos de Olhão partiram numa embarcação primitiva para uma odisseia no mar, queriam apenas levar e entregar a Dom João VI uma carta do Juiz da Alfândega de Faro narrando as circunstâncias da sublevação dos lusos e a expulsão dos franceses. Não sabiam eles que o Brasil já tinha imprensa e que esse documento e outros menos detalhados seriam a matéria-prima para Frei Tibúrcio, redator da Gazeta, informar aos leitores do jornal sobre o episódio. Foi, sem dúvida, o primeiro grande furo da imprensa brasileira, uma notícia de impacto que repercutiu em todos os lares da corte e sua comitiva no Rio de Janeiro. Um furo mais importante ainda que a “capitulação” dos franceses após o tratado de Cintra, noticiado pela Gazeta em dezembro/1808, esta sim uma notícia esperada, previsível por quem acompanhava, edição a edição, a retomada de cada cidade e território.

O jornal não apenas transcreveu as notícias como destacou o feito: “Armaram um caiaque por não terem outra embarcação para cumprir esse encargo, e é bem para admirar a afoiteza da equipagem que se arriscou até esse porto em tão pequeno e frágil barco. Os papéis que trouxeram foram apresentados no número precedente, menos a participação do Juiz da Alfândega que reservamos para o fim para mostrar de um só golpe de vista o epítome de todas as circunstâncias espalhadas pelas outras peças”.

Caiaque era uma embarcação primitiva à vela de dezoito metros de comprimento por cinco de largura, utilizada para pesca. As possibilidades de atravessar o oceano com sucesso eram mínimas. A história brasileira até hoje não se deu conta que o caiaque Bom Sucesso foi portador do primeiro grande furo da história de nossa imprensa. É claro que a notícia poderia ter sido enriquecida se os relatos dos pescadores fossem aproveitados, mas ouvir a plebe (marítimo costumava ser analfabeto e pobre) não era hábito dos regimes monárquicos naquele tempo. (Artigo de minha autoria, editado com modificações, publicado originalmente  no Portal Imprensa em 2010).