Vale das Pedrinhas tem reforço policial e comércio com pouco movimento

Nesta sexta-feira (29), mais um homem morreu em confronto com a polícia

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  • Thais Borges

Publicado em 30 de junho de 2018 às 18:00

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Arisson Marinho

“Quem que vai ficar na rua? Eles não querem nem saber se é ladrão, se é vagabundo. Vão meter a porrada”. O desabafo é de um comerciante do Vale das Pedrinhas que, na manhã deste sábado (30), tinha lojas de portas abertas e gente andando na rua. Tudo parecia normal. O problema, segundo ele, é que o movimento não poderia ser comparado a um dia comum. Era bem menor. 

O Vale das Pedrinhas e os outros bairros que compõem o Complexo do Nordeste de Amaralina (além do que dá nome, a Santa Cruz e a Chapada do Rio Vermelho) não têm vivido dias normais. Na quinta-feira (28), dois PMs foram baleados e, horas depois, três moradores – incluindo um taxista – foram mortos por homens encapuzados. 

No fim da tarde de sexta-feira (29), mais uma morte. Lucas Silva dos Santos, conhecido como 'Padaria', foi morto depois de ser atingido em uma troca de tiros com a polícia na localidade conhecida como Casinhas, no Vale das Pedrinhas. De acordo com a Secretaria da Segurança Pública (SSP), Lucas seria o autor dos tiros contra policiais militares no Nordeste de Amaralina na quinta-feira (28).

O comerciante do Vale, que, em um dia de bom movimento trabalharia até depois das 22h, já adiantava que pensava em fechar mais cedo.“O pessoal está com medo de sair na rua. Vai sair para quê? Eu não vou ficar aqui vendendo para as moscas”, contou.Uma mulher que trabalha na região contou a mesma coisa: mesmo com gente andando nas ruas e comércio funcionando, o clima era estranho.

Outro comerciante do Vale reclamou do baixo número de clientes. Para ele, porém, o motivo era a proximidade do feriado. Com o estabelecimento funcionando desde 6h, negou que soubesse da morte do dia anterior. “Tudo está tranquilo”, limitou-se a dizer.  Mesmo com reforço de policiamento, clima continua tenso no Vale das Pedrinhas Já o motorista Carlos José, 62 anos, contou que viu aumentar o número de policiais e viaturas na região do Areal. O movimento, portanto, era de policiais. Mesmo assim, revelou não estar apreensivo com a situação no bairro. “A galera já me conhece. Saio de casa todos os dias às 5h para trabalhar e não tenho problema nenhum. Ninguém me 'bole'”. 

No Nordeste Na rua principal do Nordeste de Amaralina, o comércio também funcionava normalmente na manhã deste sábado. E, para muita gente, as coisas estavam mais tranquilas do que em outros trechos da região. “Cheguei hoje de férias para trabalhar, mas moro por aqui também e está tudo normal. Aqui, na principal, não tem problema nenhum”, contou o funcionário de uma loja.

O discurso era o mesmo do motorista de ônibus João Paulo Santana, 47. Rodoviário há 17 anos, ele roda no Nordeste de Amaralina há quatro. Morador de Castelo Branco, diz que o Nordeste é o melhor lugar para trabalhar. 

Mesmo assim, disse que ‘não sabia de nada’ sobre as mortes que aconteceram na última semana. “Mas aqui está tudo tranquilo. Você não vê ninguém correndo. Só viatura passando de um lado para o outro, mas não tem apreensão”. 

A vendedora Tatiane Ramos, 30, por sua vez, preferia não se arriscar. Embora considerasse que o clima estava calmo na região, ela diz que prefere não sair de casa depois das 22h. “A gente sempre escuta algumas coisas lá que acontecem lá embaixo, mas aqui está normal. Só que a gente não deixa de ficar apreensiva porque, se tem mais polícia por aqui, é porque a violência está maior”, lamenta. 

Logo cedo, a aposentada Davina Santos, 69, já tinha visto quatro viaturas. “Três passaram para lá e uma para cá”, apontou. Moradora do Nordeste há 39 anos, ela também conta que está fora da região mais complicada. “Realmente, lá embaixo é difícil. Mas meus pais sempre moraram aqui, não tenho nem o que dizer (de ruim)”.

Procurada pelo CORREIO no início da manhã, a Polícia Militar não respondeu os questionamentos sobre o andamento da operação no bairro até a publicação da reportagem. 

Val Bandeira: solto e ameaçado Em entrevista ao CORREIO na sexta-feira, o delegado Deraldo Damasceno, titular da 28ª Delegacia (Nordeste de Amaralina), afirmou que o ataque aos policiais foi uma emboscada, provavelmente feita por bandidos ligados à facção criminosa Comando da Paz (CP), fundada por Val Bandeira.

Considerado pela polícia como um dos maiores traficantes do estado, Val foi solto após receber liberdade condicional da Justiça na manhã de terça (26). Ele foi condenado por crimes como homicídio, tráfico de drogas e associação ao tráfico.

Na quinta, segundo apurou o CORREIO, a casa onde o traficante mora, na Sucupira, localidade do bairro da Santa Cruz, foi arrombada por homens encapuzados e vestidos de preto. Uma fonte ligada à família contou que o grupo derramou combustível no sofá da residência e ameaçou tocar fogo no imóvel, caso o traficante não aparecesse. 

No momento da ação, só estavam na casa a mulher de Val, que é pastora de uma igreja evangélica, os quatro filhos do casal e uma outra moça. Fora a esposa, todas as pessoas tinham idade entre 2 e 16 anos. A casa foi revirada e dinheiro - pouco mais R$ 1 mil - e bijuterias foram levados, mas a busca era por Val.“Disseram que iam matar um (familiar) por dia até ele aparecer”, contou a fonte ao CORREIO.O traficante não estava em casa na hora do ataque. Apesar da ameaça, a família ainda não havia registrado a queixa na polícia.

Apesar de negar que ainda continue comandando do tráfico de drogas na região, a liberação de Val Bandeira foi comemorada com fogos por parte da comunidade. Assista.