Vestidos para votar: bolsonaristas e petistas marcam território na ida às urnas

Eleitores usam vestimenta para influenciar indecisos ou virar votos no último instante

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  • Alexandre Lyrio

Publicado em 28 de outubro de 2018 às 18:37

- Atualizado há um ano

. Crédito: Fotos: Almiro Lopes/CORREIO
. por Foto: Betto Jr./CORREIO

"De que lado você samba?”, pergunta o pernambucano Chico Science. Em uma eleição polarizada como a nossa, essa resposta ficou clara para boa parte das pessoas que se dirigiu às zonas eleitorais de Salvador. Ainda que a maioria tenha feito de forma pessoal, como exige a legislação, as manifestações pró Jair Bolsonaro e Fernando Haddad tomaram as seções com a intenção de marcar posição para um ou para outro.     

No cardápio de camisetas, por exemplo, as mais diversas formas de influenciar o eleitor aos 45 do segundo tempo. Os símbolos e personagens se antagonizavam: de um lado Frida Kahlo, Lula, Che Guevara, Raul Seixas, Nelson Mandela, Dilma Roussef, muitas estrelas de cinco pontas e o 13 do PT. Do outro, camisas de Neymar e da CBF, o símbolo da república estilizado, camuflagens do exército e o B17 em verde e amarelo.

No caso do administrador de empresas Marcelo Tavares, 38 anos, Bolsonaro virou o craque da sua seleção. Ele usava uma blusa amarela personalizada com o nome do presidenciável e o número 17. Para ele, claro, titular do Planalto. “A gente se veste para se identificar, mostrar que o candidato tem força”, disse Marcelo, que ainda fazia um trabalho voluntário. “Estou aqui como fiscal do processo eleitoral. De olho para ver se alguém faz boca de urna”, explicou. O administrador Marcelo Tavares com o nome e número do candidato nas costas (Foto: Almiro Lopes/CORREIO) Bastava olhar em volta para perceber que os territórios estavam, de certa forma, delimitados. Nos bairros mais abastados, prevalecia o verde e amarelo pró Jair Bolsonaro. Nos demais, os pró Haddad de vermelho eram maioria. Mas, essas fronteiras não eram tão rígidas. Na Associação Atlética da Bahia, na Barra, a estudante de psicologia Maria Isabel Portugal, 22 anos, dizia ocupar espaço em um território que seria minoria.

“Saí vestida assim principalmente para marcar posição. Sei que essa área é de maioria contrária. Aqui sou resistência”, disse Maria Isabel, que até conversou com algumas pessoas para “virar” o voto. “Conversei bastante com o Uber”, riu. Mas, seria possível influenciar alguém no último momento da votação? Qual o efeito de uma “praguinha” colada ao corpo? A universitária Maria Isabel Portugal usou uma camiseta contra o candidato adversário (Foto: Almiro Lopes/CORREIO) “Aqui eu sou um último momento de luz para tentar pegar um eleitor indeciso ou que pensava em anular o voto”, acreditava a escritora Ingrid Teixeira, 33 anos. “É indispensável se posicionar, especialmente em uma eleição de dois candidatos antagônicos”, afirmou Ingrid, também na Associação Atlética. Bolsonaristas, da mesma forma, se colocavam com orgulho. Em Periperi, Subúrbio Ferroviário, no Colégio Estadual Nelson Mandela, o policial militar reformado Everaldo Pereira dos Santos, 68 anos, era um dos partidários do candidato do PSL.

Negro, Everaldo estava com a camisa da Seleção Brasileira de futebol. “Sou um cidadão brasileiro e vim de verde e amarelo para apoiar Bolsonaro. A maioria aqui é petista, mas quero que o país melhore em segurança e educação”, justificou. No Colégio Estadual Góes Calmon, em Brotas, o empresário Marcelo Brito, 40 anos, estilizou o símbolo da república. “Deus acima de tudo, Brasil acima de todos”, lia-se na sua gola polo. “A gente tá mostrando há muito tempo que também saímos às ruas. Não são só eles que se manifestam. Queremos mudança!”, reivindicou Marcelo.

Veja mais fotos de eleitores que vestiram a camisa dos seus candidatos.

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Se algumas famílias se dividiram nesta eleição, muitas também se uniram e faziam questão de mostrar isso durante a votação. Diferentes gerações, de um lado ou do outro. O também policial militar Nilton Passos, 48 anos, estampava o rosto de Bolsonaro na camisa. Sua filhinha, de 6 anos, usava uma igualzinha. “O voto hoje já está consolidado. Só estou reafirmando, mas não quero influenciar ninguém”, garantiu.

Quem roubou a cena no campus da Ibes/Facsal, no Imbuí, foram as gêmeas Ana Clara e Ana Carolina, de apenas 26 dias. As duas acompanharam os pais, a estudante de Medicina Laydiane Almeida, 34, e o representante Francinei de Almeida, 36, mas viraram atração de outros eleitores, que paravam a todo tempo para tirar fotos. Os dois foram justificar os votos, mas investiram no look das gêmeas - que não são idênticas. A universitária Laydiane Almeida e o representante Francinei de Almeida com as gêmeas Ana Clara e Ana Carolina (Foto: Marina Silva/CORREIO) Vestindo roupas iguais, nas cores rosa e branco, cada uma tinha um dos números: 1 e 3, em alusão ao candidato Fernando Haddad (PT). "A ideia foi da mãe, que é apaixonada pelo PT", divertia-se Francinei. No primeiro turno, Laydiane estava internada, após dar a luz às meninas. "Fiquei oito dias no hospital, mas ele veio justificar. Somos de Feira, mas não conseguimos ir hoje", explicou.

Essa foi uma eleição de dois lados aparentemente opostos. Quer dizer, se procurar bem nem tanto. O vendedor Rodrigo Oliveira, 37 anos, vestia uma camisa com os seguintes dizeres. “Não aperte minha mente”. Votou em quem? “Nulo, claro!”, disse ele, na frente de um colégio, em Paripe.

E quanto ao casal que circulava pelo bairro da Graça com uma bandeira do Império? Defensores da Monarquia, eram a maior prova de que essa eleição tinha muito mais que dois lados. Casal monarquista, na Graça, não defendia nem Bolsonaro, nem Haddad (Foto: Almiro Lopes/CORREIO)  “Não importa se vai ser Bolsonaro ou Haddad. O que importa é o Brasil prosperar”, disse o rapaz, que preferiu não revelar o nome e defende que o sistema político volte a ser monárquico. “É o movimento que mais cresce no Brasil”. Nessa hora, enquanto Chico Science provoca sobre o lado que cada um de nós vai sambar, a saída pode ser o o diálogo atribuído ao escritor americano Ernest Miller Hemingway na internet.

– Quem estará nas trincheiras ao teu lado? – E isso importa? – Mais do que a própria guerra.