'Vocês humanos são muito carentes', diz fitinha do Bonfim

Livro de André Lemos "entrevista" objetos da cultura baiana

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  • Laura Fernades

Publicado em 20 de outubro de 2020 às 05:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Marina Silva/Arquivo CORREIO
Capa do livro Objetos da Bahia – Entrevistas (Editora Mondrongo | 128 páginas | R$ 39)

O que diria o berimbau se fosse questionado como gostaria de morrer? E se perguntassem para a guitarra baiana se ela está de saco cheio de tocar as mesmas músicas todo ano, no Carnaval? As respostas estão no livro Objetos da Bahia – Entrevistas (Editora Mondrongo | 128 páginas | R$ 39), do escritor e professor da Faculdade de Comunicação da Ufba, André Lemos, 58 anos.

Misturando humor e crítica, a obra de ficção disponível na versão física reúne entrevistas com objetos emblemáticos da cultura baiana. Não só o berimbau e a guitarra, mas a fitinha do Bonfim, o tambor do Olodum e a rede são alguns dos 31 ícones “entrevistados” pelo jornalista Joaquim Pimenta. É o personagem fictício que conversa com os objetos sobre como encaram suas existências.

Rita é o nome da fitinha do Bonfim, Val é o berimbau, Jorginho é o tambor do Olodum, Gilberto é o colar dos filhos de Gandhi e Renata a rede. “Eu sou da contemplação, não da excitação do clique da outra rede”, se defende Renata, questionada sobre sua relação com a internet.

“Foi uma delícia fazer, primeiro porque me diverti muito. Mas é uma brincadeira séria”, defende André Lemos. O autor explica que há uma dimensão política no livro que tem prefácio de Muniz Sodré e foi escrito em menos de 20 dias, no início do ano. A ideia é, segundo ele, “reconhecer a importância dos objetos no entendimento de quem nós somos”.

“Somos construídos de fora para dentro, os objetos que tínhamos quando criança, as coisas que a gente brincava. Elas nos constituem como sujeito e muitas vezes são vistas como algo inerte”, acredita o autor. “Estamos passando por um momento em que os objetos viraram ameaças, por causa da pandemia – não podemos encostar nas coisas – e o vírus está mostrando que a gente precisa da conexão com o outro”, acrescenta.

Ao mesmo tempo que defende a importância dos seres inanimados, o livro brinca com a situação e mostra os objetos tirando sarro dos humanos. “Vocês, humanos, são muito carentes. Precisam me apertar muito para ver se o desejo vai se realizar. E são muito egoístas, só desejam saúde para si. Vocês são muito superficiais”, ataca a fitinha do Bonfim, com humor.

Objetos da Bahia – Entrevistas fecha uma trilogia sobre os objetos. Em 2013 o autor escreveu o livro acadêmico A Comunicação das Coisas (Annablume, São Paulo), finalista do prêmio Jabuti em 2014, e o livro de poemas Coisas (Mondrongo, Bahia), em 2018.

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