Xô, 2018! Veja dicas de três líderes religiosos para renovar as energias para 2019

Na praia ou na igreja baianos usam o último dia do ano para se purificar

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  • Thais Borges

Publicado em 31 de dezembro de 2018 às 17:30

- Atualizado há um ano

. Crédito: Foto: Almiro Lopes/CORREIO

Com uma vela numa mão e um frasco de alfazema em outra, a escritora Ildete Cordeiro, 75 anos, esperava por sua vez na fila do banho de folhas e de pipoca. Depois da missa no Santuário de São Lázaro e São Roque, na Federação, na manhã desta segunda-feira (31), chegara a hora de se purificar nas escadarias da igreja, através dos pais, filhos e mães de santo que atendiam cada um dos fiéis. 

A vela era para pedir que a mãe de santo passasse em suas costas: queria parar de sentir dores. Já se foram três cirurgias na coluna – em 2014, 2015 e 2017 – e as dores continuavam. “Tive rejeição a 12 parafusos que coloquei, por isso as dores voltaram. Agora, vim pedir saúde e um 2019 cheio de paz”, explicou ela, ao lado da filha e do marido. 

Como dona Ildete, muita gente aproveitou o último dia do ano para renovar as energias em 2019 e deixar a ‘zica’ – todos os problemas e pontos negativos – em 2018 mesmo. Ou seja, no passado. No Santuário de São Lázaro e São Roque, a despedida era ainda mais especial: as segundas – nesse caso, a última do ano – é dia de Omolu, no sincretismo religioso. “Foi difícil o ano de 2018, mas tenho certeza que 2019 será o ano da minha vitória. Que seja um ano que afaste as coisas ruins não só de mim, mas do mundo inteiro. A alfazema, vou levar para minha irmã, que não pôde vir. É uma lembrancinha para ela”, brincou dona Idelte. A aposentada Deja de Almeida, 66, também aproveitou o banho de folhas e o pó de pemba nas escadarias da igreja. Frequentadora assídua do santuário, deixou de ir à igreja todas as segundas depois de fazer uma cirurgia para retirada dos ovários, há dois meses. Nesta segunda-feira, foi pela primeira vez, após o procedimento. 

Queria deixar para trás a energia ruim. “Não podia encerrar o ano sem vir aqui agradecer a meu pai e a todos os orixás. Para mim, é Deus no céu e os orixás na terra. A sensação de paz e segurança quando saio daqui é muito grande”, disse ela, que mora em Itapuã. 

Depois de passar pelo banho de folhas e de pipoca e de comparecer a uma das missas, o funcionário público Selcio Ackerman, 45, aproveitou para acender uma vela no corredor que fica do lado direito da igreja. Para ele, depois de todo o ritual, a sensação é parecida com que dona Deja sente.“É uma sensação de alívio, de limpeza. Venho para pedir saúde mesmo e para deixar todas as coisas negativas”. O estudante de Direito Maurício Lobo, 30, também acendeu uma vela para agradecer. Aproveitei para pedir, também, que continuasse forte na fé e que os males de 2018 se afastassem do ano que chega. “Foi um ano complicado, por conta dessa questão política. Mas acredito que 2019 será melhor e que São Lázaro e São Roque vão nos dar força na resistência”, explicou. 

Ano novo no mar E teve também quem fosse à praia para renovar as energias com o último banho de mar do ano. Foi o caso da modelista Solange Martins, 50, que saiu de casa às 6h30 para chegar cedo ao Porto da Barra. Às 7h, já estava lá. “Vim lavar a alma, na verdade”, explicou ela, que repetiu uma tradição dos últimos três anos. 

Sempre no último dia do ano, ela vem dar o último mergulho e aproveitar para pedir um novo ano melhor. “Como sou uma pessoa de fé, isso é muito importante para mim. Mas mesmo quem não acredita e vê uma paisagem maravilhosa dessa já sai daqui renovado”. 

A dona de casa Rosângela Lopes, 64, também foi ao Porto com o mesmo objetivo.“Jogo tudo de ruim no mar. Quero deixar para trás todas as coisas ruins, como a violência, e ter um ano de paz e saúde. Dinheiro a gente corre atrás”, contou ela, ao lado do marido, o economista Carlos Nizan, 67. Evangélicos, o casal Daise Nunes, 27, e Jackson Felipe Pereira, 27, disseram não acreditar em mudanças trazidas pelo mar. Mesmo assim, foram ao Porto para se despedir do ano, com os filhos David Lucas, 3, e Ticiane, 7. 

Os quatro vieram de Feira de Santana, no Centro-Norte, para passar o Réveillon em Salvador pelo segundo ano consecutivo. No fim do dia, planejavam se reunir para agradecer com uma oração – o Pai Nosso. “Quero deixar todo o meu 2018 para trás. Que 2019 seja cheio de paz, com emprego e alegria. Espero um emprego inclusive para mim”, disse Daise. 

Como se purificar E para quem não teve tempo de se purificar ao longo do ano, ainda há tempo. O CORREIO ouviu três líderes religiosos que deram algumas dicas para renovar as energias. Uma das formas de purificar o corpo é tomando um banho de folhas, de acordo com o babalorixá Pai Ducho de Ogum. A depender do orixá regente da pessoa, o banho pode ser com ervas finas (como macaçá e folha da costa, além de água de alevante) esfregadas e cruas ou de folhas como a ‘desata nó’ cozidas. “A pessoa pode fazer seus pedidos e jogar arroz com casca na frente da porta, pedindo a Ogum que proteja e traga paz e alegria”, explicou o babalorixá.O banho de pipoca também serve para purificar, ajudando a abrir caminhos e trazendo prosperidade e força. Ele recomenda que as pessoas comecem a tomar os banhos a partir das 18h, já perto da virada do ano.  Pai Ducho de Ogum dá dicas para purificação (Foto: Betto Jr./Arquivo CORREIO) O banho de mar pode ser nesta segunda-feira e também na terça-feira (1º). Na segunda, o ideal é mergulhar na maré vazante, para deixar a negatividade ir embora. Depois, é recomendado dar um mergulho na maré enchente, para buscar prosperidade. 

“Muita gente espera o mesmo dia para entrar na maré enchente, mas tem gente que vai no dia seguinte. O importante é atrair energia positiva e alegria no coração e que as pessoas se unam cada vez mais, seja o povo do candomblé, os evangélicos, os católicos. O Deus é um só, só estamos precisando de mais união”. 

Gratidão Já o padre Valter Ruy, pároco da Paróquia Nossa Senhora da Esperança, no Stiep, sugeriu que as pessoas façam uma parada para reflexão, nesta segunda-feira. Seria um tempo entre 10 e 15 minutos, no máximo, para encerrar o ciclo. Durante essa reflexão, ele sugeriu que a palavra de ordem seja ‘gratidão’ – mesmo com as eventuais coisas ruins que possam ter acontecido. “Podemos dar todos os nomes a Deus, de todas as religiões, mas, para começar o novo ano zerado, é preciso ter a palavra gratidão no coração. A meta agora é o amor. Se todo mundo conseguir trazer o bem, vamos ter um ano cheio de bênçãos”, afirmou o padre. Para quem quiser fazer uma reflexão mais profunda, ele sugere a leitura do conhecido Salmo 23. “Nossa oração é sempre para pedir, mas me prendo muito a esse salmo. Olhando o que Deus me deu esse ano, entre em 2019 com essa perspectiva de gratidão e sabendo que nada faltará”. 

Entre os evangélicos, é comum que as igrejas celebrem um culto de gratidão, na última noite do ano. Assim, parte dos adeptos da religião costuma virar o ano nos templos. Na Igreja Batista dos Mares, o pastor Isaías Andrade Lins Filho, explica que a celebração começa às 22h30 desta segunda-feira para que os últimos instantes de 2018 e os primeiros de 2019 ocorram durante a ceia.  O culto de gratidão na Igreja Batista dos Mares, em 2017 (Foto: Acervo pessoal) “A Ceia do Senhor significa comunhão e fraternidade. Significa lembrar a morte de Cristo, como cremos que o sangue de Jesus Cristo purifica de todos os pecados. A gente realiza a ceia como um memorial, com o pão que representa o corpo e o vinho que representa o sangue”, explica o pastor, que também é capelão da Associação de Diplomados da Escola Superior de Guerra. Mas quem não tem como passar o Réveillon em uma igreja pode ter um momento de reflexão em qualquer lugar que esteja, como explica o pastor. O primeiro passo para isso é abrir a Bíblia e ler um dos textos dela, de acordo com ele. Lá, os evangélicos acreditam que estão as revelações sobre o que virá. 

“A pessoa vai e lê a palavra (de Deus, a Bíblia), ora, agradece a Deus pelo ano vindo e suplica por bênçãos para o ano vindouro. Antigamente, a oração entre através dos sacerdotes, antes da ressurreição de Jeus. Mas, hoje, nós temos livre acesso à presença de Deus”, explica.