Carlos Cadena Gaitán: 'Sinergia é a chave para as cidades do futuro'

Urbanista colombiano fará conferência de abertura do Fórum Agenda Bahia 2017

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  • Andreia Santana

Publicado em 21 de agosto de 2017 às 10:58

- Atualizado há um ano

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O arquiteto colombiano Carlos Cadena Gaitán não é o tipo de pessoa que espera o poder público resolver todos os problemas da cidade onde vive. Para ele, a colaboração e as decisões tomadas horizontalmente pela população e pelo governo são a chave para as transformações sociais profundas. Cicloativista e defensor do conceito da “sinergia entre os atores sociais”, quando iniciativa privada, administração pública, universidades e cidadãos se unem, ele estará em Salvador no próximo dia 30 de agosto e será o conferencista que fará a abertura do seminário Cidades, no Fórum Agenda Bahia 2017. As inscrições para o simpósio são gratuitas e podem ser feitas no site www.agendabahiacorreio.com.br. 

Gaitán é arquiteto e Ph.D. pela Universidade de Maastricht, na Holanda; professor e coordenador acadêmico do Centro de Estudos Urbanos e Ambientais da Universidade colombiana Eafit. Ele foi eleito Líder de Sustentabilidade do Futuro, em 2015, por ações desenvolvidas no coletivo La Ciudad Verde e no Fórum Mundial da Bicicleta. Também realiza pesquisas sobre planejamento urbano e ambiental; além de mobilidade urbana sustentável, tema de seu Ph.D.

Medellín deixou passado de violência para trás para ser polo de inovação

Nessa conversa com o CORREIO, por Whatsapp, ele fala um pouco da grande mudança ocorrida em Medellin, que de uma das cidades mais violentas do mundo, se tornou um polo de inovação e práticas sustentáveis e cidadãs. A experiência colombiana, inclusive, será um dos temas da sua palestra.

O Fórum Agenda Bahia 2017 é uma realização do CORREIO, com apoio institucional da Prefeitura Municipal de Salvador (PMS), Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb) e Rede Bahia; patrocínio da Coelba e da Odebrecht; e apoio da Revita.

Confira, abaixo, a entrevista completa:

Você vai apresentar em Salvador a experiência de Medellin. Quando começou o projeto que transformou a cidade em polo de inovação?

A transformação de Medellin levou muitos anos, ocorreu em muitos períodos distintos de governo, de 2004 a 2007, 2008 a 2011 e, mais recentemente, em 2015. Foi um processo de longo prazo do qual participaram muitas pessoas e fundamentalmente tinha na essência a ideia do desenho urbano como um dos principais componentes para a transformação dos territórios. 

Quais foram as principais mudanças ocorridas na cidade? 

A transformação de Medellin não é somente do ponto de vista da segurança, tem muita relação com a dimensão integral dos territórios, com a presença de todos os serviços oferecidos à população, com a possibilidade de dar às pessoas muitas alternativas de ir e vir, de chegar aos seus destinos. 

Como foi possível promover essas mudanças, principalmente porque Medellin tinha problemas de insegurança?

 Há 15, 20 anos, Medellin registrava altos índices de homicídios, era uma cidade que tinha uma história relacionada com algumas situações muito negativas. Se dizia que Medellin era um lugar muito perigoso. Essa realidade começou a mudar e a cidade se tornou um grande polo de inovação e cocriação. A mudança ocorreu principalmente na área de urbanismo, que se tornou muito mais amável, o chamado urbanismo social.

Você fala muito no conceito de “sinergia entre os atores sociais”. Como se dá essa sinergia?

A sinergia entre os atores sociais foi vital para a transformação de Medellin. Foi a grande variável por trás das mudanças na cidade e tem relação com a colaboração entre os setores privado, público, acadêmico e os cidadãos. A principal razão porque avançamos tanto em nossa cidade foi porque fizemos acordos entre os setores e porque os projetos da cidade foram e são prioridade. Para isso, todos os atores sociais envolvidos souberam avançar e mesmo que em muitas ocasiões houvesse desacordos, a sinergia, a colaboração entre esses atores é que permite avanços tão significativos. 

Como a experiência de Medellin pode ajudar Salvador? 

Não estou muito familiarizado com as condições específicas de Salvador, mas acredito que a colaboração e a sinergia entre os atores sociais são a chave dos avanços nas cidades do futuro. 

E como devem ser as cidades do futuro?

Temos um mundo cada vez mais urbanizado, com cada vez mais pessoas vivendo nas cidades em redor do planeta, com as mudanças climáticas, etc. As cidades do futuro têm de ter muito menos emissões (de gases poluentes como o CO2, que pioram o efeito estufa) e altos índices de biodiversidade, que permitem e promovem a biodiversidade. Isso é muito interessante porque pensamos nas cidades e acreditamos que se trata de derrubar patrimônio, derrubar o verde e montar fundações de concreto, que isso significa progresso. Mas realmente, as cidades do futuro, para serem sustentáveis, tem de ter baixas emissões e alta biodiversidade.

Você acredita que o poder público pode incentivar uma participação maior dos cidadãos nos destinos das cidades?

Acredito que já não precisamos e nem devemos buscar a participação, devemos ir mais adiante, buscar a colaboração, buscar uma fórmula em que tanto o cidadão quanto o governo se comuniquem de forma horizontal. Devemos buscar uma maneira para que o caminho, o destino das cidades, se realize em colaboração, para que se construa em conjunto, para que se co-criem, para que a relação não seja simplesmente do estado e do governo pedindo ao cidadão que assine um documento que certifique que ele assistiu a um evento. O paradigma da participação se reduziu a isso: assinamos ou não assinamos um documento, certificamos que estivemos na reunião para a qual nos convida o governo. Então, o futuro da relação é a colaboração ao invés da participação. Nos cabe, tanto a nós cidadãos, quanto a ele, o governo, incentivar, promover e focar que as grandes decisões das cidades sejam tomadas em colaboração.

O seu trabalho com o coletivo Cidades Verdes é um projeto com esse foco em colaboração?

Adotamos especificamente a colaboração e acreditamos que mais que criticar os governos, temos de atuar e liderar os projetos para construir cidades mais sustentáveis. O coletivo Cidades Verdes é uma iniciativa em que também oferecemos espaços importantes para promover trocas cidadãs. São sete anos de trabalho, em três países: Colômbia, México e Equador. Na Colômbia está em dez cidades e em cada uma, esse espaço tem voluntários que em seu tempo livre se dedicam a promover uma cidade mais amável, mais humana e mais verde. 

E o que é preciso para criar cidades mais sustentáveis?

A difusão do conceito de sustentabilidade é importante. Existem tantas prioridades nas cidades e muitas têm relação com trabalho, segurança, saúde, que poucas vezes nos damos conta de que a sustentabilidade é importante.  A sustentabilidade tem de ser a número um em importância, a número um na agenda pública. É fundamental que os cidadãos se organizem para promover esse tema entre as prioridades da agenda pública.

Pensando em cidades mais amenas, você também está bastante empenhado no uso da bicicleta como meio de transporte sustentável...

Acredito que o futuro das cidades passa por essa grande invenção que é a bicicleta, que permite grande liberdade e autonomia para quem a utiliza. Todas as cidades do futuro, cidades com baixas emissões e alta biodiversidade têm de promover e facilitar o uso da bicicleta para o máximo de pessoas. Temos de estar a favor da bicicleta, da caminhada e da intermodalidade, de um sistema integrado que permita muitas alternativas de transporte, entre elas a bicicleta. Organizamos o Fórum Mundial da Bicicleta em sua quarta edição, do qual eu fui coordenador. O Fórum Mundial da Bicicleta, em Medellin teve mai de sete mil participantes de muitos lugares do mundo e foi o primeiro que ocorreu fora do Brasil. Os três primeiros foram no Brasil e o quarto em Medellin. Trata-se de um movimento global de cidadãos voluntários para promover o uso da bicicleta.