'Devemos ao Lula um julgamento justo', diz Gilmar Mendes

Em junho, ministro chegou a defender que o ex-presidente aguardasse em liberdade o julgamento de pedido de sua defesa para anular o processo do tríplex

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  • Da Redação

Publicado em 23 de agosto de 2019 às 20:34

- Atualizado há um ano

. Crédito: STF/Divulgação

(STF/Divulgação) O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes disse que a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva no processo do tríplex do Guarujá (SP) pode ser anulada caso se configure no processo a suspeição do então juiz da Operação Lava Jato e atual ministro da Justiça, Sergio Moro, e destacou que o petista merece um julgamento justo.

"Anular a condenação (do Lula) se eventualmente ocorrer por questão de suspeição, isso leva a um novo processo. Eventualmente isso pode ocorrer", disse à agência britânica Reuters.

"É importante fazer essa análise com todo o desprendimento. A mídia se tornou num determinado momento muito opressiva. O bom resultado não é só aquele que condena. Isso não é correto. A gente tem que reconhecer que devemos ao Lula um julgamento justo", afirmou ele, em entrevista na quinta-feira (22) em seu gabinete.

Em junho, Mendes chegou a defender que o ex-presidente aguardasse em liberdade o julgamento de um pedido de sua defesa para anular o processo do tríplex, sob a alegação de que Moro --responsável pela primeira condenação de Lula-- teve uma atuação parcial. Na ocasião, a proposta dele foi derrotada pela 2ª Turma do Supremo, mas foi adiada, sem data marcada, a análise da suspeição de Moro.

Isso ocorreu num momento em que começavam a surgir as primeiras reportagens do site The Intercept Brasil, que cita supostas conversas de Moro e o chefe da força-tarefa da operação no Ministério Público Federal, Deltan Dallagnol. Nos supostos diálogos, teria havido direcionamento de Moro a ações do MPF no caso de Lula, o que foi usado pela defesa do petista para reforçar o pedido de suspeição do ex-juiz.

Moro e o procurador negam irregularidades e afirmam que não podem atestar a autenticidade das mensagens divulgadas.

Questionado se Moro cometeu crime no episódio revelado pelas mensagens, Mendes disse que há "fortes indícios de muitas irregularidades que podem ser crimes em relação aos partícipes dessas conversas todas". E preferiu não opinar se o ministro deveria se afastar do cargo durante as investigações do caso.

Escândalo Principal crítico dos métodos da Lava Jato no Supremo, o ministro disse que, apesar de não ter um prognóstico sobre se as revelações da Vaza Jato favorecem o ex-presidente no futuro julgamento da liberdade dele, elas estão funcionando como um elemento de "deslegitimação" tanto das ações quanto das sentenças.

Para Mendes, nos vazamentos há "coisas bastante graves" que podem ter repercussão para o caso do ex-presidente. Ele disse que há dúvidas sobre se houve mesmo o cometimento do crime de corrupção, se esse delito está ligado à Petrobras, o que poderia retirar da vara federal da Lava Jato em Curitiba a competência sobre o julgamento, e ainda se houve uma "terrível coação" de delatores.

"Vamos ter esse debate, inclusive sobre a prova ilícita e a prova ilícita em relação a quem, em relação ao réu se isso eventualmente pode beneficiá-lo", disse.

"Tudo é muito sério, tenho dito que, considerando a abrangência da operação e também o envolvimento do Judiciário e da Procuradoria, que esse é o maior escândalo envolvendo o Judiciário desde a redemocratização", acrescentou, referindo-se às supostas mensagens vazadas.

Ainda à Reuters, Mendes disse esperar que, até outubro, o Supremo julgue o processo que discute a execução da pena após condenação em segunda instância. Ele admitiu que a possibilidade de o caso ter repercussão numa eventual liberdade de Lula fez com que o julgamento fosse adiado, mas defendeu que o STF enfrente a questão e que, se possível, ela ocorra em um momento distinto ao de pedidos da defesa do ex-presidente.

"O fato é que prejudica bastante o debate, até a racionalização dessa fulanização. 'Ah, isso interessa ao Lula?` Isso interessa a todo mundo e, mesmo havendo uma decisão que exija o trânsito em julgado, temos meios para determinar prisão em determinados casos em segunda instância. Esse debate vamos ter que travar", disse.

O ministro não quis arriscar qual é a posição majoritária da corte sobre esse tema hoje. Ele disse que o Supremo tinha se posicionado a favor de, em determinados casos, passar a executar a pena após a condenação em primeira instância. Contudo, criticou, "isso se tornou depois um imperativo categórico" e citou o fato que o próprio Tribunal Regional Federal da 4ª Região, corte que condenou Lula em segunda instância, ter uma súmula em relação a isso.

Para iniciar a execução da pena de prisão, Mendes tem defendido esperar ao menos uma apreciação de um recurso pelo Superior Tribunal de Justiça, espécie de terceira instância.